A regulamentação da atividade de síndico é a única forma de profissionalizar essa função? Essa pergunta ganha força com a publicação da Resolução Normativa nº 654/2024 do Conselho Federal de Administração (CFA). Vale lembrar, porém, que das 2.422 ocupações catalogadas no Brasil, apenas 2,8% são regulamentadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Ainda assim, as profissões não regulamentadas exigem preparo técnico, mas sem a fiscalização de um órgão específico, cabendo ao profissional a responsabilidade direta sobre suas atividades.
A gestão condominial passou de uma obrigação básica do Código Civil para um setor que movimenta bilhões de reais, emprega milhares de pessoas e atrai empresas especializadas. Com o aumento da complexidade e profissionalização do mercado, fica evidente a necessidade de organização. Entretanto, essa transformação exige debate e análise antes de qualquer movimento regulatório.
A Multidisciplinaridade da Atividade
Profissões regulamentadas possuem vantagens, como fiscalização, garantia de qualidade e normas éticas, muitas vezes estabelecidas em lei. A proposta do CFA tenta trazer essas mesmas garantias aos síndicos profissionais e empresas de sindicância, ao vinculá-los ao Conselho Regional de Administração (CRA). Dessa forma, estariam sujeitos à Lei nº 4.765/65, ao Código de Ética dos Administradores e ao Manual de Responsabilidade Técnica.
Por outro lado, a função do síndico não se restringe à Administração, o que abre espaço para que outras entidades também reivindiquem a regulamentação. Independentemente do órgão escolhido, a regulamentação traria novas obrigações, como o pagamento de anuidades e a adesão a normas específicas, além de benefícios como piso salarial, jornada de trabalho e licenças. Importante destacar que síndicos moradores ou proprietários seriam isentos dessas exigências.
A Evolução do Papel do Síndico
Desde 1964, os condomínios são obrigados a eleger um síndico para representá-los, com atribuições claras no artigo 1.348 do Código Civil. A partir de 2015, o número de síndicos externos cresceu 500% em relação a 2010, quando representavam apenas 5% do mercado. Hoje, empresas de sindicância e profissionais disputam espaço, enquanto os síndicos orgânicos (moradores) ainda predominam em muitos condomínios.
A Resolução Normativa nº 654/2024 do CFA exclui síndicos moradores da obrigatoriedade de registro técnico. No entanto, é válido questionar: a regulamentação seria o único caminho para garantir qualidade, responsabilidade e transparência na gestão?
Responsabilidade e Fiscalização
É importante reforçar que o síndico, seja ele morador ou profissional, não é um autônomo que pode agir livremente. Ele é fiscalizado pelos condôminos e, em casos mais graves, pelo Ministério Público Estadual. A destituição, o ressarcimento de prejuízos e a responsabilização civil e criminal já estão previstos na legislação vigente.
Portanto, mais do que regulamentar, a reflexão deve focar na qualificação técnica dos candidatos e no fortalecimento da fiscalização pelos meios existentes. Precisamos discutir se a criação de conselhos ou a imposição de registros realmente atendem a uma necessidade social ou se seriam apenas mais um ônus burocrático em uma atividade que já possui instrumentos de controle.
(*) Cleuzany Lott é advogada especialista em direito condominial, cursando MBA Administração de Condomínios e Síndicos com Ênfase em Direito Condominial (Conasi), síndica, jornalista, Diretora Nacional de Comunicação da Associação Nacional da Advocacia Condominial (ANACON), diretora da Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM), produtora de conteúdos e apresentadora do podcast Condominicando. (@cleuzanylott)