A Resolução Normativa do Conselho Federal de Administração (CFA), que determina a obrigatoriedade de registro de síndicos e empresas de sindicatura nos Conselhos Regionais de Administração (CRA), está gerando grande repercussão no setor condominial. Na minha opinião, essa medida deveria ser revogada com a mesma rapidez com que foi implementada. Além de precipitada, a determinação ultrapassa a competência de uma autarquia federal.
Se a Resolução Normativa CFA Nº 654, de 12/11/2024, prevalecer, gestores externos (síndicos profissionais) e empresas de sindicatura sem registro no CRA poderão ser considerados ilegítimos para exercer suas funções, estando sujeitos a multas e acusações de exercício irregular da profissão. No entanto, isso levanta uma questão jurídica fundamental: síndico é uma profissão regulamentada?
Embora exista um movimento em favor da regulamentação da atividade, o que há de concreto até o momento é o PLS 348/2018 (Projeto de Lei do Senado Federal), que propunha alterar o Código Civil para regulamentar a administração de condomínios edilícios. Entretanto, esse projeto foi arquivado em dezembro de 2022 e recebeu um parecer contrário da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
A Resolução CFA Nº 654, publicada no Diário Oficial da União em 18/11/2024, apresenta pontos semelhantes ao PLS. Ambos prevêem que síndicos proprietários (orgânicos) estão isentos do registro no CRA, mas exigem habilitação obrigatória para pessoas físicas e jurídicas que atuam profissionalmente na área. Para obter o registro, é necessário passar por um exame técnico realizado pelos CRAs. Além disso, diplomas de graduação ou pós-graduação em Administração são requisitos para habilitação.
No entanto, se o PLS foi considerado inconstitucional por tratar da organização do sistema nacional de emprego e das condições para o exercício de profissões – competência exclusiva da União –, a resolução de um órgão normativo tampouco seria um instrumento legal adequado para regulamentar a atividade.
Profissional x Orgânico
O cargo de síndico está previsto no Código Civil, e a distinção entre ” profissional” e ” orgânico” surgiu no mercado para diferenciar o síndico morador (que exerce o mandato no próprio condomínio) daquele que atua em condomínios externos.
O termo “profissional” ganhou relevância com a proposta de revisão do Código Civil Brasileiro (artigo 1.347, Lei 10.406/02), que prevê a possibilidade de contratar síndicos profissionais para a administração de condomínios. Contudo, enquanto essa atualização não ocorre, a figura reconhecida legalmente continua sendo a do síndico, sem distinção formal.
Ainda que o mercado use o termo “profissional”, a atividade não foi regulamentada, o que torna questionável submetê-la às decisões do CFA. Uma resolução de um órgão orientador, disciplinador e fiscalizador do exercício de profissões regulamentadas não tem força de lei para abarcar atividades fora de sua abrangência.
A pressão pela representatividade
De acordo com o Instituto Nacional de Condomínios e Apoio aos Condôminos (INCC), mais de 520 mil síndicos atuam em condomínios onde não residem. Pela nova Resolução do CFA, para exercer essa função, seria necessário o registro no CRA. Contudo, a realidade dos condomínios brasileiros é bem diversa. Síndicos frequentemente incluem empresários, engenheiros, advogados, professores, médicos, arquitetos e até pessoas sem formação técnica ou superior. Isso ocorre porque a legislação atual não exige qualificação profissional específica para o cargo, apenas que o candidato seja maior de 18 anos e eleito pela assembleia de condôminos.
Portanto, antes de correr para uma faculdade, é necessário ponderar. Como síndico é um cargo eletivo que exige conhecimentos em diversas áreas, não se pode garantir que apenas os formados em Administração de Empresas têm a qualificação necessária para gerir um condomínio. Vale ressaltar que nem mesmo as administradoras de condomínios são obrigadas a se registrar no CRA.
A regulamentação da profissão de síndico é um debate que precisa avançar com cautela, respeitando limites jurídicos e a realidade prática do mercado condominial. O caminho não parece ser uma resolução normativa, mas sim uma legislação clara e abrangente, que leve em conta as necessidades e desafios dessa atividade multifacetada.
(*) Cleuzany Lott é advogada especialista em direito condominial, cursando MBA Administração de Condomínios e Síndicos com Ênfase em Direito Condominial (Conasi), síndica, jornalista, Diretora Nacional de Comunicação da Associação Nacional da Advocacia Condominial (ANACON), diretora da Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM), produtora de conteúdos e apresentadora do podcast Condominicando. (@cleuzanylott)
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