A expressão é bastante conhecida por quem ama ou acompanha o futebol. Quando alguém manda um chutão e a bola vai ali em um dos cantos superiores da trave. “No ângulo! Lá onde a coruja dorme”, crava o narrador. Um clássico absoluto da locução esportiva na sequência do que costumam ser golaços.
Quem costumava fazer muitos gols bonitos, mas em outra área, era o saudoso sambista Bezerra da Silva. Debochado, divertido, sagaz, driblava qualquer tempo ruim e, assim como Zeca Pagodinho faz até hoje, transformava entrevistas em eventos. Uma das mais míticas traduções da malandragem carioca — embora tenha nascido em Pernambuco —, Bezerra fez um samba cru, irreverente, marginal e solidário.
O documentário “Onde a coruja dorme”, de 2012, mostra a relação de Bezerra com os compositores de muitas das músicas que ele eternizou. São pessoas simples, de ocupações humildes e depoimentos sinceros. Assim como o sambista sempre foi. São vozes do morro, das comunidades, da baixada fluminense, que ficariam abafadas sem a potência e a ousadia de um senhor malandro. Vale a pena assistir.
Bezerra da Silva já nos deixou há algum tempo. Sua obra segue vivíssima! Outra personagem bastante conhecida — hoje, mais famosa que o músico em muitos espaços — é a Duo, a coruja do Duolingo, o também famigerado aplicativo gratuito de ensino de línguas. No último dia 11, a plataforma publicou a nota de falecimento da simpática mascote. Houve memes, muitos memes. A cantora Dua Lipa emitiu comentário sobre o caso. A internet foi à loucura e o time de marketing deve ter dormido o sono dos justos.
A ação, divertida e bem-sucedida, bem comum à marca Duolingo, indicava que a corujinha provavelmente morrera de inanição, esperando o usuário fazer a lição no app. Agora, o desdobramento da estratégia incentiva o público a ressuscitar a ave realizando as tarefas destinadas ao aprendizado de idiomas. É possível que antes da publicação deste texto o bichinho já esteja de volta entre nós. Se ainda não estiver, será questão de tempo. Que assim seja.
Outras grandes marcas, por sinal, já programaram ressurreições para 2025. A Globo, um dos principais veículos de comunicação do país, vai trazer de volta o Vídeo Show. Uma edição especial marcando os 60 anos da emissora está programada para abril, com André Marques e Angélica. Neste ano a Globo, como grupo, também está comemorando 100 anos, já que tudo começou com a primeira edição do jornal O Globo, em 1925. Quem também alcança um século no Brasil é a montadora General Motors (Chevrolet), que comunicou a ressurreição de alguns dos principais veículos de sua história.
Opala, Monza, Chevette e C10, clássicos eternos da indústria automobilística nacional, serão reeditados por meio de um programa chamado Vintage. Trata-se de um projeto piloto — projeto piloto para uma marca de automóveis soa bem divertido — no qual os modelos serão restaurados com o máximo de componentes originais ou incrementados com a tecnologia atual em termos de conforto, desempenho e segurança — tudo com certificação do time de engenharia da GM. Deve dar certo. Afinal, a nostalgia continua sendo um combustível muito apropriado para acelerar corações e vendas.
A propósito, o vídeo da campanha de 100 anos da Chevrolet ficou muito bonito. E o slogan, sensacional: “Sempre na direção do futuro”. Coisa linda, simples e com uma ambiguidade bem alinhada e balanceada. (Embora, atualmente, minha grande paixão seja o slogan da Ipiranga: “Completa pra mim”. Simplicidade encantadora e pertinência absoluta com o negócio. Matou a concorrência — que quase sempre ressuscita.)
Bezerra da Silva tem um som muito famoso chamado “Defunto Caguete”, que conta a história de um cara que, até depois de morto, entregava os companheiros. Esse aí ninguém quer ver de volta, ao contrário da mascote Duo, que — reitere-se — ainda deve ter muito futuro pela frente. Toquinho, outro mestre da nossa música, canta na consagrada “Aquarela” que “o futuro é uma astronave que tentamos pilotar”. Já o Zeca difundiu o “deixa a vida me levar”. Tudo depende da perspectiva, da forma como vemos as coisas. Depende, enfim, do ângulo que cada pessoa (ou marca) deseja acertar.
(*) Jornalista e publicitário | Professor na Univale e poeta sempre que possível | Instagram: @bob.villela | Medium: bob-villela.medium.com
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