A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em não permitir que um condômino sozinho entre com uma ação na justiça exigindo a prestação de contas do síndico ou administradora gerou, para muitos, uma confusão em relação ao direito individual do proprietário de conferir os livros e documentos do condomínio e o direito coletivo de ter acesso à prestação de contas anual.
Embora relacionados, esses direitos possuem características e objetivos distintos. Conhecê-los assegura a transparência nas diversas responsabilidades administrativas, financeiras e operacionais e, por conseguinte, a correta aplicação dos recursos no empreendimento.
Nesse contexto, surge ainda a relevância da atuação do conselho consultivo para evitar abusos e irregularidades, oferecendo um respaldo adicional aos demais residentes.
Direito individual
A decisão do STJ se refere ao direito individual do proprietário em ter acesso aos livros e documentos, com o objetivo de verificar a regularidade das contas e a administração financeira, conforme consta no artigo 1.355 do Código Civil Brasileiro.
Significa que todo dono tem acesso a esses registros para verificar questões específicas relacionadas às suas unidades ou ações específicas da administração.
Os livros e documentos que devem estar disponíveis incluem, entre outros, a convenção, a ata das assembleias, os balancetes, a contabilidade, as prestações de contas, os contratos celebrados pelo condomínio e as despesas realizadas.
O síndico ou administradora deve marcar um horário e local para disponibilizar o material solicitado. Vale lembrar que o direito de ver os documentos não implica em copiá-los integralmente ou divulgá-los a terceiros sem autorização prévia.
Uma sugestão é elaborar um termo no qual o solicitante assina e se compromete a respeitar a confidencialidade e a privacidade dos dados pessoais dos demais residentes bem como não alterar a ordem ou registros disponibilizados.
Da mesma forma, os interessados em olhar os registros devem formalizar o pedido especificando qual o período da gestão desejam fiscalizar,bem como sugerir a data da vistoria.
Direito da coletividade
O direito da coletividade dos condôminos de obter a prestação de contas da administração do condomínio é uma questão mais abrangente e envolve a transparência e a responsabilidade dos gestores do condomínio perante todos os condôminos.
Ao contrário do balancete que todos os meses acompanha a taxa condominial, a prestação de contas é um relato detalhado das receitas e despesas, além de outras informações pertinentes à gestão. Trata-se de uma obrigação anual que deve ser feita perante à assembleia geral ordinária, conforme o artigo 1.348, VIII, do Código Civil. Portanto, não há na legislação referência de prestação de contas de forma individual.
A prestação de contas deve ser clara, precisa e transparente, permitindo que todos compreendam e avaliem a situação financeira e administrativa do condomínio, a condução adequada dos trabalhos e a utilização correta dos recursos e cumprimento das obrigações.
Descumprimento da lei
O síndico que não submeter as contas à apreciação da assembleia, corre o risco de ser destituído do cargo. Para isso, é necessário que um quarto dos proprietários convoque uma assembleia específica para a essa finalidade, de acordo com o artigo 1.350, parágrafo 1º do Código Civil.
Por outro lado, se a gestão do edilício negar a exibir os documentos, qualquer condômino poderá recorrer à justiça com uma ação de obrigação de fazer, garantindo o direito à transparência e a adequada gestão condominial.
O interessante é saber que o direito individual de examinar os documentos não se confunde com o direito da coletividade. Compreender a natureza e o alcance de cada um desses direitos evita confusões e possibilita excercê-los adequadamente, sempre com equilíbrio e responsabilidade contribuindo para a melhoria da governança condominial e para o bem-estar de todos os condôminos.
Cleuzany Lott é Advogada. Graduando em MBA em Direito e Gestão Condominial pela FSA, Pós-Graduada em Direito Condominial pelo CBEPJUR, Jornalista, Publicitária, Síndica Empreendedora, Colunista, Diretora da Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM), membro da Associação Nacional da Advocacia Condominial (ANACON). Coautora de obra voltada para Direito Condominial (livro e-book “Experiências Práticas em Conflitos Condominiais”)
Comments 2
Entendo equivocada a decisão do STJ, pois o direito à Transparência deve ser Total!
Luis o síndico que se preza esclarece todas as dúvidas e não cria obstáculos. Desconheço a motivação do conflito julgado, porém, temos que lembrar que existem pessoas que abusam do direito e travam a gestão, principalmente se ele não gostar do síndico ou pretender se candidatar ao cargo. Obrigada pela participação.