Caro leitor, a partir desta semana, você encontrará aqui na coluna respostas a perguntas de meus seguidores do Instagram acerca de saúde emocional, desenvolvimento pessoal e Psicanálise. Se você também quiser ter a chance de ver sua pergunta sendo respondida aqui, basta me seguir no Instagram (@lucasnapolipsicanalista) e ficar atento: toda sexta-feira à noite abrirei a caixinha de perguntas nos stories e escolherei três questões para serem abordadas aqui.
Então, vamos lá para as primeiras três perguntas selecionadas:
Pergunta 01: Como podemos achar maneiras saudáveis e eficientes de descarregar nossa tensão psíquica?
Resposta: Um estado mais ou menos intenso de tensão psíquica é a condição natural da mente humana. Com efeito, tensão significa acúmulo de excitação e é impossível estarmos vivos sem que estejamos sendo afetados o tempo todo por excitações externas e internas. O mundo nos estimula e o corpo também. Tanto o nosso organismo quanto a nossa mente possuem uma disposição natural para promover a descarga das excitações que incidem sobre nós. Essa tendência se evidencia, por exemplo, na vontade de fazer xixi ocasionada pela excitação da bexiga provocada pela urina. Do mesmo modo, quando a informação de que saiu a nova temporada da série de que gostamos excita nossa mente, nos vemos inclinados a assistir àquele conteúdo o mais rápido possível. Esse desejo nada mais é que a expressão da tendência da mente de descarregar a tensão produzida nela pelos estímulos. Em função das limitações da realidade e de fatores socioculturais, muitas vezes não podemos descarregar as excitações físicas e psíquicas de modo espontâneo e direto. O insulto proferido por um vizinho pode nos incitar a agredi-lo fisicamente, mas, por razões morais, cívicas ou por puro medo, podemos conter esse desejo agressivo e bloquear a descarga da tensão que estamos sentindo. Em casos como esse, o que fazer? Ora, uma boa alternativa é fazer uso da imensa maleabilidade de nossa mente e canalizar a tensão para formas indiretas de descarga que são aceitáveis pela sociedade e pela cultura em que vivemos. No caso do exemplo citado acima, em vez de agredir o vizinho que nos insultou, podemos descarregar a raiva praticando um treino de boxe, jiu-jitsu ou qualquer outra arte marcial. Tudo o que entra na categoria de esporte, lazer e cultura (jogos, lutas, competições, filmes, livros, séries etc.) serve, em última instância, para que os seres humanos possam descarregar suas tensões psíquicas de forma eficiente e saudável sem colocarem em risco a sobrevivência das sociedades e da civilização.
Pergunta 2: Como seriam o amor e o ódio para Freud? Eles andam juntos?
Resposta: Amor é uma palavra que utilizamos para nomear um tipo de vínculo entre uma pessoa e um objeto (que pode ser outra pessoa, um animal, uma coisa, uma instituição, uma ideia etc.) em que o segundo é fonte de alegria para a primeira. Em outras palavras, amar significa se alegrar em função da ligação com um determinado objeto. O ódio parece ser o oposto do amor porque nele o objeto não funciona para o sujeito como fonte de alegria, mas de tristeza. No entanto, existe um elemento comum entre o amor e o ódio que é o vínculo. Tanto para amar quanto para odiar, eu preciso estar me relacionando com o objeto. Não existe ódio sem destinatário. É por isso que Freud costumava dizer que o contrário do amor é a indiferença e não o ódio. Quando sou indiferente a alguém significa que essa pessoa não me afeta, ou seja, não existe nenhum tipo de ligação entre mim e ela. O ódio, por sua vez, frequentemente é o produto de um amor fracassado: não raro, odiamos o outro quando ele não corresponde às nossas expectativas, ou seja, quando não se apresenta mais como amável. Nesse sentido, por trás do ódio, amiúde podemos encontrar um amor frustrado.
Pergunta 3: O objeto de desejo sexual é definido na primeira infância, né? Poderia me explicar melhor sobre isso?
Resposta: Sim, o objeto de desejo sexual é definido na primeira infância, mas isso não significa que ele seja a mãe ou o pai. Nosso objeto de desejo não é uma pessoa, mas um pedaço “virtual” de nós mesmos. Explico: na infância somos submetidos a três “amputações”: o útero materno (com o qual éramos fisicamente ligados), os seios da mãe (que, na cabeça do bebê, são vivenciados como parte dele) e as fezes (que inegavelmente fazem parte de nós antes de serem expelidas e cuja descarga é vivida inicialmente pela criança como uma verdadeira mutilação). Essas perdas nos levam a criar a fantasia de que somos seres incompletos, amputados ou, se você preferir, no jargão psicanalítico, “castrados”. É essa sensação de que algo nos falta que nos leva a buscar os objetos do mundo (pessoas, coisas, ideias etc.) na esperança de reencontrar neles aquela parte perdida de nós mesmos.Portanto, o verdadeiro objeto do nosso desejo sexual (e de todos os nossos desejos) é esse objeto virtual, sem nome, sem imagem, que corresponderia ao pedaço de nós mesmos que tivemos que abandonar para entrar na vida.
Dr. Lucas Nápoli – Psicólogo/Psicanalista; Doutor em Psicologia Clínica (PUC-RJ); Mestre em Saúde Coletiva (UFRJ); Psicólogoclínico em consultório particular; Psicólogo da UFJF-GV; Professor do Curso de Psicologia da Faculdade Pitágoras GV e autor dos livros “A Doença como Manifestação da Vida” (Appris, 2013), “O que um Psicanalista Faz?” (Ebook, 2020) e “Psicanálise em Humanês: 16 Conceitos Psicanalíticos Cruciais Explicados de Maneira Fácil, Clara e Didática” (Ebook, 2020).
As opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores por não representarem necessariamente a opinião do jornal