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A rua, o terreno baldio e o fundo do quintal

(*) Luiz Alves Lopes

Tempo bão…não volta mais…saudades. Fazer o quê, né, comediante Lilico!

Em interessante programa intitulado Bola da Vez, realizado semanalmente pela ESPN, oportunizou-se a presença de profissional argentino, por aqui pouco conhecido, porém com conhecimentos e posicionamentos de fazer cair o queixo da brasileirada metida a sabichona no mundo futebolístico. Tocou fundo. Verdades e verdades foram ditas.

Léo Samaja, coordenador da Associação de Técnicos de Futebol na Argentina, abordou com propriedade a falta de craques nos dias atuais e o profissionalismo exacerbado. Na realidade, no ‘grande negócio’ em que se transformou o futebol. Aprofundou na questão da vulnerabilidade e instabilidade dos treinadores, com destaque para o que ocorre no futebol brasileiro. Matéria rica, sombria e que põe a descoberto os rumos do futebol no planeta.

Disse ele, com outras palavras: caminhamos para os agrupamentos de ricos e pobres. A máxima do barão de Coubertin, adaptando expressão de determinado bispo de Londres em 1908, de que o importante é competir, caminha para o desuso ou inaplicabilidade. Nos dias atuais é vencer, vencer ou vencer.

Explicitou, com sabedoria, que na Argentina sua terra, logo ali, os treinadores de futebol regra geral são contratados por um período mínimo de três temporadas e com projetos exequíveis a serem desenvolvidos. E que, normalmente tais projetos passam pelo acompanhamento e supervisão das divisões de base ou inferiores, delas retirando e aproveitando promissores talentos. Simples.

Ressaltou o relativo sucesso alcançado por treinadores argentinos espalhados pelo mundo inteiro, inclusive no valorizado mercado europeu, afora outras praças esportivas nas quais se inclui o Brasil. Quem são os treinadores do Inter e do C.A.Mineiro?

Estranhou, com profundo pesar o que ocorre no futebol brasileiro, quando treinadores, consagrados ou não, são expostos a cobranças inaceitáveis e dispensados mesmos no limiar de seus trabalhos, quando os resultados não aparecem. É vencer, vencer ou vencer. Trabalho a médio e longo prazo, nem pensar.

Dirigentes passionais, empresários, agentes, mídia raivosa e torcedor irracional, fazem parte do conjunto de motivos ensejadores de tantas dispensas de treinadores no mundo do futebol brasileiro, na visão do entrevistado. Quem se atreve a contestá-lo?

Esgotado o tópico inerente aos treinadores de futebol, passou SAMAJA a interessante narrativa que envolve o mister de fabricar craques ou pelo menos jogadores de boa qualidade técnica. E aqui também, falou com conhecimento de causa e com muita dureza.

Dissertou que, por necessidade mesma ou pela política clubística vigente no país vizinho, as divisões de base ou inferiores na Argentina são tratadas como pérolas ou pedras brutas valorizadas e que dependem de burilamento. E que se dedicam, os envolvidos, em fazê-lo com esmero.

E que ao contrário do Brasil, quando surgem promissores talentos, não são eles negociados a preço de bananas, na inviabilidade de segurá-los em seus clubes. Sabem negociar.

No tocante à má qualidade do futebolista dos dias atuais, não bem trabalhados enquanto jovens, mencionou a pressa exacerbada e falta de paciência dos profissionais não devidamente preparados para o mister proposto, lançando-os prematuramente.

Nesta hora e momento, vem-nos à mente as figuras de mestre Telê Santana e seu discípulo Murici Ramalho, como exemplo maior do trabalho consistente, sério, entrelaçado e planejado que deu certo. O mundo do futebol registra ainda a figura de Cilinho. No mundo do futebol, tem-se vergonha de copiar o que deu certo.

O papo do entrevistado foi longo, altamente interessante e proveitoso, valendo ainda registrar a parte que focalizou a abertura dos clubes em relação a petizada que sonha, ou sonham seus pais e responsáveis, em se tornarem futebolistas de nomes.

Tempo houve em que se valorizava a figura do olheiro. Que em simplório bilhete se encaminhava um garoto para “fazer teste” naquele determinado clube. Nos dias atuais, nem pensar. Perguntem ao campeão das Américas sua Excelência Darci Meneses se ele consegue encaminhar, com assiduidade, garotos para ‘testes’ no Cabuloso da série B.

A época é do empresário. Do agente Fifa. Do Itair Machado e outros da espécie.

Tempos bons, de ouro mesmo, foram aqueles em que se jogava bola no meio da rua, que se capinava o terreno baldio ou mesmo o fundo do quintal, transformando os dois últimos em campinhos atrativos. Tinha o dono do campo, o dono da bola e nem sempre tinha camisas. Às vezes, tinha aquele que amava o futebol, mas não levava jeito para a ‘coisa’. Acabava se tornando líder, dono do time, comprava um apito e se consagrava.

A história de Mané Garrincha registra seus jogos e peladas com os amigos de Pau Grande, de onde saiu para fazer companhia a Nílton Santos e outros monstros.

Campos de peladas. Campos de cantos de ruas. Campos improvisados. Campos irregulares tradicionalmente utilizados na várzea. Verdadeiros celeiros dos craques que gingam e não os atuais de cintura dura, cheio de musculação e roborizados.

Brasil: cinco vezes campeão do mundo. Faz tempo. Deitado eternamente em berço esplendido. Totalmente estagnado à espera de um novo Garrincha, de uma nova Enciclopédia, de um novo rei Zulú, de um novo Rei maior e de um novo Fenômeno. Cairão do céu?

Qual é mesmo a política esportiva existente no país? A legislação que aí está atende finalidades e objetivos sadios ou interesses não republicanos dos grupos dominantes?

Brasil: país do futebol. Já foi. Não é mais. Simplesmente é mais um no universo dos negócios rentáveis do mundo globalizado.


(*) Ex-atleta

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores por não representarem necessariamente a opinião do jornal.

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