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Velhos e novos mercados

FOTO: turismodeminas.com.br
(*) Bob Villela

O Mercado Novo de Belo Horizonte é uma daquelas maravilhas cosmopolitas que enchem os olhos e os copos. Idealizado na década de 1960 para ser um novo mercado municipal na cidade — fica, inclusive, bem perto do tradicionalíssimo Mercado Central — esteve por décadas abrigando muita ociosidade em seus pisos superiores, com o térreo comportando um comércio eficaz, mas sem brilho. O segundo andar era conhecido pelas pequenas gráficas. Se você quisesse um cartão de visitas, era só passar lá. Hoje, todo aquele prédio cercado de cobogós tornou-se um dos maiores cartões de visita da capital da boemia.

Tudo começou a mudar quando os proprietários da cervejaria Juramento 202 — lugar que eu recomendo —, localizada na zona Leste da capital, escolheram o espaço do Mercado Novo para produzir e envasar cerveja, estabelecendo ali a Distribuidora Goitacazes. Para acompanhar a ideia, fizeram uma parceria com um chef da cidade e criaram a Cozinha Tupis. Estava posta a mesa para um dos maiores acontecimentos culturais da história recente de Minas Gerais. Depois disso vieram um café, uma quitanda, uma charcutaria… Hoje, um público diverso e sempre ávido pela cidade se acumula entre mais de 150 opções de gastronomia, cultura, moda e engajamento. Um deleite!

Uma dessas opções é o Gira Vinho, segundo o site deles — gira.wine —, “o primeiro Bar e E-commerce de vinhos de Belo Horizonte”. Como a maioria dos lugares que temos à disposição no Mercado Novo, o ponto é pequeno e delicioso. Essa singularidade harmoniza com o modelo de negócio deles, especializado em bebidas mais artesanais, com variações para o orgânico, o vegano, o biodinâmico, coisas impossíveis ou, pelo menos, raras de se encontrar no comércio tradicional. Rótulos adequados ao paladar de um consumidor mais específico.

E por falar em rótulos, recentemente, a Gira anunciou em seu Instagram o Baco Ex Machina, um blend das uvas Malbec, Merlot e Tannat, vindo de terras gaúchas. O nome é fantástico. Baco é o deus do vinho — e é também um enorme rapper brasileiro; escutem Baco Exu do Blues! Ex Machina vem de Deus Ex Machina, que quer dizer Deus que vem da máquina, um recurso narrativo usado no teatro da Grécia antiga para dirimir tramas difíceis de resolver. Um ator, representando a divindade, surgia com o auxílio de uma máquina para solucionar a zorra toda. E foi meio que isso que rolou com os rótulos desse vinho do sul.

É que para elaborar as identidades das garrafas, eles usaram uma máquina com notas de disrupção. Foram ao aplicativo de inteligência artificial Midjourney e, a partir de um comando de texto, obtiveram 120 diferentes imagens para envolver cada recipiente. A história completa, bem breve e com o texto que fora submetido ao Midjourney, está na página do vinho — https://gira.wine/vinho/baco-ex-machina-2022/. Para quem está lendo no impresso, sei que é chato digitar esses endereços web, mas garanto que vale a pena ver como ficaram lindos os resultados da parceria humano-ator e software-machina.     

Como bem lembra a Gira, Midjourney quer dizer meio do caminho ou meio da jornada. E os episódios recentes envolvendo outras vinícolas do Rio Grande do Sul, pegas submetendo trabalhadores a condições análogas a escravidão, sugere que nossa jornada regrediu alguns passos. Somente com muita inteligência e engajamento orgânicos seremos capazes de exaltar a glória de um Mercado Novo sem conviver com a tragédia do velho mercado da exploração de gente e histórias mundo afora. Salve, Baco! E bico seco para toda condição ácida, de gosto tão amargo.


(*) Bob Villela
Jornalista e publicitário.
Coordenador dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Univale.
Instagram: @bob.villela
Medium: bob-villela.medium.com

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores por não representarem necessariamente a opinião do jornal.

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