por Bob Villela (*)
Foi breve a incursão do Kid Bengala no mundo da publicidade de fast food. Mal saiu da grelha o vídeo do Burger King com ex-ator pornô anunciando um sanduíche, a rede de lanchonetes decidiu tirar o conteúdo do ar. A repercussão foi imensa, do tamanho que os idealizadores da campanha sonharam, com toda certeza. Mas veio com um acréscimo de polêmica, com muitas críticas e preocupações, formando um combo nem um pouco saboroso.
Quem gostou da ação destacou a criatividade e a ousadia, que seriam o sódio e a gordura da boa publicidade. Quem não curtiu, de modo geral, considerou a campanha uma ameaça às crianças, aos menores, que poderiam “descobrir” quem era aquele homem, seu passado, seus atributos. Também acharam um exagero associar a pornografia a uma marca tão identificada com os jovens. Estamos em um país livre e o debate franco e sem censura, felizmente, segue no cardápio. De ideias nos servimos e do seu confronto saímos mais fortes — ou mais famintos.
Pois bem. A Gretchen, figura recorrente na TV, nos memes e, portanto, na cultura pop brasileira, já atuou em filmes de conteúdo adulto. E quase ninguém vê problema nisso. O que é ótimo, porque realmente problema não há. Ela trabalhou, recebeu por isso, tudo dentro da legalidade. Quem quiser ver, que veja. Quem não quiser, ignore. E vida que segue. Ela também já estrelou uma bem-sucedida ação do Burger King, anos atrás. As crianças poderiam “descobrir” algo sobre ela no Google? Sim, poderiam (alerta de ironia). Claro que a história do Kid Bengala não se compara à da Gretchen, uma vez que ele é imediatamente associado à pornografia. Já ela é um patrimônio nacional e costuma ser majoritariamente associada à dança, ao entretenimento para a família, à música.
Por falar em música — e aqui sempre se fala nisso —, algumas vertentes do funk, por exemplo, se valem de uma linguagem mais lasciva nos sons. E está tudo bem. Embora não seja o movimento que mais me agrada dentro do funk, reconheço o valor artístico e comercial do lance. Mas se alguma criança “descobrir” essas letras em vídeos e publis nas redes sociais, os pais vão ter que rebolar (alerta de ironia 2). Muitos, por sinal, devem estar pensando no que dizer para os filhos quando forem questionados sobre o que é macetar. “Macetando”, hit animadíssimo da rainha Ivete Sangalo, está na boca do povo, inclusive, o público infantil. Veveta, com todos os méritos, é uma das mais requisitadas estrelas do mercado publicitário nacional. Macetou o apocalipse de Baby do Brasil (procure no YouTube) e deve ter deixado muitos pais com medo do Google depois deste verão (outro alerta!)
Em “Feliz Natal”, filmaço de 2008 dirigido por Selton Mello (fácil de encontrar para assistir), uma cena chama atenção. A família está na piscina e uma moça fica muito incomodada após a mãe compartilhar entre os presentes um assunto delicado, especialmente para adolescentes. A menina estava “naqueles dias”, segundo a mãe. A moça fica furiosa e a mulher afirma que menstruação é uma coisa normal — e é mesmo.
Mas…
Na sequência, duas crianças indagam: “Mamãe, o que é menstruação?” “Ah, pergunta pro seu pai”, a mãe responde. Os meninos correm em direção ao pai e reprisam a pergunta. O homem, indiferente e safo, devolve de pronto: “Depois sua mãe te explica”. As crianças se dispersam e vão buscar outros afazeres. A cena, em segundos, reproduz um tanto daquilo que preferimos terceirizar. Quanto às prioridades do dia, vamos às trends para saber quais são.
(*) Jornalista e publicitário. Coordenador dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Univale.
As opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores por não representarem necessariamente a opinião do jornal.