Imagine a cena: é madrugada, as ruas estão silenciosas, e um condomínio repousa em paz… até que uma sequência de sons inusitados acorda os moradores, vindo da direção de um dos apartamentos. Não é uma discussão, nem uma festa ou algazarra — são demonstrações intensas de amor, digamos, ruidosas demais para a paciência dos vizinhos.
Esse foi o cenário que motivou a síndica de um prédio do bairro Politeama, região central de Salvador a afixar um comunicado chamando atenção para o “amor aos gritos” que estava provocando reações calorosas e despertando todos os blocos do condomínio, além de prédios vizinhos.
Esse incidente em Salvador me lembra um caso semelhante que ocorreu quando eu morava no bairro Vila Bretas, em Governador Valadares. Durante a madrugada uma série de sons apaixonados atravessou janelas, muros e até ruas. Os gritos estranhos acordaram muita gente que se preocupou: poderia ser uma situação de emergência ou até de violência doméstica. Mas após alguns minutos de suspense e de uma checagem mental rápida de todas as possibilidades, a verdade veio à tona com um eloquente “Que delícia!”.
A curiosidade se espalhou, junto com o som, pela vizinhança. No dia seguinte, o assunto virou a conversa de todos os cantos do condomínio, e descobriu-se que o “incidente” partira de um prédio vizinho, situado em uma rua mais alta e que, com o silêncio da madrugada, espalhou a paixão sonora para quem quisesse (e não quisesse) ouvir.
Na ocasião, o síndico ficou visivelmente constrangido para tratar do tema com o casal amoroso, mas os próprios vizinhos tomaram a frente e resolveram o problema com uma série de mensagens diretas deixadas sob a porta e nas caixas de correio. Cada recado era mais criativo que o outro: um apelando à privacidade, outro à compaixão pelos vizinhos e, claro, alguns mais humorados, apelando à discrição e até sugerindo a compra de janelas antirruído!
“Amor e Privacidade: Existe um Limite?”
Voltando ao caso de Salvador, é interessante notar que síndicos de hoje estão cada vez mais preparados para enfrentar esses dilemas. Com a experiência acumulada de várias “histórias de amor” semelhantes, eles encontram maneiras diplomáticas de mediar o direito ao amor com o direito ao descanso.
A síndica de Salvador, acertou ao apelar ao bom senso e lembrar que o condomínio abriga idosos, crianças e pessoas que, embora apreciem o amor, preferem vê-lo longe de suas horas de sono. O comunicado deixado no quadro de avisos conseguiu ser delicado e eficaz, promovendo o respeito mútuo e evitando o constrangimento pessoal.
Até Onde Vai o Amor e Onde Começa o Sossego?
Questões como essa levantam discussões sobre os limites entre a liberdade individual e a convivência coletiva. O Código Civil dá diretrizes claras, mas a cada caso os síndicos e condôminos encontram desafios novos. Afinal, o que é uma noite quente de romance para alguns pode se tornar uma noite em claro para outros.
Para quem deseja demonstrar afeto sem ser ouvido no andar de cima (ou no prédio ao lado!), os especialistas recomendam investir em isolamento acústico, ou, mais simples, apostar em um pouco de moderação. Assim, evita-se um convite para conversar com o síndico — o que, convenhamos, não deve ser o desfecho romântico que muitos esperam.
Então, se o amor é mesmo lindo e precisa ser celebrado, que seja… mas talvez, um pouco mais baixinho.
*Cleuzany Lott é advogada especialista em direito condominial, cursando MBA Administração de Condomínios e Síndicos com Ênfase em Direito Condominial (Conasi), síndica, jornalista, Diretora Nacional de Comunicação da Associação Nacional da Advocacia Condominial (ANACON), diretora da Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM), produtora de conteúdos e apresentadora do podcast Condominicando.
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Comments 1
Kkkkkkkk o pior é saber que muitos e muitas não estão sentindo é nada de bom mas gritam como nos filmes kkkk