Tem sido notório o aumento do mecanismo de automutilação no meio dos nossos adolescentes e jovens na atualidade, como forma de lidar com seus sofrimentos. Antes de julgarmos tal comportamento, precisamos compreender suas origens, por que ele acontece e como podemos ajudar de modo mais efetivo.
Pesquisas apontam que essa prática é mais comum no período da adolescência e juventude, principalmente com mulheres. Contudo, essas mesmas pesquisas apontam um crescimento deste comportamento entre meninos. Normalmente, os relatos estão direcionados ao sentimento de solidão, baixa autoestima e principalmente com a dificuldade de compreender e lidar com a dor emocional. Sendo assim, o sujeito “prefere” a dor física como foco de diminuição da dor emocional.
Ao contrário do que muitos acreditam, a automutilação está pouquíssimo relacionada a vitimização. A maioria dos praticantes esconde as marcas, da família, dos amigos e da escola. Normalmente, o indivíduo só anda com blusa de manga comprida, para que suas marcas não sejam vistas.
Outro mito é pensar que a pessoa que se mutila está se preparando para se suicidar. Num primeiro momento, este comportamento é um mecanismo de “alívio” de dor (convenhamos, nada apropriado, nada funcional e nada saudável), para que o indivíduo consiga viver sem contato com sua dor emocional, focando na dor física (imagino que isso pareça um absurdo ao leitor, mas é o que ouvimos no consultório psicoterápico).
Entre os relatos obtidos, observamos que quem já teve a prática de passar a navalha em alguma parte do corpo (geralmente nos braços ou pernas) sente-se aliviado. Com o passar do tempo, quando essa dor não é reelaborada ou ressignificada, o indivíduo busca outra forma de erradicação total da sua dor. Esse é um dos motivos pelos quais todos nós, pais, familiares, amigos e professores, precisamos ficar atentos a esses sintomas em nossos adolescentes. À medida que a adolescência e a juventude vai passando e a fase adulta se aproximando, ele vai deixando essa prática ou substituindo por outros comportamentos disfuncionais. Como exemplo temos: uso de drogas, bebidas, distúrbios alimentares ou até mesmo evidenciando transtornos psicológicos, como transtorno de humor, transtorno de ansiedade, transtorno borderline, entre outros.
Como lidar com essa situação?
Se você perceber que um amigo está se mutilando, há que tomar cuidado com os discursos motivacionais, de que, se a pessoa quiser, poderá parar a qualquer hora. Não é tão simples assim, não é mesmo! É necessária ajuda profissional para lidar com essa situação. A psicoterapia é essencial e, em alguns casos, a medicação será necessária. Se você tem um amigo e percebeu que está se mutilando, aproxime-se dele e o oriente para que procure um profissional da área da saúde, preferencialmente um psicólogo e/ou psiquiatra. Além disso, encoraje-o frequentemente a aprender a lidar com suas frustrações, que elas fazem parte da vida e que há outras formas, sobretudo mais saudáveis, na busca da solução do seu problema.
Orientação aos pais com filhos ainda criança:
Abaixo há orientações que considero valiosas aos pais com relação aos seus filhos, sendo elas:
1º – Invista tempo na elaboração da saúde mental do seu filho desde criança – Assim como você precisou, seu filho também precisa muito disso, principalmente nos dias de hoje. Ajude-o a lidar com as suas emoções, não seja extremista, nem tenha comportamentos antagônicos, ora essencialmente punitivo, em outro momento totalmente permissivo. Seja coerente com seu discurso. Para isso, é necessário investir tempo orientando, educando, amando, brincando, disciplinando, para que a criança vá se percebendo e se construindo dentro de todo esse processo educacional.
2º – Permita frustrações adequadas à idade dos seus filhos – Desde criança, permita que ele sinta essa dor, mesmo que doa em você também. Proteja os seus filhos, provoque segurança, mas não seja superprotetor. Permitir vivenciar frustrações adequadas à idade o ajudará a lidar melhor com as frustrações na adolescência e na fase adulta.
3º – Dê responsabilidade à criança – Desenvolva na criança, de modo gradativo, a percepção de que ela é um sujeito responsável pelos seus atos em qualquer ambiente que esteja. Responsabilidades simples, desde colocar a roupa no lugar certo quando chega da escola até manter o quarto organizado, são tarefas que já podem ir fazendo parte da vida de uma criança a partir dos 5 anos. Isso contribuirá e muito para a organização de um ser que compreende que tarefas e responsabilidades fazem parte da vida, mesmo quando não queremos fazê-las.
4º – Não condicione seu amor à criança – Uma fala que sempre tenho com meus filhos, separadamente, em momentos oportunos é: filho(a), eu te amo independentemente, não há nada que você faça que vai fazer eu te amar mais ou menos. Não é sendo o melhor em tudo que vai fazer eu te amar mais, nem sendo o pior em tudo que vai me fazer te amar menos. Eu os amo e estarei ao seu lado sempre pra te ajudar, mas seus atos trazem consequências e eu, como pai que amo, irei corrigi-lo de modo a te orientar para que você viva melhor. Nunca deixe seu filho(a) pensar que você o ama mais ou menos por alguma coisa que ele fizer. Mostre o seu desafeto com o comportamento, mas não à pessoa dele. Isso contribui e muito para a elaboração da autoestima, como também pela consequência da responsabilidade dos seus atos.
Bom, você deve estar pensando: ele começou a falar de automutilação e agora termina falando de educação com filhos. O que uma coisa tem a ver com a outra? Tenho muito cuidado com a minha fala, que pode ser mal interpretada por leigos. Mas a maioria dos comportamentos disfuncionais da nossa juventude está ligada às interpretações da aprendizagem que tiveram ao longo da sua vida, através da coerência ou incoerência do discurso e do comportamento de seus cuidadores. Isso influencia e muito na personalidade “frágil” deste adolescente que se mutila porque se sente sozinho, sem valor, sem segurança e sem amor. Pense nisso!
Espero que a leitura deste artigo tenha lhe ajudado. Aproveite e mostre a um amigo que necessita de uma leitura mais apropriada ao problema que esteja passando. Caso queira contribuir com críticas ou sugestões a esta coluna de comportamento escrita por Leonardo Sandro Vieira, é só contactar pelo 33-98818-6858 ou 3203-8784 ou pelo e-mail: leosavieira@gmail.com