Parece óbvio, mas ainda há quem não enxergue: quando a manutenção preventiva de um prédio é deixada de lado, a conta sempre aparece — e geralmente com juros altos. Muitos condôminos acreditam que economizam ao adiar ou simplesmente não aprovar os orçamentos de manutenção. A realidade é outra: ao evitar os cuidados rotineiros, estão plantando uma bomba-relógio no caixa condominial.
O prejuízo invisível (até explodir)
Para síndicos que já enfrentaram obras emergenciais, não há surpresa: reparos urgentes custam muito mais do que intervenções preventivas. Especialistas em manutenção predial apontam que a manutenção corretiva — aquela realizada apenas depois da falha — pode custar até cinco vezes mais do que o ajuste feito no momento adequado.
E o custo não para por aí. Manutenções emergenciais exigem mão de obra imediata, compra de materiais com urgência, substituição de peças já comprometidas e, muitas vezes, correção de danos colaterais. O problema cresce, e a fatura acompanha.
No contexto dos condomínios, o cenário se agrava: muitos prédios não possuem fundo de reserva suficiente para arcar com esses imprevistos. Quando o caixa não suporta, o rateio extraordinário pesa demais no bolso dos moradores — e, como consequência, a manutenção preventiva continua sendo adiada. Um ciclo ruim que só termina com mais gastos.
Manutenção preventiva: obrigação legal, não sugestão
A responsabilidade pela conservação das áreas comuns não é apenas técnica: é jurídica. A manutenção está prevista no artigo 1.348 do Código Civil, que obriga o síndico a zelar pela segurança e preservação das características originais da edificação.
Mas síndico não faz milagre. Quando o condomínio não aprova os valores necessários, ele fica preso entre a obrigação legal e a falta de recursos — e ainda corre o risco de responder por omissão.
Na prática, o erro não é apenas do gestor. Muitos condôminos rejeitam orçamentos considerados “altos demais”, justamente por não enxergarem retorno imediato. O resultado é previsível: inspeções, pinturas, revisões elétricas e hidráulicas deixam de ser feitas, sempre à espera de um “melhor momento” que nunca chega.
Investir no apartamento, mas deixar o prédio feio: um tiro no pé patrimonial
É comum ver moradores investirem pesado nas reformas internas — piso novo, iluminação moderna, bancadas de alto padrão. Porém, se a fachada está mal cuidada, com infiltrações, fissuras ou pintura gasta, todo esse investimento perde valor. Afinal, ninguém quer comprar um imóvel impecável por dentro, mas feio e mal conservado por fora.
Quando a manutenção é negligenciada, o prédio envelhece mais rápido, perde apelo visual e o valor patrimonial de todas as unidades cai. A estética interna importa, claro, mas não compensa a desvalorização causada por áreas comuns deterioradas.
A conscientização ainda não chegou a todos
Embora os benefícios da manutenção preventiva sejam evidentes, muitos condôminos e até alguns síndicos ainda não adotam essa cultura. Alguns preferem adiar os investimentos para não impactar a cota mensal; outros simplesmente não fazem a conexão entre conservação e valorização patrimonial.
O que muitos esquecem é simples: não existe economia real quando a estrutura do prédio está se deteriorando. Quando o problema aparece, o reparo será sempre mais caro — e mais urgente.
A proposta de lei que pode transformar cuidado em obrigação
Uma proposta legislativa pode mudar essa dinâmica. O Projeto de Lei 6014/2013, já aprovado na CCJC da Câmara dos Deputados, estabelece inspeções técnicas obrigatórias em edificações privadas e públicas, reforçando a importância da manutenção preventiva.
O PL determina que a primeira vistoria da edificação seja realizada dez anos após a emissão do “habite-se”, com inspeções subsequentes a cada dez anos — ou em intervalos menores, caso as condições do prédio exijam. Essas avaliações devem resultar no Laudo de Inspeção Técnica de Edificação (LITE), documento que reúne a descrição técnica, fotografias, recomendações de reparo e a classificação de risco da estrutura. Todo o processo deve ser conduzido por profissional habilitado e acompanhado da respectiva ART.
Se aprovado, o projeto pode ajudar síndicos a aprovar orçamentos hoje bloqueados em assembleias. Mas há um alerta: não adianta uma lei federal se os municípios não fiscalizarem. Sem fiscalização, a manutenção continua sendo empurrada com a barriga.
Por fim, quando a manutenção é ignorada, a conta não desaparece — ela chega, com juros, geralmente no momento mais delicado. E, caso o PL 6014/2013 avance, a negligência deixará de ser apenas uma má escolha de gestão: tornará-se descumprimento legal.
Para síndicos, o recado é claro: planejem, contratem inspeções, elaborem laudos e montem um plano de manutenção.
Para os condôminos, a mensagem é ainda mais direta: investir no prédio é investir no valor do seu imóvel.
(*) Cleuzany Lott é advogada com especialização em Direito Condominial, MBA em Administração de Condomínios e Síndico Profissional, Presidente da Comissão de Direito Condominial da 43ª Subseção da OAB-MG, Governador Valadares e 3ª Vice-Presidente da Comissão de Direito Condominial de Minas Gerais, síndica profissional jornalista e palestrante.






