por Cleuzany Lott (*)
Ficar nu ou tomar sol de biquíni na varanda é direito do morador ou contra os bons costumes?
Usar trajes íntimos ou andar despido pela casa é o hábito de muitas pessoas, independentemente da estação do ano. Há quem garanta que o tabu da nudez priva dos benefícios para o corpo e para a mente, incentivando a prática de atividades sem roupas, como faz o ator Cauã Reymond.
Ele foi flagrado meditando pelado na janela do apartamento no Rio de Janeiro. Recorreu à justiça contra um fotógrafo, alegando invasão de privacidade.
Aproveitar a sacada para tomar um solzinho também faz parte da rotina de várias pessoas. Uma delas é a modelo Janne Ferreira, musa da copa em 2018 e do carnaval de São Paulo.
Seja por estilo de vida, para se livrar das vestes após um dia cansativo, pelo conforto ou pelo descuido durante a troca de roupa, a intimidade nos condomínios é assunto polêmico.
O condomínio é composto por espaços de propriedade privada e propriedade compartilhada. A privada é a de uso exclusivo do dono; as paredes da unidade delimitam o espaço, seja o apartamento ou casa.
A compartilhada é a área comum, onde todos são donos, como os corredores, jardins etc. É o que consta no artigo 1.420 do Código Civil: “cada condômino é proprietário exclusivo da fração ideal que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício.”
Tanto dentro da unidade quanto na área comum, a legislação estabelece limites de comportamento, conforme o artigo 1.336, inciso IV, do Código Civil. Mas isso não significa que o direito coletivo sobrepõe o individual, afinal, cada caso é um caso.
Nesse sentido, circular pelado na própria residência não configura infração alguma, desde que não prejudique a vizinhança ou os bons costumes.
Para consolidar essa liberdade, o adepto à nudez deve tomar algumas precauções, como deixar as cortinas fechadas, evitando a exposição ou a curiosidade de bisbilhoteiros.
O direito termina quando o morador tiver a intenção de expor o corpo nu à comunidade ou praticar atos inapropriados aos padrões de comportamento, causando constrangimento aos demais, caracterizando ato obsceno, tipificado no artigo 233 do Código Penal.
Tomar sol de biquíni na varanda poderia ser uma prática contra a moral e os bons costumes. Entretanto, nem sempre a justiça entende dessa forma. Afinal, mesmo que porventura uma convenção de condomínio proíba essa prática, cada um usa a roupa que lhe convém dentro do seu espaço, como disse a modelo Janne Ferreira.
Em 2020, durante a quarentena, ela recebeu uma multa de R$ 689,39 por usar um body para tomar sol na varanda de casa, em um condomínio em Salvador (BA). Inconformada, ela não pagou a multa e entrou na Justiça. A sentença foi divulgada este mês. Além de ganhar a causa, o condomínio foi obrigado a indenizá-la.
Sob a perspectiva de condomínios, a contribuição desses dois casos está nos limites de direitos de cada um. O diálogo pode ser mais eficaz do que uma multa.
(*) Cleuzany Lott é advogada, especialista em direito condominial, síndica, jornalista, publicitária e diretora da Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM).
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