por Bob Villela (*)
Estar vivo é uma experiência irrefutável de descobertas. Estar vivo e ser professor, com o devido respeito às outras profissões, elevam muito esse espírito inerente a nós, humanos, que pulsa uma busca por sentidos. Semana passada eu participei de um evento com tema de extrema importância para o ambiente escolar e, a partir de uma palestra muito rica, tive a honra de confirmar alguns princípios que cultivo e compartilho com colegas, alunos e, claro, comigo mesmo.
A descoberta pode soar até corriqueira. Mas não em um país como o Brasil. Pode, talvez, parecer algo banal. Mas não em um planeta como a Terra. A descoberta estava ali revelada em uma autoridade falando para centenas de pessoas que a ciência é importante, mas que sem arte não dá. Assim, na lata, impávido, numa manhã de terça-feira, um doutor disse — para uma plateia envolvida em rotinas, smartphones e preocupações — que a arte, o “supérfluo”, o onírico, as cores e os movimentos são essenciais na produção de conhecimento e soluções para o mundo. Mas isso já não está claro? É claro que não.
Encanto da arte
Vamos lá. O evento era o 1º Seminário Cultura de Paz nas Escolas, promovido pelo Conselho Municipal de Educação de Governador Valadares (CME/GV), com a Univale como uma das parceiras. Um dos palestrantes foi o Dr. Marco Antônio Torres, professor da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Ele, em seguida, ao final de uma fala toda muito coerente e engajada, trouxe a letra de uma música e fez do palco a oportunidade do encanto e da relevância da arte.
A letra em questão era Cajuína, de Caetano Veloso — ele de novo aqui neste espaço. De versos incríveis e ritmo de uma elegância assombrosa, a música sempre foi uma das minhas favoritas, até mesmo porque faz parte de um dos meus álbuns preferidos — escutem o Cinema Transcendental. A música foi criada após uma visita de Caetano à casa do pai do poeta piauiense Torquato Neto, um dos criadores da Tropicália. A partir daí foi tudo tocante.
Torquato era amigo de Caetano e havia tirado a própria vida. Caetano estava voltando a Teresina, para um show, pela primeira vez após o ocorrido. Chegando à casa do senhor Heli, pai do Torquato, Caetano, em vez de fazer o papel de consolar, foi, ele próprio, consolado. O baiano estava triste, em lágrimas, e recebeu do anfitrião piauiense uma rosa menina — também conhecida como minirrosa — e cajuína — bebida que é um dos símbolos do Piauí. A história é linda. E eu não a conhecia.
“Existirmos a que será que se destina?”
“Existirmos a que será que se destina?”. É assim que começa a canção. Difícil responder. Só dá para entender que o conforto da lida e o ímpeto da descoberta são caminhos mais gratos quando passam pela arte. O professor Marco Antônio explicou que quando convivemos com os resultados do fazer artístico — por meio de uma obra, um som, uma exposição, uma peça de teatro, etc. — tocamos outros pontos. É algo como explorar novas áreas do nosso pensar, o que expande as possibilidades e nos ajuda escapar da mesmice. Eleva a alma e nos lava de coragem. É isso que a música sempre fez por mim.
“Pois quando tu me deste a rosa pequenina”… segue a música. Foi isso que o professor nos deu naquele congresso: a flor da beleza que está em descobrir mais cores em nossas missões. Se não resta dúvida de que isso passa pelas evidências irrefutáveis das métricas, pelo pragmatismo e pela disciplina, também não pode pairar a mínima desconfiança sobre o valor da arte para termos uma trajetória mais diversa, divertida e divergente de padrões caretas, baseados tão somente em estereótipos e resultados financeiros. Nada contra o dinheiro. Mas tanta coisa ao contrário na ditadura dos números pode indicar que algo está fora da ordem. A arte pode ajudar a devolver as coisas aos seus (não) lugares. Afinal, jamais podemos nos esquecer que existirmos precisa destinar-se, sempre, a algo bem maior.
(*) Bob Villela
Jornalista e publicitário.
Coordenador dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Univale.
Instagram: @bob.villela
Medium: bob-villela.medium.com
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