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O Congresso como máquina de não decidir

FOTO: Antônio Cruz/ Agência Brasil

Caros leitores, inaugurei um novo termo: a procrastinação institucionalizada. No Congresso Nacional, o tempo não é apenas dinheiro, é estratégia. Nada é decidido porque decidir tem custo. Decidir implica contrariar alguém. Então, melhor empurrar com a barriga, criar uma comissão, instalar uma CPI, pedir vista, adiar a votação, sugerir um novo relatório, pedir mais “diálogo”. E assim, o país paralisa enquanto a elite política ganha tempo e reeleição. Nossos parlamentares aperfeiçoaram a arte de parecer que trabalham sem nunca produzir transformação real. A cada crise, a resposta é previsível: uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito. CPIs, que deveriam ser exceções graves, viraram instrumento de marketing legislativo. São palanques disfarçados de apuração. Produzem manchetes, tretas e cortes para o Instagram. O resultado? Nenhum. Quando termina, tudo é arquivado ou enterrado no fundo da gaveta do esquecimento.

Essa paralisia não é acidental. É método político. A procrastinação é usada como blindagem. Reforma tributária? Demorou 30 anos para ser aprovada. Reforma administrativa? Ainda está na fila, perdida entre interesses corporativos, medo de enfrentar o funcionalismo e covardia generalizada. Regulação de redes sociais? O projeto fica mofando em comissões, enquanto o país afunda em desinformação. Qualquer tentativa de tocar em privilégios ou modernizar o Estado esbarra num muro invisível: a conveniência dos indecisos. O Congresso brasileiro é um teatro caro, movido a discursos inflamados e decisões adiadas. Enquanto isso, o país real sofre com serviços públicos precários, insegurança jurídica e um Estado inchado e ineficiente. A população trabalha, paga impostos, espera. Os deputados ganham R$ 41 mil mensais, mais verbas extras, e se especializam em nada decidir.

O mais grave é que esse ciclo vicioso já está normalizado. O eleitor já espera que “nada mude”. A indignação foi domesticada. E a máquina da procrastinação gira solta, lubrificada por emendas de relator, barganhas obscuras e um presidencialismo de coalizão cada vez mais opaco. Não se trata apenas de lentidão. Trata-se de cúmplice omissão. O Congresso opta conscientemente por não decidir para não se comprometer. E, quando decide, é apenas para manter tudo como está. A política brasileira virou um looping de debates vazios, onde toda decisão relevante é terceirizada para o STF ou para “a próxima legislatura”. O Brasil não precisa de mais CPIs. Precisa de coragem. Precisa de votos que valham mais do que discursos. Precisa de parlamentares que parem de adiar o futuro. Se o Congresso continuar sendo a máquina de não decidir, continuaremos a ser o país que não anda.


(*) Thales Aguiar – Jornalista e escritor | Especialista em Ciência Política

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