Por Cleuzany Lott (*)

No período da Quaresma, quando muitos cristãos reforçam a fé e se preparam para a Páscoa, a condenação na justiça de uma moradora, por ter deixado uma escultura de Nossa Senhora de Fátima no hall de entrada de um residencial, merece reflexão sobre direitos, deveres dos moradores e a atuação do síndico.
As áreas comuns nos condomínios são uma extensão da propriedade exclusiva, não podendo ser alienadas separadamente ou divididas. Logo, seguindo o artigo 1.331 do Código Civil, quem mora em condomínio tem direito sobre os ambientes externos, como áreas de circulação, elevadores, escadas, garagens, churrasqueiras, dentre outros.
Por ser de uso coletivo, cada condomínio estabelece as regras, a fim de manter a cordialidade de todos, compondo o Regimento Interno. Compete ao síndico cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento, as determinações das assembleias, assim como a legislação de maneira geral.
Os problemas surgem quando essas regras são quebradas. O que aconteceu no Edifício Canavial é um exemplo. Apesar de o regimento interno proibir objetos pessoais em área de uso comum, era hábito dos moradores colocar materiais e decoração na entrada do edifício, sem interferência dos gestores.
Porém, bastou uma moradora solicitar a retirada da imagem da santa e não ser atendida para o caso ser decidido na justiça. O pedido foi discutido na assembleia. Entretanto, o síndico apenas recomendou a todos a retirada de objetos pessoais nas áreas comuns, mas não cumpriu e nem fez cumprir o Regimento Interno, que proibia a existência de objetos nos ambientes.
Em busca de apoio, a dona da imagem, que mora no edifício há 41 anos, conseguiu a assinatura de 31 dos 32 moradores, concordando em deixar a imagem na entrada do prédio. Mas, conforme abordado nesta coluna, abaixo-assinado não tem valor em condomínio. A aposentada ainda afixou no quadro de avisos que só retiraria o objeto com ordem judicial, numa resposta direta à vizinha incomodada.
Ao condenar a aposentada ao pagamento de R$ 8 mil de indenização à vizinha por danos morais e a retirada da escultura da área comum, a juíza considerou o descumprimento do regimento interno e a tentativa da moradora de resolver o problema por meio administrativo, no próprio condomínio, sem sucesso.
O episódio ocorrido no residencial do bairro de Casa Forte, área nobre de Recife (PE), mostra que as pessoas estão cada vez mais conscientes de seus direitos, e as consequências da omissão do síndico nas questões mais simples rotineiras. Em condomínio, diferentemente do que acontece na política, fazer o papel de bonzinho, sem respeitar o direito alheio, traz consequências.
(*) Cleuzany Lott é advogada especialista em direito condominial, síndica profissional, jornalista, publicitária e diretora da Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM).
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