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Menos juridiquês, por favor

“Cumpre salientar que, após apurado exame da situação trazida à baila, restou comprovada a ocorrência de dano ‘in re ipsa‘. Por conseguinte, ajuizaremos a ação em face da empresa em questão.”

Se você não é da área jurídica ou não está acostumado ao português mais rebuscado, provavelmente não compreendeu que no parágrafo anterior o que quis dizer é que, depois de examinar a situação mencionada, verifiquei que houve um prejuízo que não depende de comprovação e, por isso, entraremos com a ação contra a empresa. Simples assim.

Embora eu seja advogado, já faz muito tempo que não sou apreciador do “juridiquês”.

Esse linguajar próprio da classe jurídica parece querer incutir um certo ar soberano aos profissionais da área, ao mesmo tempo em que quem os ouve falando assim tão “bonitamente” pode até achar que trata-se de um ser iluminado que está em outro plano existencial.

A meu ver, é uma questão crônica. Começa logo após a formatura: o bacharel sai doutrinado das faculdades; imagina que para ser mais bem aceito precisa caprichar no latim e complicar tudo o que fala. E dá-lhe “data venia“!

Com o tempo vai piorando, pois é contagioso. Encontra outros colegas de profissão que falam ainda mais difícil, e aí parece uma competição para ver quem se faz menos entendido pelos pobres interlocutores leigos.

Além do latim e do “juridiquês”, ainda tem o excesso de louvores a magistrados. Não que não sejam merecedores de respeito e admiração, mas há um excesso, comumente visto em petições destinadas aos tribunais superiores, que começam com uma farta lista de adjetivos:

“Doutos magistrados,

Augustos juízes,

Colenda turma,

Nobres julgadores!”

Tudo assim, com um adjetivo em cada linha e muitas vezes em linhas separadas, com espaçamento duplo e muitas exclamações ao final!

Mas (bendito seja Deus), os tempos estão mudando. Advogados e juízes que buscam imprimir à sua atuação uma visão moderna, informal e mais objetiva têm se multiplicado.

E o próprio mercado tem exigido uma mudança de postura dos profissionais jurídicos.

O cliente, especialmente empresas, quando consulta um advogado, não quer ter aulas de Direito e muito menos ter de conversar com um dicionário na mão ou com o smartphone aberto na página de busca do Google. Ele busca clareza, objetividade e resultado. De forma prática e simples, ele quer a resolução de um problema ou a sua prevenção.

É como quando vamos ao médico. Já imaginou se o especialista começa a explicar ao paciente o seu estado de saúde utilizando termos técnicos, dando voltas e explicando passo a passo, tal qual aprendeu na faculdade ou nos livros, o caminho que traçou em sua mente para chegar até o diagnóstico? Há quem goste, mas a maioria certamente não tolera.

O profissional do Direito precisa assumir uma comunicação mais estratégica, orientada objetivamente para o resultado.

Boa técnica jurídica não é sinônimo de linguagem rebuscada, longas petições ou demonstração de fluência em latim. Muitas vezes, menos é mais.

O cliente agradece.

Vitor Amorim – Diretor Jurídico de uma administradora de cartões. MBA em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Pós-graduando em Direito Digital e Compliance. Associado à AB2L (Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs)

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