Wanderson R. Monteiro (*)
Acredito que muitas das pessoas que estão lendo este artigo conhecem a história de Jó. Para aqueles que não a conhecem, vai aqui um pequeno resumo da história desse personagem bíblico.
Jó era visto aos olhos de Deus como um homem reto, íntegro, que se apartava do mal, e fugia de tudo aquilo que era ruim aos olhos de Deus. Jó era um homem que tinha uma vida próspera, prosperidade essa que vinha das bênçãos de Deus sobre a vida de Jó.
Certo dia, Satanás sobe até a presença de Deus, e diz que Jó só era fiel a Deus justamente porque Deus dava a Jó tudo o que ele precisava, de maneira que Jó não tinha nada para reclamar, lhe restando somente ser fiel ao Deus que tudo lhe dava.
Satanás, então, pede a Deus para que ele, Satanás, pudesse tirar de Jó tudo o que ele tinha, inclusive seus filhos, o deixando completamente pobre, pois, assim, Deus veria que Jó iria se rebelar, mostrando que sua fidelidade era condicionada às bênçãos que ele recebia.
Deus, então, permite que Satanás destrua tudo o que Jó tinha, mas que não fizesse nada contra o próprio Jó e sua saúde.
Assim, Satanás destrói toda a prosperidade material de Jó, e também lhe tira todos os seus filhos, mas, no fim, Satanás tem seus planos frustrados, pois Jó não blasfema e nem se rebela, e não deixa de ser fiel a Deus. Muito pelo contrário. Depois de todas as suas perdas, Jó louva a Deus, dizendo a famosa frase: “Deus me deu, Deus tomou, bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21). Tudo isso está narrado no primeiro capítulo do livro de Jó.
Depois disso, Satanás volta outra vez à presença de Deus e, ao ver que Jó não blasfemou e nem se rebelou contra Deus, pede, então, para que Deus lhe permita tocar na saúde de Jó, e Deus também o permite, dizendo para que Satanás não matasse Jó.
Satanás, então, atenta contra a saúde de Jó, e a destrói. Mas, em tudo isso, Jó ainda não se rebela contra Deus, mesmo com a sua mulher o mandando fazer isso (Jó 2:9).
Toda essa história é bem conhecida, de forma que a maioria dos leitores deste artigo sabem que, no fim, Deus restituiu em dobro a Jó tudo o que lhe foi tirado.
Mas, o que quero destacar neste artigo é um fato ocorrido no capítulo 3 do livro de Jó. O capítulo 3 do livro de Jó é um capítulo onde Jó chega a dizer que ele seria mais feliz se ele nunca tivesse nascido (Jó 3:16), e que ele seria mais feliz se morresse (Jó 3:20-22). Mas, esse não é o mesmo homem que, no início do livro, é apresentado como um homem muito abençoado por Deus, e que, a tradição, diz que era um dos homens mais ricos e prósperos de sua época? Onde foram, então, os dias felizes desse homem que, agora, diz que era melhor nem ter nascido?
Logicamente, a riqueza de Jó não residia somente em seus bens materiais, mas, também, em sua família e saúde, e ele perde ambos com uma rapidez incompreensível para ele. Diante da dor desse homem, diante de todas as suas perdas, é fácil entendermos que, nesse momento, ele não trouxesse à memória os seus dias bons e felizes. Podemos até mesmo dizer que, qualquer pai, ou mãe, dariam todos os seus dias “felizes” para ter seus filhos de volta. No momento da dor, da perda, não existe outra coisa no mundo que substitua aquilo que nos falta.
Assim sendo, a dor de Jó, e o fato de ele não lembrar de seus dias felizes, são facilmente compreensíveis. Mas, e quando nós, que passamos por dores e sofrimentos que não chegam aos pés destes, esquecemos das alegrias e felicidades que recebemos ao longo de nossas vidas?
Na maioria das vezes, os momentos que nós consideramos “difíceis” não chegam nem perto de todos os momentos bons e felizes que vivemos, mas, no momento da dor, os momentos bons são completamente ignorados, nos restando dar vazão aos sentimentos ruins que sentimos no momento.
Nos dias de hoje, é muito comum ver pais irritados com seus filhos, por estes estarem sendo “rebeldes”, passando por uma fase difícil, dando trabalho e dificuldade para os pais. Nesses momentos difíceis, é fácil esquecer os momentos bons e felizes que seus filhos lhes proporcionaram.
Da mesma forma, podem existir casais que, passando por momentos de crise, podem se esquecer dos momentos bons que proporcionaram um ao outro. Por alguns dias ruins, esquecem de anos de alegrias e felicidades.
De igual modo, muitos de nós, quando passamos por dias ruins, quando passamos por problemas, por dores, por aflições, somos tomados por uma espécie de síndrome de Jó, que, mesmo sem uma justificativa válida, como a que Jó tinha, extrapolamos, e muito, as ações do próprio Jó, e muitos começam a questionar o agir de Deus. Muitas vezes, muitos de nós questionamos até mesmo a Sua existência, nos esquecendo dos momentos bons que passamos pela nossas vidas, do cuidado de Deus com cada um se nós, pelas vezes em que recebemos muito mais que merecíamos, esquecendo das vezes em que as alegrias sobrepujaram todas as esperanças, nos surpreendendo e trazendo grande e inesperada satisfação.
Em nossa jornada terrena, que venhamos entender que sempre existirá altos e baixos. Sempre existirão dias bons e dias ruins, momentos de pleno êxtase e momentos de profunda dor e sofrimento, de maneira que, quando os dias ruins chegarem, quando os momentos ruins tomarem conta de nós, que venhamos nos lembrar dos dias bons e felizes que vivemos, lembrar que os momentos ruins são passageiros e que novos dias felizes virão.
Dessa maneira, nos dias e nos momentos ruins que vierem sobre nós durante a nossa vida, que possamos fazer como o profeta Jeremias, que diz: “quero trazer à memória aquilo que me dá esperança” (Lm 3:21), e, com isso, termos a paciência necessária para superarmos os momentos ruins, sabendo que todos eles são passageiros, e não permitirmos que os dias ruins afaste de nossa memória as lembranças dos dias bons que vivemos.
(*) Wanderson R. Monteiro
Dr. hc. em Literatura e Dr. hc. em Jornalismo.
Bacharel em Teologia, graduando em Pedagogia.
Acadêmico Correspondente da FEBACLA.
Acadêmico Fundador da AHBLA.
Vencedor de quatro prêmios literários.
Coautor de 10 livros e quatro revistas.
(dudu.slimpac2017@hotmail.com)
São Sebastião do Anta – MG
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