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Personalidade jurídica dos condomínios: o que vem por aí

por Cleuzany Lott (*)

Nem física, nem jurídica. A natureza do condomínio não está no rol de pessoas jurídicas estabelecido pelo Código Civil. Trata-se de uma modalidade anômala ou híbrida, também classificada como sui generis. Essa personificação atípica limita, mas não impede o condomínio de representar o interesse coletivo dos coproprietários, de possuir obrigações tributárias como INSS, PIS, ISS e trabalhistas, como ocorre em uma empresa. Porém, o edilício não é titular de direitos, tampouco de obrigações. Todavia, a situação pode mudar. Está em análise, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 3.461/2019, que amplia a ação do condomínio como pessoa jurídica. A alteração, modificando o Código Civil, passou pela aprovação do Senado no último dia 16.

Embora a discussão seja antiga, há poucos estudos sobre o impacto da mudança nos outros ramos do direito. Percebe-se na proposta dos legisladores que não há soluções para as lacunas que a alteração vai provocar. Dá para imaginar a balbúrdia no mercado imobiliário, entre administradores, contabilistas, síndicos e os condôminos, quando houver edilícios com autonomia para contrair obrigações e adquirir direitos, e outros com as limitações atuais.

Só para instigar o debate: a transformação em pessoa jurídica dependerá da vontade de, pelo menos, dois terços dos proprietários. A opção ocorrerá quando o condomínio registrar em Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas o documento da criação, a convenção e a ata da decisão pela constituição da pessoa jurídica, com o voto favorável dos titulares. Ou seja, a mudança é facultativa. Logo, teremos duas classificações de condomínio com cargas tributárias diferentes.

Aos que adotarem a personalidade jurídica de direito privado, também haverá alteração na Lei dos Registros Públicos, concedendo ao edilício o poder de registrar em cartório bens imóveis, incluindo os obtidos em ação de cobrança contra condômino inadimplente. A autonomia será benéfica, pois o condomínio poderá ampliar a área comum ou aumentar a receita. Entretanto, antes de comemorar a vantagem, há de se lembrar que o projeto de autoria do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) é apenas uma normativa em meio de uma situação complexa, merecendo uma reflexão mais profunda. Por exemplo, ao incorporar o espaço à área comum, qual será o reflexo sobre patrimônio dos condôminos? Não menos importante é pensar que, com a transformação, haverá obrigações tributárias e fiscais que impactarão sobre a declaração de renda dos coproprietários.

Enfim, a justificativa do projeto é resolver os problemas burocráticos que alguns condomínios enfrentam por ser ente despersonalizado, proporcionando a esses empreendimentos maior segurança e autonomia no âmbito jurídico. Porém, como a própria natureza atípica do condomínio, os efeitos são imprevisíveis e vão exigir a mudança de conduta de muitos proprietários que não se envolvem na vida condominial. A única certeza é de que os condomínios de hoje estão cada vez mais complexos, exigindo profissionais qualificados em sua gestão e condôminos mais atentos ao seu patrimônio.


(*) Cleuzany Lott – síndica, advogada pós-graduada em direito condominial, jornalista, publicitária e diretora Associação de Síndicos, Síndicos Profissionais e Afins do Leste de Minas Gerais (ASALM).

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores por não representarem necessariamente a opinião do jornal.

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