Prof. Dr. Haruf Salmen Espindola (*)
Como todos sabem, o presidente da República jogou um balde de água fria no sonho de inclusão dos municípios da região na SUDENE, conforme o veto publicado no dia 23 de junho de 2021, quarta-feira, no Diário Oficial da União. O motivo do veto, recomendado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, demonstra o total desconhecimento da realidade desses municípios e a má vontade em se informar. Por ironia do destino, no dia seguinte (24/6/2021), a Fundação João Pinheiro, vinculada ao governo de Minas Gerais, realizou o Webinário (seminário telepresencial), no qual apresentou os dados socioeconômicos da Região Geográfica Intermediária de Governador Valadares, constituída por 58 municípios, que se distribuem entre as quatro regiões geográficas imediatas: Aimorés–Resplendor, Guanhães, Governador Valadares e Mantena. A característica dominante dos municípios da região de Governador Valadares é de não crescer há muitas décadas e, pior ainda, de estar decrescendo ao ponto de começar a encolher a partir da próxima década. Triste destino.
Os dados apresentados assustam, a começar pelo valor alto da mortalidade infantil, ao ponto de provocar a redução do índice de expectativa média de vida, que fica abaixo da média do estado de Minas Gerais. O decréscimo dos nascimentos e o esvaziamento populacional fará com que a região tenha no ano de 2040 uma pirâmide etária invertida, com mais pessoas na faixa de 65 anos ou mais do que na faixa etária de menos de 15 anos. Vamos precisar muito mais de asilos do que de escolas. Aliás, muitas escolas vão poder virar asilo.
Ao conhecer a realidade socioeconômica, vamos entender o porquê da pressão para se criar municípios, ou seja, o esforço que se fez para os distritos serem emancipados. Dos 58 municípios da região de Valadares, 32 foram criados entre 1980 e 1999, exatamente no período que se deu a reversão de crescimento para decrescimento socioeconômico e, ao mesmo tempo, ficou patente o quadro de degradação ambiental. A fragmentação em municípios cada vez menores é um contrassenso do ponto de vista econômico; mas, do ponto de vista social, foi a salvação. Dos 58 municípios da região, em cerca de 35 deles é a Prefeitura que garante o emprego da maioria da população, ou seja, se não tivessem criado os municípios, a única solução teria sido a migração. Sem emprego e sem renda não tem como uma população viver. Portanto, em nossa região, os municípios não têm desenvolvimento econômico nem possuem a força para resolver, por conta própria, os problemas que impedem o crescimento econômica e a geração de renda. A SUDENE era uma esperança, mas essa se foi.
Os relatórios da Fundação João Pinheiro (FJP) se basearam no Censo de 2010 e em estimativas para os anos seguintes, até 2019. A falta do Censo de 2020 e as incertezas com relação à sua realização causam um prejuízo gigantesco para o Brasil. A segunda característica da região de Valadares é expulsar sua população, ou seja, como não existe perspectiva de emprego e renda, as pessoas migram para outras regiões de Minas Gerais, para outros estados do Brasil ou para outros países. A diferença entre o número dos que entraram na região (imigrantes) e os que saíram (emigrantes) é denominada saldo migratório positivo, se entrou mais que saiu; ou saldo migratório negativo, se saiu mais que entrou. No nosso caso, o saldo migratório é negativo em cerca de 18 mil migrantes, entre 2010 e 2019. Isso apenas confirma a tendência histórica iniciada na década de 1960, com uma diferença de que esses valores já foram bem maiores.
Agora o que é espantoso é que o município de Governador Valadares ocupa o primeiro lugar da sua região, ou seja, expulsou 7,7 mil pessoas. O que significa isso? Governador Valadares é o 2º município de Minas Gerais que mais expulsa pessoas; também é o 2º município brasileiro que mais expulsa pessoas. Se no lugar de considerar o saldo total considerarmos os fluxos migratórios, ficamos em um triste primeiro lugar. A situação de Governador Valadares como cidade-polo merece uma atenção especial. Se considerarmos apenas os 26 municípios que formam a Região Geográfica Imediata de Governador Valadares (anteriormente chamada de microrregião), o movimento migratório interno aos municípios da região imediata indica perda da capacidade de polarização. A cidade de Governador Valadares perdeu capacidade de exercer atração sobre os migrantes da sua própria região imediata. Do total das pessoas que se deslocaram, somente um terço da população migrante se dirigiu para o município de Governador Valadares, sendo que os dois terços dos migrantes saíram do seu pequeno município e foram para outro pequeno município da região. Isso significa que a função de cidade polo está completamente fragilizada.
Esse ranking ocupado pela Região Geográfica Intermediária de Governador Valadares deveria ser a preocupação primeira dos prefeitos, vereadores e deputados da região; também de todas as outras lideranças político-social-cultural-econômicas. O que está em questão é o futuro, ou melhor, a falta de futuro. Não sai da minha cabeça a pergunta: será que haverá inteligência territorial para construir um outro futuro, uma outra história? Gostaria de finalizar fazendo todos se recordarem de que o Brasil e Minas Gerais devem um passivo enorme à nossa região e sua população. Nosso minério, nossas matas, nosso solo, nossas águas, nosso trabalho ajudaram a produzir a industrialização e o crescimento estadual e nacional, porém, deixaram um passivo, um enorme passivo, que nos foi mostrado pelos dados da Fundação João Pinheiro.
(*) Haruf Salmen Espindola é professor do curso de Direito da Univale; professor do Mestrado GIT/Univale; doutor em História pela USP.
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