Vélez admite erro por e-mail e defende cotas e mais alunos nas salas

O ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi convidado pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal para expor ontem, em audiência pública, as diretrizes que seu ministério pretende seguir ao longo dos próximos quatro anos. Na sessão, o ministro admitiu que errou ao enviar e-mail contendo slogan do governo e pedindo que escolas filmassem crianças após a realização do Hino Nacional, defendeu a política de cotas e sugeriu aumentar o número de alunos por sala de aula.

“Cantar o hino nacional não é constrangimento, é amor à pátria. Slogan de campanha foi um erro. Já reconheci. Foi um erro e retirei imediatamente. Quanto à filmagem, só será divulgada com a autorização da família. Constava como algo implícito”, disse o ministro.

Na segunda-feira, o jornal O Estado de S. Paulo revelou que o Ministério da Educação enviou a todas as escolas do País, públicas e privadas, um e-mail em que pedia que fosse lida uma carta aos alunos, professores e funcionários no primeiro dia de aula com o slogan da campanha de Bolsonaro. O comunicado também recomendava que todos fossem “perfilados diante da Bandeira do Brasil” e tocado o Hino, e que as escolas filmassem esses momentos e enviassem os vídeos ao governo.

“Temos as cotas. Defendo as cotas enquanto não for resolvida a questão do ensino básico de qualidade para todos e que possibilite no final do fundamental e do segundo grau aos jovens que quiserem entrar na universidade em pé de igualdade”, disse o ministro aos 26 senadores presentes na audiência. “Nossa dívida não está apenas numa questão de raça, mas de qualidade do nosso ensino básico e fundamental, que no setor público ainda não é da qualidade que deveria ser.”

Vélez Rodríguez disse ainda estar preocupado com o orçamento das universidades públicas e destacou que o Brasil passa por dificuldades econômicas. Uma opção para gerir de maneira mais eficaz o patrimônio público, de acordo com o ministro, seria “otimizar” o rendimento das universidades públicas.

“Nós poderíamos otimizar a excelente qualidade acadêmica das nossas universidades públicas colocando mais alunos em sala de aula, aumentando as vagas no setor público. A maior parte das vagas de ensino universitário no Brasil está no setor privado. É uma anomalia. Deveríamos dar à universidade pública mais espaço, mas, certamente, só ocorrerá isso remanejando a gestão da nossa universidade pública, colocando mais alunos em sala de aula. Não vejo por que no Brasil não possamos aumentar um pouco o número de estudantes por sala de aula”, afirmou.

Diretrizes

Em sua fala de pouco mais de vinte minutos, o ministro da Educação apresentou aos senadores os pontos que o governo federal considera centrais para a educação brasileira. Vélez Rodríguez disse que a má qualidade da alfabetização compromete o sistema de ensino brasileiro e que o País tem apresentado sistematicamente índices “muito ruins” de alfabetização. “Não queremos reinventar a roda, vamos ter humildade e fazer o que o mundo está fazendo com sucesso.”

O ministro disse que sua pasta irá aperfeiçoar a reforma do Ensino Médio, anunciada no governo do ex-presidente Michel Temer. “Há um abandono que se agrava quando se chega ao Ensino Médio. Como vamos melhorar isso? Oferecendo aos jovens e aos adolescentes a possibilidade de uma formação profissionalizante”, afirmou. De acordo com ele, será necessário tornar o Ensino Médio atrativo aos jovens. “Uma educação profissional e técnica, robusta, é o que marca as economias mais avançadas atualmente. Precisamos de ensino médio moderno em diálogo com novas tecnologias”, disse.

O ministro citou ainda a criação de uma secretaria de educação básica para o fomento às escolas cívico-militares. “O renascimento desse espírito é em ambiente pacificado em que a violência não dita a regra. Não há esse tal de militarismo, não. Mas educação nas normas da lei. Professor é responsável, ele entra e todos ficam de pé. Não saem caras porque o investimento é mínimo.”

Protesto

Durante a fala do ministro, estudantes integrantes da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e da União Nacional dos Estudantes (UNE) tentaram se manifestar contrários às recentes falas do ministro, mas foram impedidas por agentes da polícia legislativa.

“Não queremos nenhum tipo de projeto que amordace os estudantes. Queremos universidade pública gratuita e de qualidade. Precisamos de mais escolas, mais espaços para os estudantes debaterem. Entendemos que quando se fala de educação para o Brasil os principais afetados são os estudantes brasileiros, que precisam ser ouvidos e escutados”, disse para a reportagem, a estudante Stefany Kovalski, 19, diretora de comunicação da Ubes.

Ela disse ainda não ser contra a execução do Hino Nacional nas escolas brasileiras. “A gente é contra, na atual conjuntura em que temos escolas sucateadas e que não retomaram suas aulas por não terem professores, o ministro da Educação filmar vários menores de idade que, muitas vezes, não querem ser filmados.”

A estudante Bruna Brelaz, da UNE, disse que participa da audiência porque é contra as declarações do atual ministro, em relação à autorregulamentação das universidades, ao Escola Sem Partido e à privatização das universidades. “A UNE sempre esteve em defesa da universidade pública. Não conseguimos conciliar nossa opinião com a do ministro por conta das declarações tão radicais que ele vem expondo.”

A tentativa de manifestação fez com que a audiência fosse interrompida por alguns minutos. O presidente da comissão, senador Dário Berger (MDB-SC), repudiou a interrupção e lembrou que já havia avisado no início da audiência que não seriam permitidas manifestações. “Se as pessoas não observarem esse quesito, serei obrigado a pedir que se retirem. Aqui, tem organização e comando.”

As senadoras Eliziane Gama (PPS-MA) e Zenaide Maia (PROS-RN) defenderam a presença das estudantes no plenário da comissão. “Não está havendo manifestação com barulho que impeça o transcorrer dessa audiência pública. Elas estão na mais tranquila e absoluta paz”, disse Eliziane. “A representação dos estudantes e professores é importante. Quando se diz audiência pública geralmente tem que ouvir os dois lados. Tem jovens, professores e o próprio ministro disse que ouvira a sociedade”, complementou Zenaide.

por Teo Cury e Dida Sampaio (AE)

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