Senadores repudiam convocação de Bolsonaro a atos contra o Congresso

Senadores repudiaram a atitude do presidente Jair Bolsonaro de compartilhar, via Whatsapp, vídeo em apoio a atos contra o Congresso. Líder do governo no Parlamento, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO), minimizou o caso, mas sugeriu a mudança na pauta da manifestação.

“Não quero criticar se está certo ou errado [sobre os atos do dia 15], mas após a fala do presidente seria prudente voltar a pauta anterior”, afirmou à reportagem o líder do governo nesta quarta-feira (26). Incentivados por integrantes do governo, parlamentares bolsonaristas e pelo próprio presidente, ativistas conservadores convocaram contra o Congresso e em defesa de militares e do atual governo.

A manifestação é uma reação à fala do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, que chamou o Congresso de “chantagista”, na semana passada. O ato estava previsto desde o final de janeiro, com a bandeira da defesa da prisão após a condenação em segunda instância, mas acabou mudando de pauta, para apoio a Bolsonaro e encorpando insinuações autoritárias.

“Escalada golpista”

O líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), falou em “impedir a escalada golpista”. O congressista cobrou um posicionamento dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e do STF (Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli. “Ainda não houve manifestação dos presidentes dos demais poderes. A democracia exige defesa e retaliação do ocorrido”, afirmou o senador.

Ligado à ala independente do Senado, Fabiano Contarato (Rede-ES) também criticou. “Não é a primeira vez. O presidente já compartilhou mensagens polêmicas. Esperamos que ele venha a público manifestar-se e explicar, pois não nos omitiremos diante de ameaças ao Congresso Nacional”, afirmou.

A deputada estadual paulista Janaina Paschoal (PSL), aliada do presidente na eleição de 2018, defendeu o cancelamento dos protestos marcados para março. “Com toda sua liderança, ele pode pedir o cancelamento, para evitar a contaminação pelo novo coronavírus, que acaba de chegar ao Brasil. O pedido do presidente será recebido como uma ordem”, escreveu em rede social.

Líderes políticos, como os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso, e o presidente da OAB já haviam manifestado repúdio na noite de terça-feira (25) à iniciativa de Bolsonaro, de compartilhar vídeos que convocam manifestações.

STF

O decano do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Celso de Mello, afirmou nesta quarta que a conclamação de Bolsonaro, para ato contra a corte e o Congresso, “se confirmada”, revela “a face sombria de um presidente da República que desconhece o valor da ordem constitucional, que ignora o sentido fundamental da separação de Poderes, que demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do altíssimo cargo que exerce e, cujo ato de inequívoca hostilidade aos demais Poderes da República, traduz gesto de ominoso desapreço e de inaceitável degradação do princípio democrático”.

“O presidente da República, qualquer que ele seja, embora possa muito, não pode tudo, pois lhe é vedado, sob pena de incidir em crime de responsabilidade, transgredir a supremacia político-jurídica da Constituição e das leis da República”, afirmou o ministro.

Presidente não negou mensagem

Nesta quarta, Bolsonaro não negou ter enviado a amigos, por Whatsapp, um vídeo que convoca a população a ir às ruas. “Tenho 35 milhões de seguidores em minhas mídias sociais (Facebook, Instagram, Youtube e Twitter), onde mantenho uma intensa agenda de notícias não divulgadas por parte da imprensa tradicional. Já no Whatsapp tenho algumas poucas dezenas de amigos onde, de forma reservada, trocamos mensagens de cunho pessoal”, afirmou Bolsonaro.

“Qualquer ilação fora desse contexto são tentativas rasteiras de tumultuar a República”, completou o presidente, em publicação nas redes sociais. A nota nas redes foi distribuída, antes, a alguns parlamentares próximos e lideranças do Congresso alinhadas ao presidente.

Pedido de impeachment

O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, disse que a atitude de Bolsonaro, se confirmada, pode abrir caminho para pedido de impeachment. “Entendo que é inadmissível, o presidente está mais uma vez traindo o que jurou ao Congresso em sua posse, quando jurou defender a Constituição Federal. A Constituição e a democracia não podem tolerar um presidente que conspira por sua supressão”, afirmou Santa Cruz.

Rodrigo Maia

O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, pediu nesta quarta-feira (26) respeito às instituições democráticas, após a revelação de que o presidente Jair Bolsonaro divulgou a amigos vídeo em apoio à manifestação do dia 15, contrária ao Congresso.

“Só a democracia é capaz de absorver, sem violência, as diferenças da sociedade, e unir a nação pelo diálogo. Acima de tudo e de todos está o respeito às instituições democráticas”, afirmou.

“Criar tensão institucional não ajuda o país a evoluir. Somos nós, autoridades, que temos de dar o exemplo de respeito às instituições e à ordem constitucional. O Brasil precisa de paz e responsabilidade para progredir”, escreveu Maia em rede social.

Articulação de partidos da esquerda

Presidentes de partidos de esquerda marcaram uma reunião para a próxima terça-feira (3), para discutir uma reação ao fato de Jair Bolsonaro ter encaminhado vídeos de convocações às manifestações marcadas para o dia 15, que têm entre os motes críticas ao Congresso.

Segundo o presidente do PDT, Carlos Lupi, vão participar do encontro dirigentes do PT, do PCdoB, Psol, Rede e PSB. A ideia é fazer uma reação articulada. “O que está em jogo é uma escalada autoritária e precisamos defender a democracia”, diz. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) será chamada para a reunião.

Apesar de considerar grave, e uma afronta institucional de Bolsonaro, o compartilhamento de vídeos, convocando para os atos, segundo Lupi, um pedido de impeachment não estaria, por ora, no radar dos dirigentes. O presidente da República disparou as convocações para uma lista de amigos, via Whatsapp.

“Nós combatemos muito o impeachment da Dilma. Achamos que não deve ser um instrumento usado a qualquer tempo, e precisa de fundamentos, que estão se acumulando, mas ainda não há um apelo mais forte para evoluir para isso”, diz o presidente do PDT.

O presidente do PSB, Carlos Siqueira, diz que o gesto de Bolsonaro pode gerar uma “crise institucional gravíssima”. “É inconcebível que um presidente da República apoie um ato. E dizer que foi pessoal e como presidente não dá. Não se pode separar a figura pessoal do presidente da própria presidência, ainda mais em se tratando de um tema tão sensível. Vamos agir com responsabilidade, a responsabilidade que o Bolsonaro não teve”, continuou Siqueira. (Renato Onofre/Julia Chaib/Folhapress)

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