Remessas de dinheiro para o Brasil caem até 90%

Muito antes de Governador Valadares ter seu primeiro caso de coronavírus confirmado, em 24 de março, os impactos da crise da Covid-19 já estavam sendo sentidos na região. Isso porque Valadares é um dos municípios brasileiros que mais enviou nativos para os Estados Unidos na história da imigração: quatro em cada cinco chefes de família na cidade de Minas Gerais têm um parente morando em terras norte-americanas.

Atualmente existem cerca de 40.000 valadarenses nos EUA e o resultado disso foi um fluxo intenso de dinheiro enviado de várias regiões para o Brasil. Entre os locais que mais concentram imigrantes desta cidade está a região metropolitana de Boston, em Massachusetts. Estes mineiros, nos últimos 40 anos, enviam dólares para ajudar nas despesas dos familiares, investir em negócios ou até comprar ou construir imóveis.

A crise do coronavírus, no entanto, praticamente interrompeu esse fluxo. Isso é demonstrado por uma pesquisa realizada pelo município de Valadares, a pedido da BBC News Brasil. A agência local do Banco do Brasil, em fevereiro, registrou um total de 45 ordens de pagamento oriundas dos Estados Unidos, que totalizaram R$ 911 mil enviados à cidade. Em março, embora o número de pedidos fosse quase o mesmo (43), o valor acumulado despencou para R$ 82 mil (queda de 90%).

E, nos primeiros 15 dias de abril, o movimento bancário indicou uma retração ainda mais profunda. Apenas seis transferências foram executadas, totalizando o valor de R$ 14 mil. “O que isso mostra é que a tendência é que as remessas continuem caindo até que a atividade econômica seja retomada nos Estados Unidos”, disse o secretário de Desenvolvimento da cidade, Hílton Manoel.

Os Estados Unidos tiveram seu primeiro caso da doença dois meses antes de Valadares. Em meados de março, enquanto a cidade mineira começava a descobrir sobre o assunto, grandes regiões norte-americanas, como Boston e New York, já estavam em quarentena, com lojas fechadas e atividades econômicas paralisadas.

Sem trabalho e, em alguns casos, sem dinheiro para comer, os imigrantes tiveram que reduzir drasticamente o envio de dólares ao Brasil.

E a redução foi notada não apenas nos bancos, mas, também, por empresas financeiras especializadas em remessas.

“A agência Brazuca, correspondente da Western Union na cidade, confirmou uma queda de 10% no número de pedidos de remessa para Valadares. Por outro lado, o LP Câmbio e Turismo, correspondente da agência MoneyGram, registrou uma queda de aproximadamente 85% no volume de transferências”, afirma o secretário Manoel.

Em 2019, o dinheiro enviado pelos imigrantes representou quase US$ 3 bilhões, ou 0,2% do Produto Interno Bruto do país. É pouco quando se considera que as remessas totalizaram 17% do PIB em El Salvador, ou quase 3% do PIB no México.

“Mas é um valor que cresceu 15% de 2018 para 2019 e tem um impacto muito importante localmente”, disse Manuel Orozco, presidente do grupo de reflexão InterAmerican Dialogue. “Certamente é um dinheiro muito relevante quando se pensa no número de pessoas diretamente beneficiadas por esses recursos”, acrescenta.

Estimativas mostram que entre 50% e 80% da comunidade de 1,2 milhão de brasileiros nos EUA enviam regularmente dinheiro para parentes e amigos no Brasil. Segundo Orozco, cada imigrante ajuda, em média, uma família e meia.

Isso significa que entre 720 mil e 1,1 milhão de famílias recebem periodicamente recursos do exterior, injetados diretamente na economia doméstica.

Entre os latinos, os brasileiros também são os que enviam os valores mais altos ao seu país.

Mas, com mais de 30 milhões de pessoas oficialmente desempregadas e uma retração econômica de quase 5% no primeiro trimestre de 2020, os Estados Unidos sentiram fortemente os efeitos da recessão causada pela pandemia.

Dono do supermercado de produtos brasileiros, Rio, no distrito de Queens, em New York, há 27 anos, o comerciante Ricardo Bastos confirma as dificuldades. Seu estabelecimento, localizado no coração da comunidade brasileira, era o principal ponto de envio de remessas para o país na região.

“O envio caiu 80%. Às vezes, há um cliente que vem aqui para enviar uma cota mínima, de US$ 20, ou um pouco mais, de US$ 40, US$ 50. E você vê que a pessoa está tirando da boca para enviar, porque ela sente que o parente precisa mais do que ela”, afirmou Bastos, que ofereceu 40 refeições quentes por dia com arroz, feijão e carne a clientes que não têm o que comer em meio a esta pandemia.

“Talvez os mais afetados sejam os milhões de imigrantes, muitos sem status legal. Essas pessoas geralmente trabalham em empregos que as expõem ao risco de contágio, têm pouco ou nenhum acesso a cuidados médicos e não podem obter acesso aos recursos financeiros disponíveis para cidadãos que perderam o emprego”, disse Paolo Pasquariello, professor de finanças da Universidade de Michigan. (Com informações da BBC News Brasil).

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