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MAGALI-FERNANDES: Afastada do futebol, treinadora formou gerações da seleção feminina

por ALBERTO NOGUEIRA E BRUNO RODRIGUES (FOLHAPRESS)

César de Britto, 35, era um meio-campista em ascensão na base do Juventus-SP quando se apaixonou, no início dos anos 2000, por uma menina que jogava na equipe de futebol feminino do clube. Cesinha, como é conhecido, queria muito namorá-la, e para isso foi buscar a permissão da responsável pela atleta.

No caso, não era a mãe de Tamires, 32, hoje lateral esquerda do Corinthians e da seleção brasileira, mas sim da técnica juventina na época, Magali Fernandes, que abrigava as jogadoras do time em uma residência na Mooca.

“O pai dela me ligou em um sábado, falando que ia fazer churrasco. Quando cheguei lá, ele parou e me disse: ‘Magali, eu te trouxe aqui porque o Cesinha quer fazer um pedido para você’. E ele me pediu permissão pra namorar a Tamires. O que é que eu vou falar? Falei pra eles que não era eu quem tinha de falar nada”, conta à reportagem Magali, 53, em uma sala dentro da Rua Javari.

César e Tamires estão juntos até hoje e têm um filho, Bernardo, 10. A lateral, que já tem duas Copas do Mundo no currículo, é uma das tantas jogadoras que passaram pelas mãos da técnica e levaram adiante seus ensinamentos –e uma das únicas que conseguiram escapar da marcação cerrada sobre namoros.

Só no elenco da seleção brasileira que disputa nesta semana o Torneio Internacional da França, Magali formou Cristiane, Érika, Andressa Alves e Thaisinha, além de Tamires.

A ex-atacante Roseli, que integrou a primeira equipe nacional do Brasil, em 1988, e a ex-zagueira e capitã Aline Pellegrino, diretora da Federação Paulista de Futebol, foram outros nomes importantes que receberam a tutoria dela.

Magali foi jogadora do Juventus de 1982 a 1987, época em que a equipe era uma das mais fortes do futebol feminino brasileiro. Quando o clube decidiu encerrar o departamento, migrou para o futsal, onde se tornou treinadora.

Nascida e criada na Mooca, Magali voltou ao Juventus em 1997, quando a federação organizou o Campeonato Paulista. Mais de 20 anos depois, ela lembra de brigas com dirigentes para implementar melhores condições de trabalho para as meninas. Com Candinho, técnico do time masculino, chegou a discutir para que as atletas também pudessem treinar no campo da Javari.

“Hoje, as meninas [do futebol feminino] estão tomando chocolate quente. A gente não, a gente tomava café sem açúcar e aguado”, afirma, comparando o futebol feminino atual com o que ela enfrentou como atleta e técnica.

Sem poder contar com investimentos por parte da diretoria do Juventus, Magali teve uma sacada: recrutou amigos para que observassem potenciais atletas jovens que pudessem reforçar o time. Para manter jogadoras de outras cidades e estados que tinham talento, idealizou o que chama de “Casa da Atleta”, uma espécie de alojamento para as meninas do clube da Mooca.

Em uma casa alugada, a técnica reuniu jogadoras de diversas idades, a maioria delas menores, o que aumentava a sua responsabilidade sobre elas, que haviam saído de casa em busca do sonho de jogar futebol. Quando ficavam doentes, era Magali quem as levava para o hospital. Ela também conseguiu, junto à diretoria do Juventus, uma parceria com um colégio particular da zona leste da cidade, para que pudessem estudar.

A manutenção do projeto, que somente no início teve patrocínio de uma empresa do bairro, passou a ser bancada por ela. “Deixei três carros nessa brincadeira”, conta.

Cristiane, artilheira do Brasil no último Mundial com quatro gols, foi uma das estrelas recrutadas por Magali, que a viu em Osasco batendo bola contra um muro e decidiu levá-la à Casa da Atleta.

Aline Pellegrino chegou ao Juventus como atacante. “Ela era muito lenta. Falei que, se quisesse jogar futebol, era na zaga”, lembra Magali. Medalha de prata na Olimpíada de Atenas-2004, jogou toda a carreira profissional como defensora e vestiu a braçadeira de capitã da seleção por sete anos.

“Se eu tivesse permanecido no Juventus por mais tempo, eu teria me desenvolvido muito mais tecnicamente”, diz Pellegrino. Sem dúvida, foi uma das maiores formadoras da geração mais vitoriosa do Brasil.”

Nem toda relação com as jogadoras que formou ao longo desses anos foi fácil. Andressa Alves, meia-atacante da seleção brasileira e da Roma (ITA), foi uma das jovens que passou pela “Casa da Atleta” e com quem Magali teve atritos.

“Ela é meio complicadinha. Antes de um jogo, virou para mim no vestiário e disse: ‘Você não manda em mim’, e eu saí para cuidar da documentação. Voltei, peguei a porta e chutei, pá! ‘Você é menor de idade, menina. Enquanto eu estiver aqui, quem manda sou eu'”, lembra Magali, que encenou como se estivesse no vestiário da Javari, apontando o dedo para o repórter.

A aventura de Magali com as meninas do Juventus durou 13 anos, de 1997 a 2010, quando o clube, por meio de uma carta, comunicou que ela não seguiria no comando da equipe feminina. Chateada, se afastou do futebol, dedicando seus últimos anos ao cuidado dos três netos.

Perguntada se voltaria a trabalhar com a modalidade, Magali inicia um desabafo como se todo o tempo investido tivesse sido em vão. Passado o rompante, ela estende a mão ao esporte mais uma vez.

“Eu tinha 30 anos de futebol. De repente, te jogam no buraco. Posso até voltar, mas para ajudar a organizar, porque o futebol feminino teve um boom, mas está com um buraco lá embaixo, que não é a realidade de cima”, completa.

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