O que mudou nesses cinco anos do desastre que varreu do mapa a comunidade de Bento Rodrigues e afetou tragicamente a bacia do rio Doce?
ESPECIAL – “Antigamente a gente bebia a água diretamente do rio e hoje ninguém tem mais coragem. Foi uma tragédia nas nossas vidas. Não consigo vender peixe como antes.” Cinco anos depois, assim descreveu o pescador João, morador de Conselheiro Pena, que ainda procura respostas para o maior desastre ambiental de Minas Gerais.
Ocorrido no dia 5 de novembro de 2015, o rompimento da barragem de Fundão, no subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), na região Central de Minas Gerais, resultou no vazamento de 44 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério ao longo da bacia do rio Doce. O desastre provocou a morte de 19 pessoas e uma série de impactos ambientais, sociais e econômicos, atingindo 39 municípios de Minas Gerais até chegar ao Espírito Santo.
Nesta edição especial de reportagens, o DRD volta ao passado e atualiza o que foi feito até agora pelas empresas Samarco, BHP e Vale, responsáveis pela barragem. Foram ouvidos pescadores, famílias de atingidos, ambientalistas, advogados, historiadores e a Fundação Renova.
O dia do pesadelo
Eram 15h30 da tarde do dia 5 de novembro de 2015 quando a Samarco informava que a barragem de Fundão, em Mariana (MG), havia se rompido. O rompimento de Fundão provocou o vazamento dos rejeitos, que passaram por cima de Santarém, que, entretanto, não se rompeu. As barragens foram construídas para acomodar os rejeitos provenientes da extração do minério de ferro da Vale, retirado de extensas minas na região.
Por volta de 18h30 do dia 5 de novembro, os rejeitos de minério de ferro chegaram ao rio Doce. Era apenas o primeiro dia do pior desastre da história da mineração brasileira. Mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos seguiram até a foz, em Regência, no litoral do Espírito Santo.
Vários dos moradores de Bento Rodrigues acabaram desabrigados, houve escassez de água, além das vidas perdidas na tragédia. Os impactos ambientais são incalculáveis, e, segundo apontam especialistas, irreversíveis.
As consequências da lama de rejeitos em Valadares
No dia 7 de novembro, a capa da edição impressa do DRD destacava o seguinte titulo: “Rastros da tragédia chegarão a Valadares”.
Na tarde do dia 8 de novembro (domingo), como previsto, a lama de rejeitos chegava a Valadares. O Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) suspendeu a coleta de água no rio Doce e o abastecimento de água no município ficou parado. Começava, então, o pesadelo dos valadarenses, com a falta de água potável. A lama avançava com rapidez ao longo do rio Doce até chegar ao Espírito Santo e atingir o mar.
A fim de reparar os danos causados, a União e os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo celebraram um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) com as empresas Samarco, BHP e Vale, responsáveis pela barragem. Para as compensações e indenizações foi criada a Fundação Renova.
Conforme o historiador e professor na Univale Dr. Haruf Salmen Espindola, o dia 5 de novembro é uma data que não pode ser esquecida. “O drama dos atingidos por esse desastre-crime continua a trazer incertezas e sofrimentos para as pessoas e afetar o ambiente. A situação se agrava com o progressivo esquecimento pela sociedade em geral e pelos governantes, aumentando o drama das famílias e do ecossistema. À medida em que o desastre se torna um assunto do passado e a propaganda da Fundação Renova se intensifica, os atingidos se veem numa situação de desamparo crescente, inclusive com outras barragens ameaçando a vida de comunidades inteiras, como em Barão de Cocais”, disse.
Haruf chamou a atenção para os riscos que a mineração tem causado nesses últimos 30 anos. Vidas e meio ambiente foram destruídos, e o mesmo filme pode se repetir, se não houver alguma intervenção.
“Passados cinco anos, fica clara a necessidade de ampliarmos a percepção de que esse enfrentamento não é somente da bacia do rio Doce, mas de todos que, na escalada global, estão frente a frente com os grandes empreendimentos minerários e sofrem seus impactos: não apenas as populações, mas a biodiversidade e o ambiente. Hoje são muitos os povos, criaturas e ambientes ameaçados pelos grandes complexos de mineração, à semelhança do que ocorre em Minas Gerais. Isso se tornou uma questão especialmente crucial para a América do Sul”, afirmou.
A edição especial de reportagens dos cinco anos do rompimento da barragem de Mariana continua nas próximas publicações.