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O imposto nosso de cada dia: valadarenses já pagaram mais de R$ 117 milhões em tributos

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FOTO: Igor França/ DRD

GOVERNADOR VALADARES  – Até o fim de maio, os moradores de Governador Valadares já haviam contribuído com mais de R$ 117 milhões em tributos. O dado é do Impostômetro, ferramenta mantida pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), e revela o volume arrecadado apenas dentro do município. Isso inclui impostos federais, estaduais e municipais — tanto os cobrados diretamente, como o IPTU, quanto os embutidos no preço de produtos e serviços.

FOTO: Reprodução/ Impostrômetro

E essa conta pesa. Um levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) mostra que, em 2025, os brasileiros precisaram trabalhar até o dia 29 de maio apenas para pagar impostos. São 149 dias do ano — quase cinco meses — dedicados a cumprir obrigações tributárias. Isso representa 40,82% da renda média anual da população. Para além dos números, o cenário acende discussões sobre o modelo de arrecadação no Brasil e os impactos sobre a qualidade de vida do cidadão comum.

Para entender melhor esse panorama, o Diário do Rio Doce conversou com dois especialistas: o professor John Leno Castro dos Santos, economista e docente da UFJF-GV, e o professor Hélcio Armond, advogado e professor de Direito na Univale. A análise dos dois revela não apenas a complexidade do sistema tributário brasileiro, mas também seus entraves e desafios à luz da tão esperada reforma.

Um sistema que pesa mais para quem tem menos

Para o professor John Leno, a crítica não está apenas no valor da carga tributária, mas no modo como ela está distribuída — e na baixa qualidade do retorno oferecido pelo Estado à sociedade.

“O grande problema não é só a carga tributária em si, mas a contrapartida que o Estado dá. Se nós tivéssemos um serviço público de qualidade e entregas adequadas para a população — saúde, educação, segurança — o peso da carga tributária não seria tão debatido quanto é. O problema é pagar muito e receber pouco.”

Segundo ele, o sistema brasileiro tem uma característica regressiva, ou seja, penaliza mais os mais pobres, que proporcionalmente pagam mais tributos do que os mais ricos.

“A regressividade do sistema tributário brasileiro é muito cruel. A pessoa que ganha menos termina pagando proporcionalmente mais do que aquela que ganha mais, principalmente porque os tributos indiretos têm um peso muito maior para as camadas mais baixas. Isso significa que quem ganha um salário mínimo consome praticamente tudo o que recebe e, por isso, arca com tributos embutidos em quase tudo que compra — desde alimentos até produtos de higiene básica.”

Direto ou indireto: onde está o desequilíbrio?

Os tributos no Brasil são divididos entre diretos — como o Imposto de Renda (IR), o IPTU e o IPVA — e indiretos — como o ICMS, o ISS e o IPI, que são cobrados sobre o consumo. É justamente essa predominância de tributos indiretos que agrava a desigualdade, segundo o professor John Leno.

“O ideal seria termos um sistema mais equilibrado, que pesasse mais sobre a renda e menos sobre o consumo. A tributação deve ser orientada pela capacidade contributiva. Isso está previsto na Constituição. Mas na prática, não é o que ocorre. Quem tem mais, deveria pagar mais — e isso nem sempre acontece.”

Esse modelo afeta diretamente a percepção que o contribuinte tem do sistema, segundo o professor Hélcio Armond, da Univale.

“O cidadão paga impostos em tudo o que consome, sem nem perceber. Compra um pão, paga imposto. Abastece o carro, paga imposto. Toma um café, paga imposto. Mas ele não sabe exatamente quanto está pagando e, principalmente, o que está sendo feito com esse dinheiro.”

Falta transparência — e confiança

O peso da carga tributária se soma a outro problema crônico: a opacidade na arrecadação e na aplicação dos recursos públicos. Para o professor Hélcio, a falta de transparência mina a confiança no sistema tributário e reforça o sentimento de injustiça fiscal.

“De fato, temos uma carga tributária elevada. O que incomoda o contribuinte é que ele não vê retorno. A sensação de que se paga muito e se recebe pouco é generalizada. E isso gera descrédito não só em relação aos impostos, mas também em relação às instituições. O cidadão se sente abandonado pelo Estado.”

Na avaliação do professor, um modelo ideal deveria combinar simplicidade, justiça e eficiência — três pilares que ainda parecem distantes da realidade brasileira.

“Se tivéssemos um sistema mais simples, transparente e com um Estado mais eficiente, o cidadão se sentiria mais motivado a cumprir com sua obrigação tributária. Mas hoje, infelizmente, não é isso que vemos na prática. Pelo contrário: a complexidade e a ineficiência alimentam a sonegação e o sentimento de revolta.”

Reforma tributária: muito além da simplificação

A reforma tributária em debate no Congresso Nacional promete simplificar o emaranhado de impostos que existe no Brasil. Para os especialistas ouvidos pelo Diário do Rio Doce, essa mudança é necessária — mas apenas a simplificação não resolverá, sozinha, os principais problemas do sistema.

“A reforma é necessária, mas não pode ser apenas cosmética. É preciso repensar a lógica do sistema, dar mais peso à tributação sobre a renda e menos ao consumo. A progressividade deve ser um princípio real, e não apenas teórico”, argumenta o professor John Leno.

O professor Hélcio concorda e reforça que a reforma deve priorizar o retorno social da arrecadação:

“O Estado precisa devolver à sociedade, por meio de políticas públicas, aquilo que arrecada. A tributação deve ser um meio para garantir o funcionamento de uma sociedade mais justa. Não adianta simplificar se continuarmos com um sistema injusto, que sobrecarrega os mais pobres e não oferece contrapartida adequada.”

Tributo como base do pacto social

A arrecadação de impostos é o que sustenta toda a estrutura do governo e viabiliza os serviços públicos essenciais. Sem tributos, o Estado não funciona. É com esse dinheiro que se paga o salário dos professores, médicos e policiais; que se mantém hospitais, escolas, estradas, sistemas de abastecimento e tratamento de água, além de programas sociais que alcançam milhões de brasileiros.

“Os tributos são a espinha dorsal do pacto social”, afirma o professor Hélcio Armond. “Eles expressam uma escolha coletiva: cada um contribui de acordo com sua capacidade, e o Estado redistribui esses recursos para garantir direitos e corrigir desigualdades. Ou pelo menos, essa é a lógica prevista pela Constituição.”

Quando esse pacto se rompe — seja pela má gestão dos recursos, pela corrupção ou pela ineficiência na entrega de serviços — o contribuinte passa a ver o Estado não como um garantidor de direitos, mas como um ente distante, caro e ineficaz. “A sensação de que pagamos muito e recebemos pouco alimenta a descrença e esvazia o sentido da cidadania fiscal”, completa o professor John Leno.

O impacto dos tributos na economia 

A carga tributária não é apenas uma questão de quanto se paga, mas também de como isso afeta o desempenho da economia e a vida das pessoas. Segundo os especialistas ouvidos pelo Diário do Rio Doce, a forma como o Brasil arrecada e gasta seus tributos influencia diretamente a produtividade, a competitividade dos setores produtivos e o bem-estar social.

De acordo com o professor John Leno Castro dos Santos, o sistema atual pode ser um entrave ao crescimento. “Quando temos uma carga tributária elevada, especialmente sobre o consumo e sobre a folha de pagamento, isso impacta diretamente os custos de produção. Empresas ficam menos competitivas, tanto no mercado interno quanto externo, o que pode gerar desemprego e desestimular investimentos”, explica.

Ele ressalta que o peso dos tributos também compromete o poder de compra da população. “Uma parte significativa da renda das famílias é consumida com impostos embutidos em produtos essenciais. Isso reduz a demanda e afeta o ciclo econômico como um todo.”

O professor Hélcio Armond complementa, destacando que os tributos deveriam ser a base de sustentação de um Estado que funcione bem para todos. “O papel do tributo é viabilizar o funcionamento do Estado. Ele serve para financiar saúde, educação, segurança e infraestrutura. Mas quando o Estado é ineficiente ou corrupto, o tributo deixa de ser um instrumento de justiça social e passa a ser visto como um fardo.”

Para ele, a confiança na arrecadação está diretamente ligada à legitimidade da atuação estatal. “Quando o cidadão percebe que paga caro e recebe pouco em troca, ele questiona o sistema. Isso gera evasão, sonegação e alimenta uma cultura de desconfiança que prejudica o desenvolvimento econômico.”

Na visão dos especialistas, tributar não é, em si, um problema. O problema está em como se tributa é o que se faz com o que foi arrecadado. “Em países desenvolvidos, a carga tributária também é alta, mas há retorno em qualidade de vida, segurança e mobilidade urbana. No Brasil, o cidadão paga muito e vê pouco resultado. Isso compromete a relação de confiança entre sociedade e Estado”, conclui John Leno.

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