Número de nascimentos volta a subir após queda causada por crise e microcefalia

O aumento de casos de microcefalia, segundo especialistas, seria um dos motivos da queda de nascimentos. FOTO> Divulgação

Após contabilizar em 2016 o menor número de nascimentos em 21 anos, o Brasil voltou a registrar aumento na quantidade de bebês nascidos no País. Dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos referentes a 2017, publicados recentemente na plataforma Datasus e tabulados pelo jornal O Estado de S. Paulo, mostram que o número de crianças nascidas em 2017 foi de 2,920 milhões, ante 2,858 milhões no ano anterior – uma alta de 2,1%.

O número, no entanto, não chega ao patamar de 2015, quando o País teve 3,018 milhões de nascimentos. A queda de 5,2% registrada entre 2015 e 2016 foi motivada, segundo especialistas, pela crise econômica e pelo receio da microcefalia causada pelo vírus zika, fatores que fizeram parte das mulheres adiar a gravidez.

Foi no final de 2015 que o Ministério da Saúde descobriu que mulheres infectadas pelo zika durante a gestação poderiam dar à luz bebês com má-formações congênitas graves, a principal delas a microcefalia.

A pasta diz que os números de nascimentos de 2015, 2016 e 2017 seguem uma tendência de estabilidade. Especialistas em obstetrícia, porém, afirmam que mulheres que pensavam em ter filhos entre 2015 e 2016 adiaram os planos e retomaram o desejo um ano mais tarde, embora ainda com receio.

A professora Claudia Sampaio Nunes Ribeiro, de 30 anos, começou a pensar em engravidar em 2015. Procurou a ginecologista para ter orientações e recebeu a recomendação de adiar a gestação por causa das complicações associadas ao vírus, que não eram bem conhecidas na época. “Ela falou para a gente tentar segurar um pouco, e comecei a me adaptar para ter os cuidados que seriam necessárias na gravidez, como usar repelente”, conta ela.

Com o País em crise, o período de espera também serviu para Claudia organizar as finanças. “A crise econômica sempre interfere, porque nunca estamos 100%. Fomos planejando tudo devagar e separando dinheiro para este momento”, relata a professora.

No final de 2016, após decidir retomar o plano de ter um filho, descobriu a gravidez. Redobrou os cuidados e passou a ser acompanhada de perto pela ginecologista. “Minha médica falou para eu não ir para lugar nenhum sem falar com ela.”

Claudia deixou de ir à praia durante a gestação. Nem os parentes, que moravam no interior, receberam a visita dela durante a gestação. “Queria ter feito foto da gravidez na praia, mas fiquei com medo de ir. Parte da minha família morava em São José dos Campos (SP) na época e também não ia para lá nesse período. Passava mais repelente do que tomava água.”

Em julho de 2017, nasceu Maria Eduarda, mas os cuidados continuaram. “Coloquei tela mosquiteira nas janelas e, agora, passo repelente nela também”, afirma Claudia.

Congelamento

Mesmo entre mulheres que buscavam tratamento para engravidar e que, por causa da idade, tinham pressa, o medo do zika fez com que o plano fosse, se não adiado, pelo menos adaptado.

“Para as mulheres que tinham alguma dificuldade para engravidar, adiar era muito complicado. O que algumas fizeram, então, foi congelar os óvulos ou embriões naquela época e fazer a transferência para o útero só depois que o pânico por causa do zika passou”, diz o ginecologista e obstetra Mauricio Chehin, especialista em reprodução humana da Huntington Medicina Reprodutiva.

Ele explica que, embora o vírus zika ainda esteja em circulação no País, o maior conhecimento sobre as consequências da infecção e sobre as formas de proteção contra a doença diminuíram o temor dos casais que queriam ter um filho.

“O conhecimento sobre a doença tranquiliza. Você saber que pode evitá-la tomando medidas como usar repelente e vestuário adequado ou optando por engravidar numa época de clima mais frio e longe de regiões endêmicas fazem com que a mulher se planeje melhor e perca um pouco do medo”, afirma o médico.

Três anos após o casamento e com a filha de 1 ano e 2 meses no colo, a pernambucana Mariana Alves, de 35 anos, hoje respira aliviada. Mas a decisão de adiar a gravidez para 2017 não foi fácil. “Quando casei, em maio de 2015, já planejávamos a gravidez para, no máximo, o primeiro semestre de 2016. Tivemos de adiar tudo. Foi angustiante.”

Pernambuco foi o epicentro da epidemia. Desde 2015 até o final de 2018, foram 465 crianças nascidas com microcefalia no Estado. Em todo o País, o número de casos confirmados chega a 3,2 mil no período.

“Sempre quis ser mãe. Esperei muito por isso, mas acabei optando por adiar o sonho de engravidar. Quando ela nasceu, em outubro de 2017, e eu a vi, saudável, senti que a espera havia valido a pena”, diz ela.

Cesáreas

O índice de cesáreas feitas no País voltou a aumentar em 2017, após dois anos em queda, mostram os dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos do Ministério da Saúde.

Um dos países campeões em número de cesarianas atualmente, o Brasil viu o porcentual desse tipo de partos somente aumentar entre 1999 e 2014, quando o índice chegou a 56,99% do total de partos.

Em 2015, com a promoção de ações para reduzir o número de cesáreas desnecessárias pelo Ministério da Saúde e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a taxa caiu para 55,48%. Em 2016, teve nova queda: 55,39%. E no ano seguinte, entretanto, o índice registrou leve alta e chegou a 55,67%.

O plano da enfermeira Juliana da Nóbrega Louro, de 31 anos, era de que o parto de sua primeira filha fosse normal. Mas Marcela, nascida em maio de 2017, chegou por meio de uma cesárea indicada pela obstetra. “Estava com 37 semanas e era um domingo. Fui fazer um ultrassom e o líquido amniótico estava baixo. A médica falou que era para eu ficar e fazer o parto. Não estava muito informada sobre isso e agora sei que não precisava ter sido assim. Ela nasceu bem, foi respeitoso, mas, hoje, não fico contente.”

Medidas

Para o ministério, a taxa de cesáreas não cresceu, mas, sim, manteve tendência de estabilização em 55%. O fenômeno de estabilização, conforme a pasta, é consequência de uma série de medidas tomadas pelo governo para reduzir as cesáreas sem necessidade, entre elas a criação da Rede Cegonha e de Casas de Parto Normal e maior presença de enfermeiras obstétricas na hora do parto.

Já a ANS ressaltou que o índice de partos cesáreos nos planos de saúde caiu de 83,34% para 82,95% entre 2016 e 2017. A agência afirmou ainda que continua desenvolvendo o projeto Parto Adequado. Na atual fase da iniciativa, participam 137 hospitais privados, 25 hospitais públicos, 65 operadoras de planos de saúde e 73 hospitais parceiros, segunda a ANS.

por Fabiana Cambricoli, Paula Felix e Monica Bernardes, especial para a AE

 

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