Médico valadarense explica funcionalidade da ozonioterapia, proposta como tratamento auxiliar para Covid-19

Medida causou polêmica depois que prefeito de Itajaí (SC) anunciou tratamento na cidade por inserção retal (ânus); estudo do método no combate à Covid-19 já acontece em outros países, e está prestes a começar no Brasil

Nos últimos meses, uma série de supostos tratamentos para a Covid-19 têm ganhado destaque. O primeiro foi o uso da Cloroquina, depois vieram a Azitromicina e a Ivermectina. No entanto, nenhum desses medicamentos, que são usados para outras funções, têm eficiência comprovada contra a doença. A última possibilidade a se popularizar foi a ozonioterapia, depois que o prefeito da cidade de Itajaí, em Santa Catarina, anunciou que ofereceria o tratamento à população do município.

Diferente do que aconteceu com os outros medicamentos, entretanto, a ozonioterapia não despertou a esperança por uma cura milagrosa. Pelo contrário, a possibilidade apresentada pelo prefeito de Itajaí virou meme e foi ridicularizada nas redes sociais. Tudo isso por causa da forma como o tratamento é feito: por injeção retal (ânus). O prefeito de Itajaí, Volnei Morastoni (MDB), que é médico pediatra e especialista em saúde pública, lamentou a repercussão negativa gerada pelo anúncio.

Quem também lamenta a situação é o Dr. Arnoldo de Souza, médico valadarense, presidente da Associação Brasileira de Ozonioterapia. Ele explica que a ozonioterapia é uma técnica centenária, usada desde a Primeira Guerra Mundial, e que, apesar de ainda funcionar na medicina brasileira em caráter experimental, tem benefícios comprovados no auxílio do tratamento de várias doenças. 

O DRD conversou com o Dr. Arnoldo de Souza para entender um pouco mais sobre o que é a ozonioterapia e quais são as reais possibilidades de que ela seja usada contra a Covid-19. Confira a entrevista.

DRD – O que é a ozonioterapia e como ela funciona?

Dr. Arnoldo de Souza – A ozonioterapia é uma técnica utilizada há mais de um século. O ozônio é uma molécula onde nós temos três átomos de oxigênio, e ele tem algumas ações biológicas ativas dentro do organismo humano. Quando o ozônio se insere no organismo humano, se mistura aos fluidos biológicos e se transforma em uma parte em peróxido de hidrogênio, e na outra parte em aldeídos poli-insaturados, também chamados de lipoperóxidos.

Esse peróxido de hidrogênio tem alguns efeitos dentro do organismo. Ele é germicida, bactericida, fungicida, virustático, aumenta a oxigenação dos tecidos, melhora a performance dos glóbulos vermelhos, leva a curva de hemoglobina a ofertar mais oxigênio, portanto, ofertando mais energia ao organismo, aumentando a produção de ATP, que é a moeda de energia que existe dentro do organismo. Por outro lado, ele melhora o perfil da colocação da glicose para dentro da célula, também aumentando a produção de energia, e atua otimizando o desempenho da glândula tireóide dentro do metabolismo.

A outra parte, dos aldeídos poli-saturados, ela vai produzir alterações benéficas na imunidade celular, aumentando a resistência imunológica do paciente, pela liberação de uma molécula chamada NFR2, que vai fazer também com que haja a liberação das interleucinas anti-inflamatórias, e bloqueio do NF-kB, que promove o bloqueio das interleucinas inflamatórias. Alivia a dor, porque produz endorfinas ou estimula o organismo a produzi-las. E consegue ajudar ao sistema antioxidante interno do organismo, formado principalmente por três enzimas, a eliminar os radicais livres dentro do organismo. Essas são as ações da ozonioterapia. 

DRD – E como foi que essa técnica surgiu?

Dr. Arnoldo de Souza – Como eu disse, ela já existe há mais de um século. Começou a ser usada na Primeira Guerra Mundial, quando um cirurgião alemão, através do uso da água ozonizada em pacientes com pernas gangrenadas, conseguiu evitar um grande número de amputações. E isso foi publicado numa revista chamada Lancet, que até hoje é uma das revistas mais importantes do ponto de vista do mundo científico.

De lá pra cá, só vem crescendo a atuação do ozônio, e ele hoje está presente em todos os continentes, com destaque para países importantes que utilizam a ozonioterapia, como a Rússia, Alemanha, Cuba, Espanha, Itália, China, Índia, fazendo com que haja, então, um grande potencial de atuação para o ozônio, porque ele é uma molécula barata, pode ajudar muito nas doenças crônicas e degenerativas, e favorece com as suas atuações todos os tratamentos. O ozônio é um tratamento complementar, ele não quer ocupar o lugar de nenhum tratamento. Ele ajuda os outros tratamentos, para que eles funcionem melhor. 

DRD – E quanto ao uso da ozonioterapia no Brasil?

Dr. Arnoldo de Souza – No Brasil, a ozonioterapia ainda está bloqueada pelo Conselho Federal de Medicina, embora possa ser usada por autorização desse mesmo conselho, em trabalhos experimentais, que é exatamente o que tem sido feito por muitos centros no Brasil, para ampliar a nossa produção científica. Uma vez que, sempre que apresentou-se ao Conselho Federal de Medicina, trabalhos da Alemanha, trabalhos de outros países importantes, eles não são aceitos como uma informação científica válida, não se sabe por que, mas essa é a posição refratária do conselho. 

Porém, os outros conselhos já estão autorizando o ozônio para seus profissionais, nas suas áreas específicas. A enfermagem já pode atuar nas feridas, a odontologia já pode atuar sobre diversas patologias do âmbito da boca. A fisioterapia, da mesma forma, porque o ozônio hoje é também uma das práticas integrativas listadas no Sistema Único de Saúde pelo Ministério da Saúde. Também a farmácia já tem a sua resolução, e a biomedicina da mesma forma. Assim, nós temos hoje uma comunidade no Brasil que se interessa pela prática da ozonioterapia, e que utiliza dentro dos ditames de cada profissão, especialmente numa visão de aplicação interdisciplinar.

DRD – O senhor menciona que ela é uma opção complementar a outros tratamentos. Complementando as funções que descreveu, pode me dar exemplos de doenças que poderiam ser tratadas com o auxílio da ozonioterapia?

Dr. Arnoldo de Souza – Todas as doenças crônicas e degenerativas que cursem com o estresse oxidativo crônico têm espaço para o ozônio trabalhar. Então, o diabetes mellitus, as artropatias, as artroses, as doenças articulares crônicas, a hipertensão arterial, as doenças cardiovasculares, a aterosclerose, os processos neurodegenerativos. 

Esses processos todos cursam com o estresse oxidativo crônico elevado, com excessiva presença de radicais livres dentro do organismo, com processos inflamatórios crônicos, e a maior parte deles também com baixa na oferta de oxigênio. Em todas essas condições a ozonioterapia pode ajudar. 

E ajudar favorecendo, então, o combate à inflamação, a melhor oxigenação tecidual, eliminando os radicais livres através do estímulo do sistema antioxidante interno e endógeno de nosso organismo, e favorecendo a recuperação da homeostasia, que é a capacidade que o nosso organismo tem de se autoequilibrar todas as vezes em que esse equilíbrio de descompõe.

DRD – Existe alguma contraindicação? 

Dr. Arnoldo de Souza – Não existe nenhuma contraindicação absoluta para a ozonioterapia, apenas um cuidado excessivo quando o paciente tem uma deficiência de uma enzima chamada glicose seis fosfato desidrogenase. Quando essa doença é muito acentuada e genética, nós temos um quadro de favismo, que pode cursar, dentre outras coisas, com uma anemia. 

Então, todos os pacientes que vão se submeter de maneira sistêmica, deveriam ter essa avaliação de maneira preliminar, para que a gente possa, avaliando, definir se pode se usar em uma dose menor, mediana ou maior. A tendência hoje, mundial, é de que utilizemos a ozonioterapia em concentrações e doses baixas, porque tem sido comprovado que, com essas concentrações baixas, ele mantém a qualidade de resultados e atua, como eu disse, de maneira sinérgica, com os tratamentos convencionais.

DRD –  Algum risco no uso da ozonioterapia de forma inadequada? 

Dr. Arnoldo de Souza –Toda técnica que for usada de maneira inadequada pode trazer riscos ao paciente. Paracelsus já dizia que “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”. Então, nós precisamos trabalhar de uma maneira em que nós tenhamos consciência do que estamos fazendo. É preciso habilitar bem os profissionais, é preciso trabalhar em equipe interdisciplinar, é preciso avaliar os pacientes antes que eles venham a ser submetidos ao tratamento.

DRD – Por fim, no caso da Covid-19, já existe algum indício de eficácia, ou algum estudo em andamento?

Dr. Arnoldo de Souza – Sim, já existem trabalhos na Itália, na Espanha e também na China, cujos resultados iniciais são benéficos, mostrando trazer benefícios aos pacientes. Foram esses trabalhos que deram base aos nossos projetos submetidos ao Conselho Nacional de Ética e Pesquisa, onde pretendemos aplicar a ozonioterapia em pacientes portadores da Covid-19, em caráter ambulatorial e em caráter hospitalar. 

São dois projetos distintos, onde teremos um grupo controle que vai receber o tratamento usual, e o grupo ozônio que vai receber o tratamento usual, mais a ozonioterapia. Esses trabalhos foram aprovados pelo Conselho Nacional de Ética e Pesquisa, e nós estamos agregando parceiros, organizando a parte burocrática, para que a gente consiga dar andamento a essas pesquisas. E eu espero que os resultados sejam positivos, como têm sido os que estão em andamento nesses três países que eu já mencionei.

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