Projeto da Escola Judiciária Eleitoral do TRE junto com o Cartório Eleitoral de Águas Formosas promove a participação política de indígenas do Vale do Mucuri por meio da própria cultura
Imagine como seria escolher seus candidatos na urna eletrônica se você não falasse Português? Esta é a realidade de cerca de mil eleitores da 4ª Zona Eleitoral de Águas Formosas, os indígenas da etnia Maxakali. No último final de semana, pela primeira vez, estes eleitores puderam treinar nas urnas eletrônicas adaptadas à cultura indígena. Para a eleição, foram criados três partidos fictícios a partir do universo indígena (grandes animais, pequenos animais e animais que voam). Já os candidatos foram representados por ilustrações feitas pelas comunidades, com escrita em português e na língua indígena, pois a maior parte deles fala somente o maxakali, e alguns falam o idioma oficial do Brasil.
O projeto nasceu com o objetivo de ampliar o acesso à justiça, concretizar direitos e efetivar o exercício da cidadania pelos indígenas. A partir de rodas de conversa com a população indígena, nas quais eles apresentam suas demandas, a Justiça Eleitoral, junto com as instituições públicas participantes do projeto (a Justiça Comum, o Ministério Público, a Defensoria Pública da União (DPU), a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a Polícia Civil ) estudam soluções para cada questão levantada. “Em um desses encontros, foi apresentada a necessidade de ensinar aos eleitores indígenas como votar na urna eletrônica no dia da eleição. Foi daí que surgiu a ideia de inserir a linguagem indígena no treinamento dessa população, já que a maioria do povo maxakali não fala português”, explicou a chefe do cartório da 4ª Zona Eleitoral, Luciana Kangussu Alencar Cordeiro.
A partir daí, a Escola Judiciária Eleitoral do TRE-MG, por meio da área de pesquisa e cidadania, desenvolveu um projeto e, após diversas reuniões virtuais, apresentou a proposta inédita de preparação das urnas com motivos do universo indígena, por meio da parametrização. O juiz eleitoral, Matheus Moura Matias Miranda, explicou que o envolvimento das unidades do Tribunal foi fundamental para o sucesso da iniciativa: “A Escola Judiciária Eleitoral abraçou a causa e nos forneceu princípios e parâmetros institucionais e colaborativos que fizeram parte da construção do projeto. A STI e toda equipe foram muito importantes na parametrização e inclusão de dados e, também, na formatação da urna para essa eleição”.
Foram utilizadas ilustrações indígenas para representar os candidatos da eleição simulada. Nos cartazes, os nomes dos animais estavam escritos em Português e também na língua maxakali. “Sem dúvidas, termos ido ao encontro da cultura deles em vez de esperarmos que eles se adaptassem à nossa, foi um facilitador para inseri-los no processo democrático”, destacou a chefe do cartório eleitoral, Luciana Kangussu.
Dia de eleição indígena
As eleições ocorreram nos dias 21 e 22 de maio, em duas aldeias indígenas diferentes, nos municípios de Santa Helena de Minas e Bertópolis. Para abertura dos trabalhos, no sábado (dia 21), estiveram presentes o desembargador Marcos Lincoln, presidente do Tribunal (ao centro, de preto), o desembargador Maurício Soares, vice-presidente e corregedor, a juíza Lívia Borba, diretora-executiva da EJE-MG, o juiz Paulo Tamburini e a desembargadora Shirley Fenzi Bertão, do TJMG. O grupo ressaltou importância da valorização desse tipo de iniciativa e da implementação de projetos de participação política da população indígena. Na ocasião, o juiz eleitoral agradeceu à Presidência pelo apoio, sem o qual não teria sido possível levar o projeto adiante.
No início do encontro, os maxakali realizaram uma celebração com cantos e dança indígenas, logo em seguida o presidente do TRE de Minas, o desembargador Marcos Lincoln, destacou a importância do projeto e da inclusão dos indígenas no processo político:
“A política é natural e salutar para todas as comunidades, para toda nossa sociedade. Devemos reivindicar nossas carências nossos direitos junto as autoridades competentes, mas sempre pensando na união dos povos, porque assim poderemos chegar a um lugar comum e melhor para todas as etnias”.
Em seguida, o presidente pediu às irmãs Maria Diva (68 anos) e Margarida Maxakali (54), que estavam brigadas desde a última eleição municipal para darem as mãos e fazerem as pazes. As duas mulheres são lideranças em suas respectivas aldeias e foram adversárias no último pleito municipal. A chapa da qual Margarida Maxakali fazia parte venceu o pleito e, hoje, ela é a atual vice-prefeita de Santa Helena de Minas.
Após o pronunciamento, o presidente imprimiu a zerésima e os servidores do cartório deram início à votação e entrega de títulos eleitorais, enquanto as autoridades dos demais órgãos públicos ouviam as demandas das lideranças indígenas na roda de conversas.
Estão previstas, ainda para este ano, mais duas visitas às aldeias indígenas maxakali.
Fonte:TRE/MG