Aras pede ao STF acesso a vídeo de reunião com Bolsonaro e que 3 ministros sejam ouvidos

por FÁBIO FABRINI E RENATO ONOFRE
da FOLHAPRESS

O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu nesta segunda-feira (4) ao ministro Celso de Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), que três ministros do governo Jair Bolsonaro sejam ouvidos no inquérito que apura se o presidente tentou interferir indevidamente em investigações da Polícia Federal.

Ele também solicitou ao STF cópia do vídeo da reunião realizada entre o presidente, o vice-presidente Hamilton Mourão e ministros de Estado, além de presidentes de bancos públicos, no último dia 22, no Palácio do Planalto.

Aras entendeu ser necessário colher os depoimentos dos ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Augusto Heleno Ribeiro Pereira (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência) e Walter Souza Braga Netto (Casa Civil) para o esclarecimento dos fatos.

Os três foram citados pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, ouvido no sábado (2), como testemunhas de pressões de Bolsonaro por interferência na PF. A defesa de Moro disse nesta segunda a Celso de Mello que não se opõe à divulgação da íntegra de seu depoimento.

Em relação à reunião ministerial citada, ela foi convocada por Bolsonaro para discutir o programa Pró-Brasil e gravada pela própria Presidência.

Em depoimento, Moro disse que o mandatário afirmou na frente de ministros presentes que, se ele não concordasse com a substituição do superintendente da Polícia Federal do Rio, seria demitido.

O ex-ministro relatou que o presidente chegou a errar a função do superintende ao cobrar a troca do comando da PF fluminense. “Se eu não posso trocar o diretor de segurança do Rio, eu troco o DG [diretor geral]. Se eu não puder, em troco o ministro”, teria dito Bolsonaro segundo afirmou Moro em depoimento à PF.

Em seu depoimento, o ex-ministro afirmou que Bolsonaro queria acesso a um relatório de inquéritos em curso na PF. Moro disse que não poderia dar tal informação, a que “nem ele mesmo teria acesso”.

Ele afirmou que o ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) discordou do presidente e disse que os relatórios que ele queria não poderiam ser fornecidos.

O ex-ministro afirmou ainda que é possível provar a entrega dos relatórios técnicos da PF à Presidência através dos protocolos eletrônicos no sistema de inteligência mantido pela a Abin (Agência Brasileira de Investigação), responsável por compilar as informações. A defesa de Moro requisitou a informação à Justiça.

Moro ainda relatou que conversou no dia seguinte à reunião com os ministros militares do governo Walter Braga Netto (Casa Civil), Luiz Eduardo Ramos (Governo) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) sobre a pressão de Bolsonaro.

De acordo com o ex-ministro da Justiça, no entanto, não há provas físicas do conteúdo da conversa dele com os três logo após a reunião privada com o presidente da República na quinta (23) no Planalto.

O procurador-geral também requer a oitiva da deputada federal Carla Zambeli (PSL-SP). Moro entregou mensagens trocadas por ela, via celular, como prova de que não teria aceitado ingerência sobre o órgão de investigação.

Um dos pontos chave do depoimento foi quando um representante da PGR (Procuradoria-Geral da República) perguntou ao ministro se ele teria recebido uma oferta direta por parte do Bolsonaro para trocar a nomeação do DG pela sua indicação ao STF.

Moro afirmou aos investigadores que a sugestão teria partido da deputada por meio de mensagens —reveladas pela TV Globo e às quais a reportagem teve acesso– encaminhadas a ele e a outras pessoas próximas ao ex-ministro.

Moro permitiu no sábado que a PF copiasse dados de seu telefone.

Nesta segunda, Aras solicitou ao ministro do Supremo a elaboração de um laudo pericial da PF sobre o conteúdo, “bem como um relatório de análise das mensagens de texto e áudio, imagens e vídeos”.

A necessidade das diligências será analisada por Celso de Mello.

Aras também pediu outras providências, como as oitivas do ex-diretor-geral da PF Maurício Valeixo —cuja demissão levou Moro a romper com o presidente— e as dos delegados Ricardo Saadi, Carlos Henrique de Oliveira Sousa, Alexandre Saraiva, Rodrigo Teixeira e Alexandre Ramagem Rodrigues.

O objetivo é que eles prestem informações acerca de “eventual patrocínio, direto ou indireto, de interesses privados do presidente da República perante o Departamento de Polícia Federal, visando ao provimento de cargos em comissão e a exoneração de seus ocupantes”.

O procurador-geral solicitou ainda comprovantes de autoria das assinaturas da exoneração de Valeixo, publicada no Diário Oficial da União em 23 de abril, além de eventual documento com pedido de exoneração, a pedido, encaminhada por Valeixo ao presidente. O propósito é checar se houve fraude.

O Diário Oficial registrou a demissão como “a pedido” do diretor-geral e com a assinatura eletrônica de Moro. Mas o ex-ministro disse que não houve manifestação do delegado nesse sentido e que, como chefe da pasta da Justiça, não subscreveu o ato.

O pedido de Aras é para que o inquérito seja encaminhado à PF e que as oitivas sejam agendadas dentro de um prazo de cinco dias úteis, contados a partir da intimação, com prévia comunicação da PGR.

Ao deixar o cargo no último dia 24, Moro acusou Bolsonaro de tentar substituir Valeixo para interferir em investigações da Polícia Federal.

Ele disse que o presidente estava preocupado com inquéritos em curso no STF e que têm potencial de atingir seus filhos e aliados.

A Polícia Federal pediu ao Supremo sigilo no depoimento prestado pelo ex-ministro. O pedido foi feito no próprio sábado, logo após Moro depor por mais de oito horas na Superintendência da PF em Curitiba.

“Foi um pedido da PF que cabe ao ministro Celso de Mello analisar”, afirmou o advogado Rodrigo Sanchez Rios, que representa o ex-juiz da Lava Jato.

A defesa de Moro também apresentou uma série de requerimentos pedindo acesso a documentos e vídeos do governo citados por Moro na oitiva para ajudar nas investigações.

Os advogados do ex-ministro requereram ainda uma perícia no celular de Zambelli para acessar as trocas de mensagens.

No depoimento, Moro rebateu uma das acusações do presidente que disse que o ex-ministro não lhe dava acesso a relatórios da Polícia Federal. O ex-ministro mostrou aos investigadores que Bolsonaro teve acesso a relatórios de inteligência sobre narcotráfico, fronteiras e, até, sobre a Covid-19 produzidos pela PF.

O ex-ministro passou os dois dias anteriores ao depoimento preparando a sua versão do conflito com Bolsonaro.

Moro estava preparado até para explicar o pedido de pensão feito por ele a a Bolsonaro e ao ministro Paulo Guedes (Economia) antes mesmo de aceitar fazer parte do governo.

O então juiz da Lava Jato disse aos dois que tinha medo que algo acontece com a sua vida e sua família ficasse desassistida. Tanto delegados da PF quanto procuradores da República não questionaram o ex-juiz sobre o caso.

Após prestar depoimento, Moro entregou seu celular para a PF extrair cópias das conversas relevantes para a investigação. O ex-ministro avisou que não guardava diálogos antigos por ter receio de ser alvo de novos ataques hacker.

As declarações de Moro aos investigadores não foram gravadas em vídeo como era de costume da Operação Lava Jato. O depoimento foi transcrito em dez páginas anexadas à investigação que corre no STF.

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