Há 17 anos, a Apac trabalha em prol do restabelecimento social de mulheres condenadas
Para as 73 mulheres que vivem na Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) de Governador Valadares, a condenação judicial está longe de ser uma sentença para toda a vida. Muito pelo contrário. É tempo de recomeçar.
É nisso, portanto, que acreditam os voluntários da associação. Inclusive ao reforçar que o local não funciona como um tradicional presídio, mas como um centro para acolhimento, aprendizado e ressocialização das mulheres. “Elas são tratadas com dignidade. Elas usam o próprio nome, voltam a identidade da recuperanda. Então lá [na Apac] é bem diferente do sistema prisional”, disse o presidente da Apac, Renato Soyer.
Recursos de convênio e Estado
A Apac é uma unidade dedicada à recuperação e à reintegração social de mulheres condenadas a penas de reclusão. De acordo com a associação, a estrutura da Apac é mantida com recursos de convênio com o Estado. E nas unidades administradas pelas APACs, predomina o trabalho voluntário de médicos, dentistas, advogados, psicólogos, assistentes sociais, psiquiatras, educadores, religiosos e artesãos.
Colaboração
Hoje, as recuperandas da Apac se acomodam em ambientes divididos por quatro pessoas, sem superlotação. Todo o espaço de convivência é organizado e limpo pelas próprias ocupantes. Elas auxiliam desde a limpeza do espaço, segurança do local, até a portaria da instituição. Elas ainda possuem salas de aula destinadas a estudos e cursos, com horários livres para lazer.
O local tem capacidade para acolher 82 mulheres, sendo 62 no regime fechado e 20 no regime semiaberto. Em outubro de 2021, a Apac tinha 53 mulheres acolhidas. Mas, como mencionado, atualmente a associação registra um total de 73 recuperandas em ambos os regimes. Contudo este número pode sofrer variações em caso de desligamentos ou transferências.
De acordo com o presidente Renato Soyer, o local vem passando por grandes reformas. Contudo a previsão é que logo a unidade atinja a marca de 82 mulheres acolhidas.
Educação
A associação explica que, ao ser acolhida na unidade, a recuperanda é apresentada ao conjunto de hábitos que regem a rotina da instituição, também nomeado de “metodologia apaqueana”. A partir dessa primeira ambientação, a nova acolhida é inserida nas atividades diárias. Ou seja pela laborterapia – técnica de reeducação com base no valor do trabalho, que atualmente é a prática do crochê. E se não tiver concluído o ensino básico, também é matriculada na escola que funciona dentro da Apac. Atualmente, portanto, são ofertados os ensinos fundamental e médio.
Artesanato
De acordo com os responsáveis pela Apac, além do trabalho e do ensino, outra atividade que está entre as principais realizadas é o artesanato. Desse modo, as recuperandas aprendem técnicas de trabalhos manuais, produzem peças a partir do que aprenderam. Em seguida as peças são vendidas. Além disso, a Apac oferece cursos profissionalizantes com o propósito de capacitar as mulheres para o trabalho.
“Hoje nós temos vários cursos acontecendo na Apac. Temos cursos profissionalizantes na área de informática, na área de cabelo, maquiagem, estética, unha em gel, culinária, confeitaria. Então, hoje, a gente tem dado às recuperandas, além da oportunidade de voltarem ao estudo médio e inicial, o tempo aproveitado no cumprimento da pena. Para que elas possam estar se profissionalizando. E, ao sair dali, tenham um emprego digno e não cometam nenhum tipo de crime. Nada que possa desabonar sua conduta”, explicou Soyer.
Apoio de voluntários e empresas locais
Dessa forma para realizar esses serviços, a unidade também conta com o apoio de voluntários e empresas locais. Tais empresas, inclusive, oferecem vagas de emprego para as recuperandas do regime semiaberto ou egressas. “A Apac, hoje, traz toda a sociedade para perto das recuperandas. É uma pessoa marginalizada pela sociedade que, com pouco tempo que está ali, já se sente acolhida pela sociedade”, acrescentou.
“Primeiro quero agradecer a oportunidade de estar falando sobre a Apac ao DIÁRIO DO RIO DOCE. A gente tem tido condições, hoje, de estar ajudando 82 recuperandas a cumprirem suas penas de uma forma digna, sociável. E onde há, dentro desse cumprimento de pena, o envolvimento delas em coisas que vão trazer benefícios para elas”, declarou Soyer.
‘Pessoas boas existem’; veja uma linda carta enviada por uma recuperanda da Apac
Ela tem 41 anos e, há 8 meses, está na associação. Dentre as principais conquistas, aliás, citadas por ela em entrevista ao DRD, está a conclusão dos estudos. A recuperanda, cujo nome manteremos em sigilo por respeito, entrou na associação tendo estudado somente até a 4ª série do ensino fundamental. Hoje, além de ter concluído o ensino básico, já participou de diversos cursos profissionalizantes.
“Sou C.M. e fui privada de minha liberdade em 12/04/2019. Em dois anos, passei por quatro presídios. Na data de 12/04/2022 cheguei na Apac de GV, conseguindo uma vaga onde várias pessoas têm o sonho de conseguir. Pois, quando estamos nos presídios, ouvimos falar de várias APACs, onde contam relatos de que é melhor para pagar nossa pena. Conseguir remissões para o mais rápido irmos para casa. E muitos falam, também, de como seremos tratadas com dignidade.
Muitas dessas pessoas já estiveram em uma Apac e voltaram para o sistema. [Porém] sei que as pessoas que passaram por aqui e não quiseram mudança de vida estão, hoje, sofrendo com tudo de ruim que é um presídio. Eu, desde que cheguei na Apac, fui acolhida com dignidade. Chamada pelo meu nome e não por um número. Tenho um ano e oito meses de Apac e posso dizer que Deus tem estado sempre no controle da minha vida e de todas as pessoas que administram as APACs. Eu aprendi, aqui, que pessoas boas existem.
Minha esperança é sair daqui, buscar meus sonhos, pôr em prática meus projetos e estar junto da minha família”.