A diretoria da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) escolheu o delegado da Polícia Federal José Fernando Moraes Chuy, ligado ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, para a corregedoria-geral da agência.
O próximo corregedor, cuja função abrange a prevenção e apuração de irregularidades no âmbito administrativo, deve assumir eventuais procedimentos relacionados à “Abin paralela”, estrutura que teria funcionado no governo Bolsonaro para blindar os filhos do ex-presidente, espionar ilegalmente autoridades e atacar a credibilidade do sistema eleitoral.
Chuy deve substituir a oficial de inteligência Lidiane Souza dos Santos, indicada para o cargo em 2022 pelo ex-diretor da Abin Victor Carneiro, aliado do deputado federal e ex-diretor-geral da agência Alexandre Ramagem (PL-RJ), um dos alvos da PF.
O mandato de Lidiane termina em 31 de agosto e poderia ser renovado por mais dois anos, mas autoridades afirmam que é natural a substituição do nome em meio às suspeitas que recaem sob a gestão anterior e à mudança de governo.
Apesar de a troca ainda não ter sido formalizada, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, já deu aval à ida do delegado para a Abin. O nome de Chuy também circula entre servidores da agência, que reclamam de mais um policial federal em cargos de alto escalão e, neste caso, com mandato até 2026.
O atual diretor-geral, Luiz Fernando Corrêa, é delegado da Polícia Federal e foi diretor-geral do órgão no segundo governo Lula. Já o chefe de gabinete de Corrêa, Luiz Carlos Nóbrega Nelson, foi superintendente da PF no Rio Grande do Norte no governo Bolsonaro.
Chuy foi escalado por Moraes para a chefia da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em maio do ano passado e ficou no cargo até junho deste ano, quando Cármen Lúcia assumiu a presidência do tribunal.
Os dois também trabalharam juntos quando Moraes era ministro da Justiça, no governo Temer. Na ocasião, Chuy era secretário-executivo do Conselho Nacional de Combate à Pirataria, estrutura subordinada ao ministro da pasta.
Moraes escreveu ainda o prefácio do livro de Chuy “Operação Hashtag A primeira condenação de terroristas islâmicos na América Latina”, publicado em 2018.
Chuy e a Abin foram procurados pela reportagem, mas não quiseram se pronunciar.
A Intelis, associação que representa os servidores do órgão, afirma que a indicação de um corregedor-geral “oriundo de fora dos quadros da agência” é “preocupante, injustificada e um desprestígio dos servidores orgânicos da Abin”.
A associação também aponta que a investigação sobre o uso indevido do software de monitoramento FirstMile pela “estrutura que parasitou a Abin” foi iniciada pela atual corregedora, que é oficial de inteligência.
Integrantes da Abin, porém, afirmam que a apuração iniciada pela corregedora esteve recheada de falhas e não teve eficácia, tendo sido boicotada pelos servidores. Tanto que uma sindicância foi instaurada pela nova gestão após o caso FistMile vir a público.
A Intelis aponta ainda que a PF pediu à Moraes que é relator da investigação o compartilhamento das provas com a corregedoria da Abin, o que demonstraria, segundo a associação, “a total cooperação da unidade” com as investigações.
“Temos certeza que a instituição possui excelentes quadros para ocupar a função e por isso consideramos irrazoável e nos preocupa as consequências de uma indicação como essa em uma instituição republicana.”
Aliados de Chuy destacam, por outro lado, a formação acadêmica e as experiências anteriores. Além da passagem pelo TSE, ele foi coordenador de Enfrentamento ao Terrorismo da Diretoria de Inteligência Policial da PF.
Outra credencial celebrada por entusiastas do nome é o doutorado em direito e segurança pela Universidade Nova de Lisboa, defendido em 2023. Em 2018, ele concluiu mestrado sobre “as redes sociais e a promoção de organizações terroristas”, no Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna.
Como mostrou a Folha, a PGR (Procuradoria-Geral da República) e Moraes mantiveram sob suspeita a atual gestão da Abin na última fase da operação que investiga o uso da agência em ações clandestinas no governo Bolsonaro.
A desconfiança que recai sob “as novas gestões” fizeram com que Moraes negasse o compartilhamento da investigação da PF com a corregedoria da agência para a abertura de sindicâncias internas.
No parecer enviado ao STF, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou que compartilhar as informações “não parece recomendável neste momento processual” diante da “aparente resistência identificada no interior” da Abin.
Gonet afirmou que não vê urgência na abertura de eventuais procedimentos internos, como pedia a PF, e sugeriu que as provas fossem compartilhadas apenas com as investigações encerradas. THAÍSA OLIVEIRA E RANIER BRAGON/FOLHAPRESS