“A pandemia nos obriga a vivenciar uma série de perdas”, diz professor da UFMG

Leandro Malloy, que participa de estudo sobre os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental dos brasileiros, afirma que a doença é gatilho para novos diagnósticos, agravamento de quadros e recaídas

Atendimentos e mortes; falta de profissionais e equipamentos; aumento de internações por doenças crônicas não monitoradas. Esses cenários resumem as chamadas três ondas da pandemia de Covid-19. Até essa quarta-feira (27), a doença havia atingido 5,6 milhões de pessoas e provocado 356 mil mortes ao redor do mundo.

Mais silenciosa, mas não menos preocupante, uma quarta onda da pandemia também ameaça a humanidade. Trata-se dos traumas psicológicos e aumento das doenças mentais. Esses são problemas decorrentes de fatores como alteração de rotinas, projetos frustrados, perdas financeiras, isolamento social, risco de adoecimento e morte.

Pesquisa

São muitas mudanças em poucos meses. Como você está se adaptando a elas? A resposta a essa pergunta vai subsidiar pesquisa que pretende avaliar os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental da população adulta brasileira. Os voluntários precisam ter mais de 20 anos e preencher formulário on-line. Caso desejarem, poderão receber seu relatório e ser acompanhados, via e-mail, durante 18 meses.

A pesquisa, que tem caráter longitudinal, pretende sistematizar respostas de cinco mil voluntários. Assim, estão sendo coletados informações sobre qualidade de vida, sono, funcionalidade, vivência do estresse e outras variáveis relacionadas à saúde mental. Durante dois anos, os pesquisadores pretendem verificar como essas variáveis serão alteradas em função do tempo de exposição direta ou indireta à doença.  

De acordo com o professor Leandro Fernandes Malloy Diniz, do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, e presidente da Associação Brasileira de Impulsividade e Patologia Dual (ABIPD), cerca de 20% dos brasileiros sofrem de algum transtorno mental. “É uma parcela significativa da população que, muitas vezes, não chega a ter um diagnóstico correto. Isso em virtude de uma série de informações equivocadas e estigmatizantes que levam ao medo de buscar ajuda”, afirma.

Leandro Malloy é psicólogo e coordena a pesquisa ao lado da professora Débora Marques de Miranda, também da Faculdade de Medicina da UFMG, e do presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Antônio Geraldo Silva. Em entrevista ao Portal UFMG, Leandro Malloy fala sobre o estudo e alerta para a necessidade de informar, desmitificar e identificar alvos de ação para combater os efeitos da quarta onda da pandemia.

Leandro Malloy fala sobre impactos da pandemia na saúde mental
Leandro Malloy: prevenção e intervenção precoce. Acervo pessoal / Facebook

Como a pandemia da Covid-19 influencia a saúde mental e como o sistema de saúde está estruturado (ou não) para lidar com essa quarta onda?

Toda ou qualquer situação que provoca mudanças intensas e em grande velocidade na vida das pessoas tende a apresentar um enorme risco de impacto em saúde mental. Portanto no caso da Covid-19, fomos expostos a uma série de mudanças em nossas rotinas. Além disso há um cenário de incerteza e risco para nossa saúde, atividades profissionais, econômicas etc. Somos bombardeados por notícias de todos tipos, as quais, muitas vezes, alimentaram posturas negacionistas e pouco saudáveis.

Fato é que, à medida que somos forçados a encarar uma série de mudanças, vivenciamos uma série de perdas. Por exemplo, elas envolvem alterações em pequenas rotinas, frustrações de projetos, pressão financeira, incerteza profissional, risco de adoecimento e morte tanto para nós quanto para parentes e amigos. Esse cenário pode potencializar danos à saúde mental de várias formas. Ele é gatilho para novos diagnósticos, para o agravamento de quadros de adoecimento em curso ou para recaídas/recidivas.

Qual o papel da medicação psiquiátrica e ou acompanhamento psicológico de pacientes diagnosticados, mesmo que a distância, especialmente nesse contexto?

As iniciativas de prevenção e intervenção precoce são fundamentais. Para isso, as autoridades em saúde pública devem alertar a população sobre rotinas que possam minimizar a chance de maior impacto sobre a saúde mental. A manutenção de hábitos relacionados à atividade física, cuidados com sono e alimentação, manutenção de contatos sociais por ambiente virtual, criação de uma rede de apoio são algumas medidas que podemos sugerir.

Que sinais indicam que precisamos buscar ajuda e quais serviços estão disponíveis?

Além da orientação, existem diversos serviços de atendimento às emergências psiquiátricas em hospitais públicos e privados. Recorrer ao profissional de saúde mental é fundamental quando são percebidos os primeiros sinais de impacto da angústia, preocupação e sofrimento sobre a funcionalidade e realização de atividades no dia a dia.

No Brasil, a saúde mental ainda é tabu ou causa de preconceito, seja no ambiente familiar ou no trabalho. Como a pesquisa Covid-19 e saúde mental: como você está se adaptando? pode contribuir para políticas públicas na área e quais expectativas em curto, médio e longo prazo em relação aos cuidados com profissionais de saúde e a população durante e após a pandemia?

Cerca de 20% das pessoas sofrem algum transtorno mental. É uma parcela significativa da população que, muitas vezes, não chega a ter um diagnóstico correto. Isso em virtude de uma série de informações equivocadas e estigmatizantes que levam ao medo de buscar ajuda.

Nesse momento, o sofrimento e o estresse ligados à incerteza e à necessidade de adaptação estão colocando um número imenso de pessoas em risco.

Informar, desmitificar e identificar alvos de ação podem ser alguns dos passos mais fundamentais para trazer à população formas de manejo desses quadros. Nossa pesquisa pretende apresentar à comunidade científica, às autoridades na área de saúde e à população em geral os principais impactos da Covid-19 sobre sintomas como ansiedade, depressão, agressividade entre outros. Esses sintomas podem ser a base de uma série de prejuízos e disfunções de pessoas de diferentes idades. 

Como o senhor avalia o papel das universidades, como a própria UFMG, que tem sua Rede de Saúde Mental, na proposição de políticas para o ensino, pesquisa e extensão?

As universidades são protagonistas no processo, já que seu objetivo é produzir conhecimento de qualidade, formar profissionais capacitados e oferecer à comunidade recursos e aplicações de excelência. Mais do que isso, ela visa estabelecer ligações com os diferentes setores da sociedade para que tal produção seja extramural. É preciso compor o que chamamos na literatura de “políticas públicas influenciadas por evidências”, conceito que se refere à construção de políticas públicas fundamentadas em conhecimentos científicos.

(Com informações e imagens da Universidade Federal de Minas Gerais)

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