[the_ad id="288653"]

A Era das Chamas: mais de 6 mil incêndios florestais registrados neste ano em MG

— FOTO: Evandro Rodney

GOVERNADOR VALADARES – O céu tomado pela escuridão e sufocantes nuvens de fumaça; no solo, milhares de hectares em chamas: essas foram as imagens de Minas Gerais que mais repercutiram nas últimas semanas. As queimadas florestais têm dizimado gradativamente a paisagem do estado reconhecido por suas belezas naturais. Com o maior número de focos de incêndio registrado em 14 anos, a Mata Atlântica mineira clama por ajuda e nos faz refletir: é possível controlar o fogo?

Causas

Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Minas Gerais já teve mais de 6.191 focos de incêndio em áreas de vegetação apenas em 2024, sendo o maior número para o mesmo período (janeiro a setembro) desde 2010. Somente no mês de agosto foram registrados via satélite 2.488 focos no estado. 

Segundo monitoramento do Inpe, no mês de agosto foram registrados mais de 2,4 mil incêndios florestais. — Gráfico: DRD

Mas, não é de hoje que as florestas mineiras ardem em brasas. De acordo com estudos de historiadores ambientais, a devastação da Mata Atlântica na região do Vale do Rio Doce é uma consequência do extrativismo das indústrias de mineração, siderurgia, agropecuária e madeireira, que se intensificou em meados do século XX. Desde aquela época, os posseiros abriam clareiras utilizando inadequadamente o fogo para limpeza e fertilização do solo. Assim, os incêndios florestais se alastravam por grandes extensões e dias.

Décadas se passaram, e nada mudou. Segundo o especialista em direito ambiental e mestre pela UNIVALE, Guilherme Rosa Thiago, as motivações para as queimadas seguem sendo as mesmas. “No Vale do Rio Doce, a principal causa é a utilização do fogo como ferramenta para manejo do solo. Por exemplo, algum produtor rural resolve “limpar o pasto” com fogo e ignora a influência da intensidade e direção do vento, além de não verificar se os aceiros estão bem executados para interromper a propagação do fogo. Assim nasce uma queimada descontrolada”, explica.

Além disso, conforme descreve o especialista, a região do leste mineiro é marcada por duas estações bem definidas, uma seca e uma chuvosa. Dessa forma, entre abril e setembro, a grande quantidade de vegetação seca durante o tempo de estiagem favorece o alastramento das chamas.

Efeitos

Então, se o uso do fogo como ferramenta para limpeza da vegetação ficou fora de controle, qual é o resultado disso? É possível observar claramente enquanto as chamas se espalham e destroem o bioma da região, causando danos à saúde humana e contribuindo para o agravamento das mudanças climáticas. 

Antes de seu crescimento econômico, o Vale do Rio Doce era coberto por densas florestas de Mata Atlântica, mas, como foi destacado, essa vegetação foi rapidamente consumida pela indústria, o que modificou o clima da Bacia Hidrográfica. De acordo com pesquisas, uma das consequências dos incêndios florestais é o aumento das secas durante todo o ano, principalmente nas proximidades de Governador Valadares e Aimorés, locais em que a deficiência hídrica já indica a formação de um processo climático de semiaridez.

Baseado no Índice Integrado de Secas (IIS), que combina três componentes essenciais: déficit de chuvas, umidade do solo e condição da vegetação. — Gráfico: DRD

Por outro lado, a crise climática influenciada pelas queimadas também resulta nos eventos extremos que ocorrem durante o período chuvoso, como as enchentes. Nos últimos 40 anos, a frequência de alagamentos em Governador Valadares mais que duplicou, segundo dados disponíveis do SAAE.

Como impedir esse Piroceno?

É assim que, incapaz de controlar as queimadas, o homem sai de cena no Antropeceno (nome dado para a Era dos Humanos) e dá lugar às chamas do Piroceno, a Era do Fogo. Esse é um conceito proposto pelo historiador ambiental Stephen Pyne, que diz que o fogo, enquanto parte dos ciclos naturais, se manteve dentro dos limites ecológicos. “Mas, foi exatamente a apropriação do fogo pela espécie humana enquanto uma ferramenta tecnológica para exercer o domínio sobre a natureza, e seu uso desenfreado, que nos levou ao Piroceno”, explica o pesquisador Guilherme Rosa.

FOTO: Leando Couri/EM/D.A Press

No entanto, encontrar formas para controlar as chamas não é o caminho recomendado para interromper o Piroceno. Para o especialista em direito ambiental, o mais indicado seria o ser humano avançar na outra direção e desistir da ideia de dominar a natureza. “[O ideal seria] trocar a lente com que enxergamos o planeta e seus recursos naturais: em vez de dominar para consumir, podemos cuidar para florescer e frutificar“, afirma.

Sendo assim, para evitar que a Era das Chamas continue em curso, é necessário cessar a exploração dos recursos e elementos naturais, especialmente diante de um cenário de crise climática. Em vez de tentar moldar a natureza a partir da ganância humana, devemos focar na recuperação dos danos já causados, aproveitando o pouco tempo que ainda nos resta.

Restauração

Segundo Guilherme, é possível que a natureza restaure as áreas impactadas a longo prazo, porém também existem ações de reflorestamento que podem e devem ser feitas para que o processo seja mais ágil. “Em ambos os casos é necessário que existam medidas de proteção e prevenção para evitar que novos incêndios atrapalhem a recuperação“, ilustra.

Para a preparação dos combatentes, uma das políticas públicas que podem ser aderidas a nível municipal é a capacitação de brigadistas. No estado, já existe o programa Minas Contra o Fogo, uma eficiente formação conjunta entre Semad, IEF, Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec) e Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG) que fortalece o combate aos incêndios florestais. 

Enquanto isso, para garantir o reflorestamento da Mata Atlântica, é importante apoiar e incentivar iniciativas que promovam a restauração ambiental e o desenvolvimento rural sustentável. Em destaque na região, há a atuação do Instituto Terra, fruto da iniciativa do casal Lélia Deluiz Wanick Salgado e Sebastião Salgado, que em duas décadas de trabalho tem transformado milhares de hectares de áreas degradadas do Vale do Rio Doce em florestas novamente.

Antes e o depois da sede do Instituto Terra em Aimorés, MG. — FOTO: Arquivo/Instituto Terra

Provocar incêndios é crime. Denuncie!

De acordo com o art. 41 da Lei 9.605/98, causar incêndios em vegetação é tipificado como crime ambiental, o que pode resultar em pena de reclusão de dois a quatro anos, além de multa. Também é crime o manejo de fogo em regiões de reservas ecológicas, preservação e parques florestais.

Como foi destacado, a principal causa dos incêndios é pela ação humana. Por isso, caso veja alguém provocando fogo em vegetação, denuncie pelo Disque-Denúncia no número 181, de forma anônima ou pelo telefone 190, da Polícia Militar.

Também entre em contato com a Cemig (116) e com o Corpo de Bombeiros (193), se identificar algum incêndio, para que o combate seja efetuado o mais rápido possível.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

[the_ad_placement id="home-abaixo-da-linha-2"]

LEIA TAMBÉM