Profissional da saúde mental afirma que a desistência de Biles nas Olimpíadas, a fim de priorizar o bem-estar emocional, foi um grande ato de coragem
Nesta semana, uma das maiores ginastas da atualidade, a norte-americana Simone Biles, de 24 anos, abandonou as competições por equipes e individual geral de ginástica artística, nas Olimpíadas de Tóquio. Segundo a atleta, o motivo da desistência seria para priorizar sua saúde mental.
“Tenho que me concentrar na minha saúde mental e não colocar em risco minha saúde e bem-estar. Temos que proteger nosso corpo e nossa mente, ao invés de apenas fazer o que o mundo quer que façamos. É uma merda quando você está lutando com sua própria cabeça”, disse a ginasta aos repórteres.
Biles chocou o mundo após a desistência, mas não os psicólogos, que, ao contrário de muitos, aplaudiram a atitude da atleta. Por isso, o Diário do Rio Doce conversou com uma profissional da área para saber por que o ato da atleta é considerado tão importante para seu bem-estar neste momento.
A ginasta se referiu à própria atitude como um “passo atrás”. Contudo, a psicóloga Lygia Maria Gripp discorda. “Jamais seria um passo para trás; pelo contrário, foi um grande passo à frente na sua saúde e bem-estar. Um bom desempenho numa competição depende que um atleta esteja bem de forma técnica e emocional, com a saúde mental bem preservada”, afirma.
Para a profissional, a escolha de Biles foi um grande ato de coragem. “Seja uma decisão em olimpíadas ou não, ela precisou priorizar a si mesmo antes de qualquer coisa. Nada mais correto e necessário do que priorizar sua saúde mental. Como poderia estar bem para competir se psicologicamente ela se viu abalada? Acredito ser um grande ato de coragem”, avaliou.
Lygia diz que vários fatores podem ter gerado os desconfortos psicológicos na ginasta. “A saúde mental é um fator muito importante, que precisa dos ajustes necessários para lidar com as emoções positivas e negativas. As causas mais comuns que podem interferir de maneira direta na convivência humana e principalmente nos ambientes de trabalho são: o cumprimento de metas irreais, demandas abusivas, carga excessiva de trabalho, intimidações, agressividade e bullying”, explica.
A psicóloga ainda ressalta que o caso de Biles não é o primeiro, e cita a tenista japonesa Naomi Osaka, que tratou de questões de saúde mental ao ser derrotada nas Olimpíadas em Tóquio, na terça-feira (27). “O caso da Biles se tornou público, mas inédito e incomum não é. Temos a tenista japonesa, que abandonou seu último torneio antes das olimpíadas por necessidade de cuidar da saúde mental, explicando que sofre de depressão há anos”, relembra.
Assim como afirmou o porta-voz da Comissão Olímpica Internacional, Mark Adams, Lygia diz que mais poderia ser feito pela saúde mental dos atletas. “Cabe aos profissionais de acompanhamento dos grandes atletas e a todo o mundo reverem a extrema pressão e, muitas vezes, a falta de empatia que levam a ansiedade, estresse e depressão. Uma pessoa sob muita pressão fica muito ansiosa e vai ter um desempenho pior por conta disso. Cai a concentração e diminui o autocontrole”, lamenta.
Por isso, Lygia considera importante que atletas e treinadores façam acompanhamento psicológico, a fim de lidar com a pressão e ansiedade. “É importante que se tenha um preparo com o atleta em relação à vitória e à derrota. Também é preciso lembrar que eles são de carne e osso, estando sujeitos a erros, quedas e lesões. Além da rotina de treinos exaustivos, que muitas vezes os ausentam da vida social e convivência familiar, influenciando diretamente na sua qualidade de saúde mental e também dos treinadores que os acompanham.”
Por fim, a psicóloga aplaude a maturidade de Simone Biles, e diz que a atitude por si só já valeu o ouro. “Não compensa o título se você não consegue estar feliz por tê-lo conquistado, mas talvez aliviada pelo fim da competição. O que ela fez valeu, com certeza, mais que a medalha de ouro”, finaliza.