O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria nesta quinta-feira (22) para confirmar a decisão da Segunda Turma da corte que declarou a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro na condução do processo do tríplex de Guarujá, que levou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à prisão por 580 dias. Sete dos 11 ministros já votaram nesse sentido, enquanto dois divergiram.
O julgamento, porém, foi suspenso por pedido de vista —mais tempo para análise— do ministro Marco Aurélio, e a sessão foi encerrada em meio a um bate-boca entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.
O tribunal entendeu que o reconhecimento da incompetência territorial da Justiça Federal no Paraná e a anulação das condenações do petista não invalidaram a discussão sobre a atuação de Moro no caso.
A maioria dos ministros divergiu da posição do relator, Edson Fachin, e impôs uma derrota à Lava Jato. Ele foi seguido apenas por Barroso. Ainda faltam votar Marco Aurélio e o presidente, Luiz Fux, que devem se alinhar à corrente que ficou vencida. O julgamento ainda não tem data para ser concluído.
Fachin ficou vencido ao defender que o habeas corpus em que a defesa do petista alegou a suspeição do ex-juiz não poderia ter sido julgado porque teria perdido o objeto após a retirada das ações de Curitiba e a ordem para os casos retornarem à fase da análise da denúncia.
Os ministros Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Rosa Weber foram no sentido contrário e afirmaram que o pedido dos advogados para declarar Moro parcial não estava vinculado ao debate sobre o foro competente para julgar Lula.
Desta forma, o plenário manteve a decisão do início de março da Segunda Turma segundo a qual Moro não agiu de maneira imparcial na condução do processo de Lula.
A decisão é uma vitória para o petista e o deixa mais distante de uma eventual nova condenação pelo juiz que assumirá os processos que foram retirados de Curitiba. Isso porque a declaração da suspeição tem como consequência a anulação das provas colhidas naquele processo.
Nas outras três ações enviadas para a Justiça Federal no Distrito Federal, o novo magistrado do caso terá a opção de convalidar as provas que estão nos autos e acelerar a tramitação das denúncias do MPF (Ministério Público Federal) contra o petista.
No caso do tríplex, por sua vez, isso não será possível, pois há jurisprudência consolidada no sentido de que todos os elementos de ação conduzida por juiz suspeito estão contaminados e não podem mais ser considerados pela Justiça.
Nesta quinta-feira, os ministros não entraram no mérito da atuação de Moro, mas julgaram se a decisão da Segunda Turma deveria ou não ser mantida do ponto de vista processual.
E prevaleceu o entendimento de que revogar a decisão da turma não seria correto e criaria um precedente perigoso para o tribunal.
“Ao permitirmos que o plenário reanalise uma sessão julgada pela turma fora das hipóteses regimentais, como é o caso de embargos de divergência, por exemplo, nós estaríamos subvertendo a própria ordem regimental”, disse Moraes.
O ministro afirmou que uma decisão no sentido oposto seria o mesmo que o plenário rever decisão da turma.
“O plenário é soberano no exercício das suas atribuições regimentais e não há nessa hipótese previsão recursal de decisão da turma pelo plenário. A própria turma debateu sobre eventual preclusão ou não e entendeu por 4 a 1 pela possibilidade de continuação”, disse.
Barroso divergiu e fez duras críticas à postura da Segunda Turma de ter julgado o tema depois de Fachin ter declarado a perda de objeto do habeas corpus. Na visão do magistrado, o colegiado fracionado da corte “passou por cima” do relator.
Apesar de ter votado para impor uma derrota à Lava Jato e para anular as condenações de Lula quando confirmou a decisão de Fachin, Barroso fez um discurso em defesa da operação e citou números.
O ministro disse que é equivocada a visão de que a ação da defesa de Lula sobre a suspeição poderia ter sido julgada depois da decisão individual de Fachin de anular as condenações do petista.
“Competência precede a suspeição: julgada a incompetência do juízo de primeiro grau, o julgamento da suspeição fica evidentemente prejudicado. A matéria sobre competência do juízo está relacionada aos pressupostos processuais, está relacionada com a formação da relação jurídica processual, e sem juiz competente não há relação jurídica, aprendi isso há muitos anos”, afirmou.
Depois do voto de Barroso, o placar ficou em 3 a 2 contra Fachin, e o presidente da corte, Luiz Fux, tentou encerrar a sessão para retomá-la na próxima semana.
Lewandowski, Toffoli e Cármen, no entanto, pediram para antecipar seus votos e ajudaram a formar maioria contra a revogação da declaração de parcialidade de Moro.
O pedido de vista de Marco Aurélio, no entanto, forçou a suspensão do julgamento, que terminou em meio a uma discussão entre ministros.
Barroso acusou Gilmar de “sentar” em cima do processo por dois anos, em referência ao fato de o magistrado ter pedido vista e devolvido o caso para julgamento logo após a decisão individual de Fachin.
“Não precisa vir com grosseria. Existe no código do bom senso. Se um colega acha uma coisa e outro acha outra, é um terceiro que tem de decidir. Vossa Excelência sentou na vista durante dois anos e depois se acha no direito de ditar regra para os outros”, disse Barroso.
Segundo ele, Gilmar esperou o ministro Celso de Mello se aposentar e “manipulou” a jurisdição do caso.
Gilmar, por sua vez, disse que Barroso age com “moralismo” e que a previsão regimental de retirar um caso da turma e remeter ao plenário, como ocorreu no caso de Lula, só pode existir se for no “código dos russos”. “Vossa Excelência perdeu, perdeu”, afirmou Gilmar. MATHEUS TEIXEIRA/FOLHAPRESS