A aprovação pelo Senado do nome do desembargador Kassio Nunes Marques para uma vaga no Supremo Tribunal Federal, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o lugar deixado por Celso de Mello, após aposentadoria, reacendeu no Congresso o debate sobre os critérios de escolha dos ministros do STF.
Pelas regras de hoje, a indicação cabe apenas ao presidente da República e há duas exigências para a escolha: que o indicado tenha notório saber jurídico e reputação ilibada. O escolhido é empossado após sabatina no Senado Federal, que pode rejeitar a escolha — o que nunca aconteceu desde que essa exigência foi criada.
Na Câmara, tramitam propostas de emenda à Constituição que mudam esses critérios (PEC 259/16 e apensados). Uma delas (PEC 225/19) prevê que os poderes Legislativo e Judiciário também indiquem ministros, em sistema de rodízio; e que o indicado seja juiz de segunda instância ou advogado com pelo menos 10 anos de prática, com mestrado na área jurídica. Além disso, o mandato, que hoje vai até a aposentadoria compulsória aos 75 anos de vida, passaria a durar 12 anos.
O líder do Novo na Câmara, deputado Paulo Ganime (Novo-RJ), é o autor dessa proposta. Ele afirma que o objetivo é dar mais equilíbrio à relação de harmonia e independência entre os Poderes da República.
“Eu confesso que é um tema complexo, a gente estudou outros países, Estados Unidos, Europa, Japão, para entender como eles fazem, e nenhum tem uma solução perfeita, e nem eu acredito que a solução disposta na PEC seja perfeita. Mas é um tema que precisa ser debatido, que a gente precisa ter coragem de trazer para o debate”, diz ele.
Para Ganime, o modelo atual não é correto. “A gente teve, ao longo de 13 anos, o mesmo grupo no poder — não estou falando aqui de questão ideológica, poderia ser qualquer grupo político —, o que fez com que grande parte dos atuais ministros fosse indicado pelo mesmo grupo. A vitaliciedade que existe hoje é ruim”, acredita. E continua: “A gente vai ter que aturar decisões tomadas por esse ministro (Kassio Nunes Marques) que podem impactar a vida do brasileiro, inclusive temas polêmicos, como prisão em segunda instância, por 28 anos. Isso é um absurdo!”
Política no STF
A deputada Bia Kicis (PSL-DF) concorda com a necessidade de um mandato fixo para os ministros do Supremo, não vitalício, e de mais garantia de conhecimento jurídico do indicado. Ela acha que esse é o aspecto mais interessante da proposta, mas afirma que a PEC não enfrenta o que considera o maior problema: o ativismo judicial. Segundo a deputada, os ministros estão “fazendo política” no Supremo Tribunal Federal.
“O ministro pode ser egresso do partido que for ou ter uma afinidade com o partido que for, com o governante que for, mas, se ele cumprir a função dele, que é aplicar a Constituição, isso não vai causar danos. O problema é que hoje os ministros votam de acordo com a vontade deles — ou, como eles gostam de dizer, pela consciência. O ministro não está lá para colocar a consciência dele, ele está lá para votar de acordo com o que diz a Lei e a Constituição. Esse é o maior problema”, reclama.
Bia Kicis também é contra outro dispositivo da proposta: a possibilidade de indicação também pelo Poder Legislativo.
“Tem parlamentar que tem problemas na Justiça. Imagine um ministro que não vai ter que se comprometer com determinadas figuras do Parlamento para ser indicado? Deixa o presidente da República, não vamos botar a Câmara e o Senado nisso não. Até porque o Senado precisa cumprir melhor com sua atribuição de sabatina e com sua atribuição de retirar por meio de impeachment. Imagine se ele vai indicar? Isso é temerário. Votarei contra essa medida.”
Outros países
O modelo de escolha usado no Brasil é similar ao dos Estados Unidos. Em outros países, como a França, Alemanha, Itália, Espanha, Reino Unido, Portugal e Canadá, a escolha dos ministros conta com a participação de outros poderes, como previsto na proposta de Ganime.
De acordo com a proposta, a nova forma de escolha dos ministros do Supremo passaria a ser adotada a partir do início do próximo mandato na presidência da República, em janeiro de 2023. Essa e as outras propostas sobre o tema que tramitam em conjunto aguardam votação pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. No momento, o trabalho das comissões está suspenso por causa da pandemia do novo coronavírus.
Fonte: Agência Câmara de Notícias