No dia 4 de fevereiro de 2019 entrou em vigor a Lei nº 13.777/2018, que trata da multipropriedade imobiliária e seu registro, promovendo alterações no Código Civil Brasileiro e na Lei de Registros Públicos.
Pela nova Lei, a multipropriedade é o “regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada”.
Tal prática não era vedada antes da regulamentação pela nova lei, contudo, sua execução encontrava múltiplos desafios, exatamente pela ausência de previsão legal. A regulamentação, espelhada em arraigada legislação estrangeira, se justificou pela difusão do instituto, notadamente no mercado de turismo, com o crescente compartilhamento de imóveis para lazer.
A mais significativa discussão levada a debate nos tribunais antes da regulamentação era se a multipropriedade deveria ser tratada como instituto de direito real ou obrigacional, o que impactava na possibilidade de penhora do imóvel para pagamento de dívidas. Este tema foi discutido extensivamente em julgamento no Superior Tribunal de Justiça, que já se manifestava a favor de penhora. A nova Lei veio, então, consolidar o entendimento da multipropriedade como modalidade de direito real de propriedade, o que permitirá a penhora da fração temporal do imóvel em hasta pública.
A nova legislação estabelece as condições necessárias para a constituição de um condomínio em multipropriedade, que poderá ser limitada ou até mesmo vedada em convenções de condomínios, memoriais de loteamento ou instrumentos de venda de lotes em loteamentos urbanos.
Tratada como espécie de condomínio, a constituição da multipropriedade deverá ser formalizada em convenção e regimento interno, sendo definidas as circunstâncias de uso e gozo do imóvel, observadas as condições instituídas na Lei 13.777/2018, como poderes e deveres dos multiproprietários e multas aplicáveis nos casos de descumprimento das definições, dentre outras.
Optando pela constituição de um condomínio em multipropriedade, os proprietários do imóvel deverão observar as definições estipuladas na Lei. Evidenciamos as seguintes:
“Os períodos de uso do imóvel por cada proprietário poderão ser fixos em todos os anos ou alternados e a fração mínima de tempo comercializada deverá ser de 7 (sete) dias, seguidos ou intercalados”.
“As despesas do imóvel e do condomínio deverão ser rateadas entre multiproprietários na proporção de suas frações de tempo, sendo estes responsáveis solidários por tais obrigações.”
“Os multiproprietários deverão responsabilizar-se e arcar com as despesas decorrentes de danos causados ao imóvel durante seu tempo de estadia, não havendo solidariedade entre multiproprietários neste caso”.
Os condomínios edilícios em multipropriedade poderão ser instituídos desde sua criação ou posteriormente, mediante aprovação da totalidade dos condôminos. A administração nessa modalidade deverá ser exercida por profissionais qualificados, os quais serão responsáveis por gerenciar a posse dos imóveis em multipropriedade, bem como conservá-los e providenciar sua manutenção adequada, inclusive prestando contas aos condôminos.
Ainda cabe destacar que a Lei 13.777/2018 resguardou o direito de cessão do direito de uso do multiproprietário por meio de locação ou comodato do imóvel. É possível ainda a alienação ou oneração, podendo também aliená-lo ou onerá-lo a exclusivo critério do titular, sem necessidade de autorização dos demais proprietários ou concessão a estes do direito de preferência para aquisição da fração ofertada, salvo se houver determinação em contrário na Convenção de Condomínio.
Frisa-se ainda que é permitida, pela norma a aquisição, de mais de uma fração ou de todas as frações de tempo de uso do imóvel por um só adquirente, o que não descaracterizará o condomínio em multipropriedade. Tal situação apenas implica no direito de utilização do imóvel pelo adquirente em períodos de tempo maiores, proporcionalmente às frações de tempo obtidas.
A Lei 13.777/2018, em geral, manteve a liberdade de contratação, visto que determina condições obrigatórias para constar nos instrumentos de regulam o condomínio em multipropriedade; porém, a maioria delas poderá ser arbitrada em contrário, desde que de comum acordo entre multiproprietários.
Contudo, como na aplicação de qualquer nova lei, com sua aplicação, surgirão novas questões para debate. É fundamental que os incorporadores ou futuros adquirentes de imóveis em regime de multipropriedade atentem a todos os pontos da lei, em especial, à criteriosa redação e análise.
Recomendamos para aqueles que sejam proprietários ou tenham intenção de adquirir imóveis em multipropriedade que atentem e adequem a Convenção de Condomínio e do Regimento Interno de seus imóveis nos termos da Lei nº 13.777/18 o quanto antes, a fim de resguardar seus direitos de condômino e garantir maior efetividade jurídica à da operação.
por Júlia Vieira | Advogada Consultiva Contratual do Escritório Veríssimo, Moreira & Simas Advogados, pós-graduanda em Direito de Empresa pela PUC Minas e em Direito Contratual pelo CEDIN. | julia.vieira@vmsadvogados.com.br