AIMORÉS – Um caso envolvendo condições análogas à escravidão em uma fazenda de café na região de Aimorés, divisa entre Minas Gerais e Espírito Santo, resultou na condenação de dois fazendeiros. Após fiscalização realizada por uma força-tarefa em janeiro de 2023, sete trabalhadores foram resgatados em situação degradante. A decisão, proferida pela 3ª Vara do Trabalho de Governador Valadares, determinou o pagamento de indenizações por danos morais individuais e coletivos, além de medidas para garantir condições dignas de trabalho.
Relatos de violência e exploração
Conforme as informações divulgadas pela Justiça, os trabalhadores enfrentavam jornadas exaustivas, viviam em alojamentos sem saneamento básico e manuseavam agrotóxicos sem proteção. De forma perturbadora, eles relataram castigos físicos, como chicotadas, e controle por meio de dívidas e ameaças.
Drogas e bebidas alcoólicas eram fornecidas como forma de pagamento ou vendidas a preços elevados, criando um ciclo de dependência econômica e psicológica. Um dos relatos descreveu rituais conduzidos pelo capataz da fazenda, incluindo a marcação dos trabalhadores com símbolos em suas costas e a utilização de um espaço com objetos macabros, como um crânio encontrado no local.
Decisão judicial e valores das indenizações
Os réus foram condenados a pagar R$ 2 milhões por danos morais coletivos, além de R$ 50 mil para cada um dos trabalhadores resgatados. Também foram determinadas obrigações de melhoria das condições de trabalho e regularização de contratos.
Na sentença, o juiz Walace Heleno Miranda de Alvarenga destacou que as práticas constatadas violam severamente os direitos fundamentais dos trabalhadores e configuram escravização moderna.
Defesa dos fazendeiros
Os réus alegaram que não tinham conhecimento das condições em que os trabalhadores viviam e que o capataz da fazenda era o único responsável pela administração da propriedade. A defesa sustentou que os fazendeiros não participaram de nenhuma prática ilegal e que as irregularidades identificadas durante a fiscalização seriam de responsabilidade exclusiva do administrador local.
No entanto, o juiz Walace Heleno Miranda de Alvarenga concluiu que os fazendeiros frequentavam a fazenda, tinham ciência das condições precárias e se beneficiavam do trabalho realizado. O magistrado aplicou a “teoria da cegueira deliberada” para justificar a condenação, afirmando que os réus optaram por ignorar as práticas ilegais.
Contexto jurídico e fiscalização
A fiscalização foi conduzida por auditores-fiscais, promotores e policiais, que constataram um cenário de exploração e restrição de liberdade. A força-tarefa assegurou o pagamento das verbas rescisórias aos trabalhadores e garantiu acesso ao seguro-desemprego.
A Justiça do Trabalho baseou-se em normas nacionais e internacionais para fundamentar a condenação. O Brasil, como signatário de tratados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), reafirma o compromisso de combater práticas análogas à escravidão.
Práticas ilegais e servidão por dívida
Os trabalhadores não recebiam salários adequados e eram submetidos a descontos abusivos, enquanto produtos básicos, como sabonetes e papel higiênico, eram vendidos a preços exorbitantes. Essa prática, associada ao fornecimento de drogas, mantinha os trabalhadores presos à propriedade, sem condições de sair.
O magistrado também aplicou a “teoria da cegueira deliberada” aos fazendeiros, que alegaram desconhecer as irregularidades. Segundo o juiz, os réus frequentavam a fazenda e se beneficiavam das práticas ilegais, sendo igualmente responsáveis.