GOVERNADOR VALADARES – O compartilhamento de desinformações sobre a situação de elegibilidade de José Bonifácio Mourão (PL), candidato a vice-prefeito em Governador Valadares, levou o ex-prefeito do município a convocar uma coletiva de imprensa para esclarecer a atual condição da sua candidatura diante da Justiça Eleitoral. O pronunciamento aconteceu na última sexta-feira (6) e contou com a presença do candidato a prefeito de Valadares, deputado estadual, Coronel Sandro (PL), e do advogado Allan Toledo, representando o setor jurídico da campanha Sandro/Mourão.
A questão da elegibilidade de Mourão envolve um processo que por muitos anos se desenrolava no Tribunal de Contas da União (TCU). A Corte avalia e julga as contas dos administradores públicos e de outros responsáveis por recursos federais. No caso de Mourão, estava em análise pelo TCU a aplicação de recursos do (antigo) Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome como irregulares durante o período de 2005 a 2008. Na época, Mourão ocupava o cargo de prefeito de Governador Valadares. O recurso federal tinha como destino iniciativas ligadas à Secretaria Municipal de Assistência Social.
Até novembro de 2021, o TCU tinha o entendimento pela condenação de Mourão em relação a irregularidades na aplicação de recursos do Governo Municipal. A partir disso, o nome do político passou a constar na Lista de Responsáveis com Contas Julgadas Irregulares (atualizada diariamente pelo TCU) e na Lista de Responsáveis com Contas Julgadas Irregulares com Implicação Eleitoral de 2022.
Sendo assim, caso Mourão permanecesse nesta lista do Tribunal de Contas, ele poderia ser enquadrado no crivo da Lei da Ficha Limpa por causa do julgamento das contas públicas durante o período em que foi chefe do Executivo em Valadares (de 2005-2008). Porém, em 2023 o caso foi reaberto para apreciação de recurso de revisão e em 2024 a Corte decidiu por arquivar o processo. Dessa forma, tanto a condenação quanto o nome na Lista Responsáveis com Contas Julgadas Irregulares foram desfeitos. Para entender melhor esta situação vamos por partes.
Parte I – Os julgamentos no TCU
Em março de 2020, o relator do processo, Bruno Dantas, negou o pedido da defesa de Mourão e manteve a sentença do relator Walton Alencar Rodrigues, que analisou o caso em 2018.
Na decisão, Bruno Dantas ressaltou no seu voto que acompanha “as conclusões da unidade técnica especializada no sentido de que a documentação trazida pelo recorrente não é suficiente para comprovar a regular aplicação dos recursos. A movimentação irregular dos valores recebidos, das contas específicas para a conta de livre movimentação da prefeitura, impossibilitou, no caso, a identificação da origem dos recursos que custearam os pagamentos dos servidores ligados às equipes de referência, responsáveis pela organização e oferta dos serviços de assistência social, não permitindo, por consequência, o estabelecimento do nexo de causalidade entre os repasses federais e as despesas incorridas”.
Em outras palavras, o TCU entendeu que a Prefeitura de Valadares – no período de 2005 a 2007 – não conseguiu comprovar que os recursos federais destinados à assistência social foram realmente utilizados para essa finalidade, pois a movimentação irregular de fundos dificultou a rastreabilidade do dinheiro. Sendo assim, o TCU fixou uma pena de pagamento do valor dos recursos públicos que não foram identificados na aplicação.
Em 2020, após a decisão pela condenação, a defesa de Mourão recorreu duas vezes contra a sentença, entretanto a Corte analisou e rejeitou os dois recursos.
Parte II – A reabertura do processo no TCU
O processo de nº 009.650/2016-4, que era de relatoria do ministro Walton Alencar Rodrigues, foi reaberto em 10 de julho de 2023 para apreciação de recurso de revisão. Porém, foi somente em julho deste ano que a Corte analisou um novo recurso apresentado pela defesa de Mourão. O processo do Acórdão 1438/2024 teve como relator o ministro Marcos Bemquerer Costa, que atuava como substituto do ministro titular Antônio Anastasia.
Pelo que consta na ata do processo, a defesa de Mourão argumentou que surgiram novos documentos (como contracheques, extratos bancários e relatórios financeiros do município) que comprovariam a aplicação correta dos recursos. Além disso, também alegou que o ex-prefeito não agiu com intenção de cometer irregularidades (dolo) e que o prazo para punição já teria expirado (prescrição). A sessão plenária que julgou os novos recursos aconteceu no dia 11 de julho de 2024.
Parte III – A prescrição do processo
O Tribunal de Contas da União (TCU) analisou a prescrição no caso de José Bonifácio Mourão, ex-prefeito de Governador Valadares, seguindo as regras da Resolução-TCU 344/2022. Essa resolução define os prazos para o TCU cobrar punições ou pedir devoluções de dinheiro em processos de prestação de contas.
Para situações em que há omissão na prestação de contas, a resolução estabelece um prazo de cinco anos para cobrar punições, contado a partir da data em que as contas deveriam ter sido entregues. No caso de Mourão, as contas dos programas executados entre 2005 e 2007 deveriam ter sido entregues até 2006, 2007 e 2008, respectivamente. Mourão foi notificado sobre problemas nas contas pela primeira vez em 2008, com novas notificações em 2013 e 2014. A citação formal do TCU, que é um passo oficial no processo, só aconteceu em 2018. Com isso, o TCU reconheceu que o prazo de cinco anos para punir Mourão já havia passado.
Quanto à devolução de valores, o TCU concluiu que ainda não havia prescrito, pois o tempo máximo de cinco anos sem andamento não foi completado devido às notificações e respostas feitas ao longo do período.
Parte IV – O arquivamento do processo
Além disso, o TCU reconheceu que houve um tempo prolongado em que o processo ficou parado sem andamento significativo. De acordo com a nova regra, se um processo ficar paralisado por mais de três anos sem julgamento ou despacho relevante, ocorre o que se chama de “prescrição intercorrente”, ou seja, o processo não pode mais seguir adiante.
A prescrição intercorrente ocorre quando um processo fica parado por mais de três anos, sem qualquer ação significativa de julgamento ou despacho relevante. No caso de Mourão, entre 2010 e 2013, houve um intervalo maior do que três anos em que o processo ficou parado sem um despacho relevante. Isso aconteceu entre a resposta da Prefeitura de Governador Valadares, em 2010, e a emissão de uma Nota Técnica pelo Ministério do Desenvolvimento Social em 2013.
Ao DRD, o TCU informou que o “Plenário reconheceu a prescrição intercorrente da decisão que julgou as contas irregulares, dessa forma, o processo será arquivado. A decisão que julgou as contas irregulares se tornou insubsistente, ou seja, não será aplicada”.
Com base nessas regras, o TCU decidiu que ocorreu a prescrição no caso de Mourão, o que significa que o Tribunal não pode mais exigir o cumprimento da decisão anterior. Portanto, o TCU anulou a decisão de 2018 que havia condenado Mourão a devolver os recursos e ordenou o arquivamento do processo.
Parte V – Prefeitura recorre da decisão
Ainda neste ano, no mês de agosto, a Corte voltou a analisar o processo a partir de embargos declaratórios oferecidos pela atual gestão da Prefeitura de Valadares. A representação do Governo Municipal “alegou que há omissão/contradição quanto à manifestação processual, que teria interrompido a contagem da prescrição. Argumentou, ainda, que há omissão quanto ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) e da doutrina predominante, que reconhecem a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário em razão da natureza de dano ao patrimônio público. No mérito, requer a revisão da decisão proferida, garantindo a continuidade da apuração e do ressarcimento integral dos valores efetivamente ingressados aos cofres municipais, em consonância com a jurisprudência e os princípios constitucionais e administrativos que regem a Administração Pública”, consta no acórdão 1801/2024.
O recurso apresentado em questão foi analisado pelo TCU durante sessão do dia 29 de agosto. A decisão da Corte não reconheceu procedente as alegações do Governo Municipal e manteve a decisão de 18 de julho de 2024, que arquivou o processo. No mês de setembro, no dia 3, a Prefeitura de Valadares apresentou mais um recurso para apreciação da Corte.
Parte VI – A coletiva de imprensa
Durante a coletiva de imprensa, na última sexta-feira (6), o representante jurídico da campanha Sandro/ Mourão comentou sobre o processo que tramitava no TCU. “Existia a decisão de uma prestação de contas, de uma Tomada de Contas Especial no Tribunal de Contas da União. No primeiro momento, a decisão era desfavorável ao doutor Mourão. Por que? Ele foi eleito, aplicou os recursos, o mandato terminou. Como o recurso vem para o município e não vem para o candidato, quem tem que prestar contas é quem sucedeu o candidato à gestão do município. O município prestou contas. [Mas] prestou contas a princípio, tecnicamente, não observou o que tinha que observar para comprovar a regular aplicação do recurso. Essa prestação de contas foi analisada pelo Tribunal e até então entendeu que ela estava irregular. Logicamente, havendo o recurso legal que a legislação permite. Foram apresentados, apresentado o recurso, o Tribunal de Contas da União, em 17 de agosto, entendeu, por anular o acórdão, que havia julgado irregular as contas”, explicou Allan Toledo.
Candidato está elegível
O advogado também esclareceu sobre a atual situação da candidatura de Mourão. No dia 2 de setembro a Justiça Eleitoral deu o parecer favorável para o registro eleitoral do candidato a vice-prefeito. Dessa forma, Mourão está elegível para as eleições municipais.
“O Tribunal de Contas quando ele faz o julgamento de uma prestação de contas, independentemente de haver recurso ou não, ele tem uma lista da situação. O nome do Dr. Morão constava lá, na lista do Tribunal, mas o fato de constar na lista não quer dizer que ele estava inelegível, porque ele tem que preencher requisitos. Então por isso nós não tínhamos dúvida alguma, porque inelegível ele não estava e não preenchia os requisitos, inclusive do próprio Tribunal de Contas. Mas todo erro tem que ser consertado, juridicamente, havendo o prazo, havendo o recurso legal dentro da lei, tem que se manejar, foi isso que o Dr. Mourão fez”, explicou Allan Toledo.
Sobre o processo no TCU e também a questão da elegibilidade, Mourão direcionou críticas a adversários políticos, relacionando envolvimento deles em uma tentativa de tumultuar o processo eleitoral.
“A questão iniciou no governo do PT, que me sucedeu em 2008. Perdemos as eleições para o governo do PT e a Elisa Costa ganhou as eleições. E ela fez uma prestação de conta, ao meu ver errada, não sei se de propósito, e essa prestação de conta foi parada no Tribunal de Contas da União, relativa ao pagamento de servidores públicos. Nós fizemos o pagamento, e ela não fez a prestação de conta adequada. […] Agora, próximo das eleições, [adversários políticos] passaram a divulgar que eu estava inelegível, e eu já venho aguentando isso calado há muito tempo. Já venho fazendo minha defesa e ganhando todos os recursos. A prefeitura tornou a recorrer sempre dando a entrevista à imprensa de que eu estava inelegível, e eu calado, fazendo meus recursos através do jurídico. Agora a própria Justiça Eleitoral já deferiu o registro da minha candidatura. Então eu queria esclarecer ao povo de Governador Valadares porque tem inúmeras pessoas que ao longo desse tempo se preocupam. Saber se eu estou inelegível mesmo, se eu não estou. Só acrescentar para vocês que tanto o Coronel Sandro, quanto eu, nós estamos levando nossa campanha em alto nível. A disputa precisa ser em alto nível, não pode baixar o nível da campanha. Cada candidato se preocupar com o seu projeto de construção de Governador Valadares ou reconstrução de Governador Valadares, e não ficar com inverdades e mentiras. A questão em resumo é esta. Está muito claro que eu sou elegível e que esse procedimento da Prefeitura, desde a época de Elisa até agora, enganou o Ministério Público e enganou a Justiça”, disse o candidato a vice-prefeito.
“Só para dizer o seguinte, começou por uma ação equivocada do PT na prefeitura que sucedeu, doutor Mourão, que culminou nesse problema que já está resolvido. Coisa de adversário político. Pensávamos que fosse só o PT, mas aí quando a gente menos esperava, a prefeitura, atualmente, entrou junto nesse processo para tentar perpetuar a mentira sobre doutor Mourão. Então, na verdade, nós estamos sofrendo, é uma grande perseguição aqui, porque nós vamos defender Valadares. E aí, o que começa errado, graças a Deus, não prosperou. A atual gestão da Prefeitura queria que essa informação, que essa mentira perpetuasse, não perpetuou. A verdade prevaleceu, então o Coronel Sandro e Mourão são candidatos”, completou Coronel Sandro.
Ainda sobre o assunto, o candidato a prefeito pelo PL avaliou a importância do Mourão na chapa. “Ele [Mourão] vai ser o grande aliado, nós vamos fazer uma parceria que já existe lá na prefeitura, pegar a experiência dele, essa eficiência dele como prefeito e nós vamos somar as nossas forças para isso. Então vai ser o grande aliado. Eu falo que a gente sempre vai ter três prefeitos, o Coronel Santos, o Morão e o povo. E a oposição quer tirar o doutor Mourão do jogo eleitoral exatamente porque ele é muito forte. Ele é o melhor vice, aliás seria o melhor prefeito, enfim, ele é o melhor que nós temos e está do nosso lado. Então tirar o Dr. Mourão seria uma forma de enfraquecer a nossa chapa, essa é a principal razão. Porque você perceba um processo que há 16 anos ou mais a prefeitura nem tomou conhecimento, mas por que foi tomar conhecimento agora no período eleitoral? Porque o Mourão é o vice, então é suspeito demais, eu atribuo [que] isso é retirar o fator, pode ser decisivo na nossa eleição, que é o Mourão, mas não conseguiram não”, finalizou.
Parte VII – Respostas
O DRD procurou a Prefeitura de Valadares para se manifestar sobre as alegações da campanha Sandro/ Mourão em relação à tentativa de tumultuar o processo eleitoral. Por meio de nota, o Governo Municipal se posicionou dizendo que “a atuação dentro do citado processo se deu dentro dos preceitos legais, sem nenhuma outra motivação. Qualquer afirmação contrária ao exposto tem, claramente, cunho eleitoreiro”.
Em relação às acusações sobre um possível erro na forma como as prestações de contas feitas no período em que Elisa Costa estava à frente da gestão Municipal, a ex-prefeita do PT disse que “a prestação de contas inclusive de algumas secretarias é responsabilidade da própria secretaria como é o caso da Assistência Social. Quando o Mourão transfere para o governo Elisa a responsabilidade da prestação de contas ele não está dizendo a verdade porque na verdade quem deveria prestar contas da aplicação desses recursos é a Secretaria Municipal de Assistência Social do governo do Mourão.
O diretório municipal do Partido dos Trabalhadores (PT) também se manifestou sobre o assunto. ”O governo Elisa nada tem a ver com as condenações do Mourão, muito menos com a prestação de contas do governo Mourão. A responsabilidade do governo Elisa foi prestar conta de todas as ações do governo Elisa que teve suas contas aprovadas com louvor tanto no primeiro mandato como no segundo mandato, diferente do Mourão que teve suas contas recusadas e responde processo. Respondeu o processo, perdeu o processo em todas as instâncias, foi condenado e agora esse processo foi prescrito”, destacou o PT.