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Seu Jorge e Daniel Jobim estreiam turnê que homenageia obra de Tom

por JOÃO PERASSOLO (FOLHAPRESS)

As cortinas se abrem e revelam a silhueta de quatro músicos iluminados no contra-luz por holofotes gigantes dispostos estrategicamente no palco. Todos vestem terno e gravata, e um deles porta um chapéu-panamá –uma referência ao homenageado da noite, Tom Jobim.

“Fundamental é mesmo o amor / É impossível ser feliz sozinho”, abre a apresentação a voz grave e rouca de Seu Jorge, dando timbre novo à uma das músicas brasileiras mais executadas da história, “Wave”. Ele é acompanhado pelo piano de cauda tocado por Daniel Jobim, neto de Tom e o outro anfitrião da noite.

A dupla estreou no sábado (7), no teatro do Bourbon Country, em Porto Alegre, um show no qual interpretam 20 músicas do cantor e compositor carioca que, se estivesse vivo, teria completado 93 anos em janeiro. A locação, com cortinas, poltronas e carpete vermelhos, deu um clima de cabaré à apresentação. Só faltou o tradicional charuto de Tom.

A ideia para o show veio de um encontro casual de Seu Jorge com Daniel Jobim em uma calçada do Rio de Janeiro: um chegava de táxi e o outro esperava um Uber na saída do aniversário de Dedé Veloso, primeira mulher de Caetano Veloso.

Seu Jorge voltou para São Paulo e ficou com o pensamento de fazer uma parceria com Daniel. Dias mais tarde, Paula Lavigne intermediou a conexão. Seguiram-se dois meses de ensaios na capital paulista até a estreia.

À exceção de “Ligia” e “Garota de Ipanema”, interpretadas em equilíbrio pelos dois juntos, nesta apresentação inaugural Seu Jorge ofuscou quase totalmente Daniel Jobim.

O músico de Belford Roxo cantou com naturalidade e sem esforço, seguro de si. Passou metade do show sentado, de pernas cruzadas, e ainda assim roubou a cena. Em outras palavras: Seu Jorge, 49, traz para o palco a voz e a presença adquiridas em décadas como ator e cantor.

Seu timbre é o da Luta de Marighella e de Mané Galinha, do filme “Cidade de Deus”,  junto à versatilidade vocal que empregou em “Cru”, um dos discos que definiu o samba contemporâneo brasileiro.

Já Daniel Jobim, 46, é uma espécie de personagem clone do avô: ele canta de maneira intimista, como Tom, toca piano lindamente e tira e põe o chapéu-panamá em diversos momentos do show. Quem olha da plateia, na contraluz, às vezes esquece que quem está ali não é o compositor que eternizou em música a zona sul carioca, e sim um herdeiro.

Mas confundir e fazer a plateia sonhar parecem ser os objetivos do espetáculo, que chegará a São Paulo em junho antes de passar por Portugal. “As pessoas ainda tem uma relação muito forte com a música do Tom. A gente quer que elas esqueçam o coronavírus e os problemas de polarização”, disse Seu Jorge em entrevista para a imprensa no sábado, mais cedo, respondendo à uma pergunta de como as letras otimistas de Tom se encaixam no Brasil de hoje.

“As pessoas precisam de amor, e o amor é um escapismo mesmo para esquecer todos os problemas”, completou Daniel Jobim. No palco, isso se traduz em uma série de clássicos da bossa nova –“Chega de Saudade”, “Águas de Março”, “Eu Sei Que Vou Te Amar”– executados com pegada mais jazz do que samba, pois a dupla tem como base um contrabaixista e uma baterista que parecem transportados de um disco do Frank Sinatra.

Vale mencionar ainda a iluminação precisa de Eric Bertti, um show à parte que em determinado momento se valeu de um globo de espelhos no piso do palco cujo efeito foi gerar pontos brancos como se fossem estrelas no teto do teatro; e as projeções abstratas no fundo do palco, que deixaram tudo mais elegante ao dispensar imagens clichê do Rio de Janeiro.

“Para mim, cantar Tom Jobim é a busca pela beleza”, afirmou Seu Jorge, acrescentando que um dos objetivos do espetáculo é mostrar a obra do compositor para a juventude que não teve chance de vê-lo ao vivo.

Tomara mesmo que os jovens –e não apenas seus pais e avós, como no show da capital gaúcha– se disponham a descobrir Tom por uma das mais belas vozes brasileiras em atividade. 

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