Por que uma invasão não seria tão simples para Trump na Venezuela?

FOTO: The White House

FABÍOLA PEREZ

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – A pressão dos Estados Unidos para invadir a Venezuela tem aumentado nos últimos dias sob o argumento de combater o narcotráfico e o tráfico internacional de drogas. Mas especialistas ouvidos pelo UOL dizem que a ação esbarra no custo e na desaprovação da comunidade internacional.

O presidente dos EUA, Donald Trump, disse não descartar o envio de tropas para invadir a Venezuela. A movimentação começou depois de os EUA dobrarem o valor da recompensa de US$ 25 milhões para US$ 50 milhões, o equivalente a cerca de R$ 272 milhões por informações que levem à prisão ou condenação do presidente venezuelano, Nicolás Maduro.

Os EUA acusam Maduro de chefiar um cartel de drogas classificado como organização terrorista internacional. Mas, especialistas em relações internacionais ouvidos pelo UOL dizem que a Venezuela está longe de ser o principal país ligado ao narcotráfico na região. “Narcotráfico atua de maneira transnacional, ou seja, não está somente em um país. Para combatê-lo, seria necessário pensar em alianças entre países e organizações”, diz Regiane Bressan, professora de relações internacionais da Unifesp e especialista em América Latina.

Trump usa o discurso do narcotráfico como cortina de fumaça, diz a professora da Unifesp. Segundo ela, o presidente dos EUA utiliza esse discurso porque não precisa de aprovação do Congresso para combater um tema, mas precisaria de apoio da Casa para invadir a Venezuela e depor o governo de Nicolás Maduro -e, para ela, talvez não conseguisse vitória. “Há interesse dos EUA em obter um apoio doméstico porque combater o narcotráfico é um interesse de todos.”

Venezuela não é considerada um “narcoestado”, diz Roberto Goulart Menezes, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. “Maduro governa o país junto com militares. Um narcoestado se desenha quando o Estado coloca suas próprias forças para a produção das drogas, e o crime organizado adentra nos processos decisórios do Estado”, afirma ele, que é pesquisador do Instituto Nacional de Estudos sobre os EUA (Ineu) da UnB.

Governo Trump é imprevisível, dizem especialistas. Segundo Bressan, os EUA devem estar fazendo cálculos para entender se a invasão vale a pena e quando deve ocorrer. O professor e pesquisador da UnB afirma que o governo Trump não costuma “avisar” sobre eventuais decisões. “Não vão perder a viagem se começarem a bombardear a Venezuela e isso pode desestabilizar a segurança regional”, afirma.

ATAQUES EM CURSO AFASTAM SAÍDA DIPLOMÁTICA

Os EUA têm mobilizado uma série de ataques contra embarcações consideradas suspeitas de tráfico de drogas na costa venezuelana. Além disso, Trump chegou a dizer que gostaria de acabar com as fábricas de cocaína na Colômbia, mas não chegou a negociar uma intervenção militar direta.

Navios de guerra dos EUA, aeronaves e o maior porta-aviões do mundo estão posicionados no Caribe. Nos últimos meses, o aparato militar bombardeou mais de 20 embarcações consideradas suspeitas de transportar drogas, deixando mais de 80 mortos. A ONU chegou a criticar as ações e disse que os ataques são extrajudiciais e violam o direito internacional.

Ameaças levam instabilidade para a América Latina e o Brasil. “A Venezuela empobreceria, já que os EUA poderiam dominar o petróleo. Isso levaria a uma fragmentação e desmantelamento do país”, diz ela. “Um segundo ponto é que ameaçaria a soberania de outros países já que há ameaças norte-americanas contra Colômbia e o México.”

Ataques chancelam possível invasão, diz professora da Unifesp. A escalada das tensões entre os dois países faz com que a Venezuela se alie a Rússia e China, o que, para a especialista da Unifesp, pode agravar o conflito.

Trump disse que “provavelmente falaria” com Maduro. O presidente da Venezuela, por sua vez, disse que as diferenças devem ser resolvidas por meio da diplomacia e que está disposto a manter conversas cara a cara com qualquer pessoa interessada.

A especialista em relações internacionais da Unifesp diz não acredita em uma saída diplomática entre os dois países.

“Chance é bem pequena porque não há muita vontade de diálogo.”

ENTRAVES À INVASÃO

Gastos econômicos, falta de apoio do Congresso e da comunidade internacional são entraves para invasão. “A comunidade internacional está ciente dos interesses dos EUA e essa invasão tem relação com interesses pelo petróleo e por derrubar o regime de Maduro. Isso também instigaria a presença da China e da Rússia na região. A chance de escalar para um conflito maior é grande”, afirma Menezes. “O conflito também pode ser de grande dimensão e ter um custo além do que os EUA podem gastar.”

Trump tem repetido à comunidade internacional que não promoveu guerras nesse mandato. Escalar um conflito contra a Venezuela nesse momento, seria, segundo Menezes, ir contra esse discurso. “Ele se vangloria de não ter promovido nenhuma guerra, recentemente foi aprovado o plano para a Faixa de Gaza, se ele invadir a Venezuela vai representar uma desestabilização muito forte para a região”, avalia.

Ação despertaria forte reação de países vizinhos, diz o professor da UnB. “Trump não teria apoio regional para isso”, avalia Menezes. “Não há informações dentro da Venezuela para saber como a população está dividida”. Além disso, o especialista em EUA afirma que Maduro não deixaria o poder facilmente -o que causaria desgaste e instabilidade regional.

Localização da Venezuela não é favorável, mas EUA poderiam transpor essas barreiras, diz a especialista da Unifesp. As características geográficas do território venezuelano representam um desafio para operações militares. O tamanho do país, o relevo acidentado e as florestas densas exigem um planejamento das ações. Mas o professor da UnB ressalta que os EUA já atacaram o Irã com mísseis que perfuravam rochas. “Eles têm um arsenal inimaginável, o que eles querem é entrar nas cidades.”

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