O ensino superior e a pesquisa brasileiras terão em 2023 o menor orçamento previsto em oito anos. Juntas, as duas áreas, que são responsáveis pela produção de conhecimento no país, têm previsão de receber R$ 17,1 bilhões —58,5% a menos do que em 2014, quando era de R$ 38,9 bilhões.
O levantamento foi feito pela Frente Parlamentar Mista da Educação e o Observatório do Conhecimento e divulgado na manhã desta terça-feira (8). Os valores foram corrigidos pela previsão de inflação para 2022 e 2023, de acordo com pesquisa Focus divulgada pelo Banco Central no fim de outubro.
Os dados mostram queda do orçamento previsto para essas duas áreas desde o início do governo Jair Bolsonaro (PL), com nova redução prevista para 2023. A PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) para o próximo ano prevê R$ 17,1 bilhões para o ensino superior e ciência, um valor 9,7% menor do que o previsto inicialmente para 2022 (quando a PLOA destinava R$ 18,9 bilhões).
A frente parlamentar tenta reverter as perdas e negociar a recomposição do orçamento aos níveis de 2019, quando o governo atual assumiu. Naquele ano, ensino superior e pesquisa tiveram aprovados um recurso de R$ 25,3 bilhões.
“Não estamos pedindo uma recomposição aos patamares mais elevados, mas ao de 2019 que entendemos ser o mínimo para o funcionamento adequado da ciência e da educação superior”, disse o deputado federal professor Israel Batista (PSB-DF), presidente da frente.
O projeto do orçamento de 2023 foi enviado pelo governo Bolsonaro ao Congresso Nacional em 31 de agosto e tem previsão de votação em 16 de dezembro.
O cálculo da frente leva em conta os valores destinados para as universidades federais (tanto para gastos correntes como para investimentos), além do orçamento de órgãos ligados à ciência e tecnologia, como o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
O orçamento enviado pelo governo Bolsonaro prevê novo corte para os valores de despesas discricionárias para as universidades federais. O valor previsto é 6,7% menor, em termos reais, do que era no projeto enviado para este ano —caindo de R$ 7,9 bilhões para R$ 7,5 bilhões.
A situação dos investimentos para as universidades federais é ainda mais grave. O PLOA 2023 traz uma queda de 16,7% em relação ao de 2022. O recurso que esteve em 2014 no patamar de R$ 4 bilhões, para o ano que vem soma R$ 350 milhões, agravando os problemas de infraestrutura nas instituições de ensino.
“As atividades estão todas desestruturadas. As universidades não têm condições de fazer reformas simples em seus laboratórios. Isso não significa apenas que não estão investindo, mas que estão perdendo capital porque estão perdendo equipamentos, estrutura para a produção de ciência”, disse Batista.
No Brasil, 95% da produção científica é feita em universidades públicas. “Prejudicar o desenvolvimento da ciência não afeta só os estudantes, pesquisadores e professores, mas toda a sociedade. É a população quem vai deixar de usufruir da produção de tecnologia, de conhecimentos que podem mudar a saúde, educação, as cidades”, disse a economista Julia Bustamante, uma das responsáveis pelo estudo.
Para o próximo ano, também há previsão de corte de 13,1% para a concessão de bolsas de permanência no ensino superior. Ou seja, há o risco do aumento da evasão de estudantes mais pobres que não conseguirão continuar os estudos ou pesquisas em universidades públicas por falta de auxílio financeiro.
A função ciência e tecnologia também conta com o maior desfinanciamento desde 2014, tendo seu orçamento discricionário reduzido em 56%. Naquele ano, a área contava com R$ 11,3 bilhões. Para 2023, a previsão é de R$ 4,9 bilhões.
Mais uma forte queda é verificada nos órgãos de fomento à pesquisa. A execução da Capes em 2022 está no patamar de 21,7% do executado em 2015, enquanto a previsão para 2023 está no patamar de 29,1%, ou seja, uma queda de mais de 70%.
Para o CNPq, a previsão constante no PLOA 2023 é 56% menor do que a que foi prevista em 2015.
“Temos uma reivindicação muito razoável, que é recuperar o orçamento a um mínimo adequado para o país continuar produzindo conhecimento. Nosso conhecimento está sufocado”, disse o deputado. ISABELA PALHARES/FOLHAPRESS