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Minas quer tradição queijeira como patrimônio da humanidade

BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Reconhecido nacionalmente pela tradição queijeira, o estado de Minas Gerais busca transformar o modo de fazer o queijo minas artesanal em patrimônio cultural imaterial da humanidade.


O primeiro passo será dado com a apresentação da candidatura e dos queijos mineiros no encontro do Comitê Intergovernamental para Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial da Unesco, que acontece a partir deste domingo (27), no Marrocos.


No evento, será montada uma exposição sobre o queijo minas artesanal e um workshop sobre os modos de fazer esse tipo de queijo, com degustação dos produtos, de acordo com José Ricardo Ozólio, presidente da Amiqueijo (Associação Mineira de Produtores de Queijo Artesanal).


“Todo reconhecimento traz para a gente muita visibilidade. Só o fato de a gente estar pleiteando já nos deu muita visibilidade, e isso é importante, porque agrega valor e respeito ao produto e aumenta a busca por ele”, afirma.


O queijo minas artesanal é caracterizado por ser feito com leite cru, em pequenas propriedades, com produção de leite própria, em pequena escala e sem uso de maquinários industriais. Além disso, os modos de fazer são passados de geração em geração, mantendo tradições familiares na queijaria.


Os únicos ingredientes utilizados são o leite cru, coalho, sal e o pingo -fermento natural composto por bactérias lácticas, extraído na própria produção de queijos do dia anterior.


A busca pelo reconhecimento como patrimônio da humanidade é liderada pelo governo de Minas, com apoio de associações de produtores e do governo federal, por meio do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).


O intuito da empreitada é gerar impactos econômicos tanto pelo aumento das vendas, quanto pela atração turística para as regiões produtoras.


O processo de reconhecimento, porém, ainda é longo. Após o evento no Marrocos, a candidatura precisa ser formalizada até o dia 30 de março de 2023. O resultado final, com o reconhecimento ou não do pedido, demora cerca de dois anos para sair.


Neste período, é necessário desenvolver um dossiê, justificando a busca pelo reconhecimento do patrimônio e apresentando as ações desenvolvidas para salvaguarda desse bem. O documento é feito pelo Iepha (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico) e enviado para o Iphan, que protocola o pedido na Unesco.


Segundo a professora Renata Costa, do Instituto de Laticínios Cândido Tostes, os queijos de diferentes produtores possuem características distintas, que são influenciadas pelas especificidades do ambiente.


“Isso vem muito da qualidade do leite cru, das características da alimentação da vaca, do clima, do solo, da altitude. Tudo isso influencia nas bactérias lácticas que vão estar no leite e que vão dar características especiais no queijo. As bactérias lácticas que vêm do pingo também vão dar essas características diferenciadas”, afirma ela.


Para Costa, o título de patrimônio da humanidade reforçaria o reconhecimento que o queijo minas artesanal já tem por parte da população brasileira.


Atualmente, Minas tem dez regiões produtoras de queijo minas artesanal reconhecidas: Araxá, Campo das Vertentes, Cerrado, Serra da Canastra, Serra do Salitre, Serro, Triângulo Mineiro, Serra do Ibitipoca, Diamantina e Entre Serras da Piedade e do Caraça.


Segundo Costa, para que uma região seja reconhecida, é feito um estudo aprofundado sobre as condições do ambiente, as características do queijo, as formas de fabricação e os registros históricos das tradições repassadas entre gerações.


Minas Gerais possui cerca de 30 mil produtores de queijo, sendo que cerca de 9.000 produzem o minas artesanal, gerando um volume aproximado de 40 mil toneladas por ano.
Alyrio Campos é produtor na cidade do Serro, localizada a cerca de 230 km de Belo Horizonte. Ele mantém a tradição familiar que foi passada de seu bisavô para seu avô, seu pai e, hoje, para ele. O filho de Campos também já ajuda na produção.


“Os portugueses vieram para a região com a descoberta do ouro e tradição queijeira veio de Portugal para suprir a necessidade deles. O ouro acabou e ficou-se o queijo no lugar. Hoje ele é o nosso ouro. Aqui no Serro, basicamente a economia gira em torno do queijo”, diz Alyrio.


Os queijos passam dois dias na forma e depois vão para a sala de maturação, onde ficam por pelo menos 30 dias. O tempo de maturação varia de acordo com o gosto dos consumidores. Para Alyrio, o tempo ideal é de 30 a 60 dias.


Na propriedade, são feitos queijos de casca lisa e de casca florida, nos quais há ação dos fungos durante a maturação. O queijo liso é lixado e depois lavado a cada dois ou três dias. Já o queijo florido não passa por processo de lavagem –ele é higienizado, mas os fungos são mantidos para agir no produto.


A produtora Christiane Brandão é de Santo Antônio do Itambé, na região do Serro. Ela é da quinta geração da família a produzir queijos, e a primeira mulher à frente do negócio. Para ela, o reconhecimento enquanto patrimônio da humanidade é um meio de valorizar uma tradição que vem sendo mantida na região há muito tempo.


“A gente faz queijo desde que existe a nossa região, desde que os colonizadores vieram para cá, há 300 anos. Isso está enraizado na nossa vida, na nossa tradição. É um orgulho ter essa identidade reconhecida através do queijo, o modo de fazer queijo nos identifica e a gente quer que as pessoas valorizem e queiram vir aqui conhecer”, diz ela.


Na Serra da Canastra, João Carlos Leite aprendeu o ofício com os pais e é da quinta geração de produtores. Ele trabalha na área há mais de 20 anos. João produz cerca de 80 quilos de queijo por dia em sua propriedade. Para ele, o título de patrimônio traria ainda mais valor para o produto.


“Ter o nosso queijo minas artesanal, dentre eles o da Canastra, como patrimônio da humanidade é um título fantástico, é como um ‘Oscar’ que nós podemos ganhar. Isso agrega mais valor e melhora o turismo da região da Serra da Canastra por tabela”, afirma o produtor.

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