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Messi estreia na Copa e tem sua chance final para ser Maradona

ALEX SABINO
DOHA, QATAR (FOLHAPRESS) – Na mitologia de Messi, a história ganhou contornos lendários. Era o intervalo de uma partida dos profissionais do Newell’s Old Boys, e a equipe sub-10, que havia ganhado um torneio qualquer, deu volta olímpica para ser aplaudida pelos torcedores.


O mais franzino entre todos os garotos começou a fazer malabarismos com a bola. Um truque atrás do outro. Quando ele chegou ao centro do campo, o público no estádio hoje chamado Marcelo Bielsa começou a gritar.


“Maradona! Maradona!”


As vidas de Lionel Messi e Diego Maradona estão entrelaçadas no imaginário do futebol argentino. Uma comparação que às vezes foi boa para o jogador que atualmente defende o Paris Saint-Germain. Em muitas outras, uma espécie de maldição. Principalmente por causa da ausência do título mais importante: a Copa do Mundo.


Maradona levou a alviceleste à conquista em 1986. Messi inicia nesta terça-feira (22) sua tentativa derradeira. A Argentina enfrenta a Arábia Saudita às 7h (de Brasília), no estádio de Lusail, no Qatar.


“Com certeza, é meu último Mundial”, avisou.


A despedida maximiza tudo o que ele faz em Doha. Se não treina, por que não treinou? Se treina, por que não foi poupado para a estreia? Na Universidade do Qatar, local da concentração da equipe, a Messimania está potencializada entre jornalistas e funcionários da AFA (Associação de Futebol Argentino). Como aconteceu com Maradona em sua época.


O que Messi diz ganha proporções maiores do que o normal. Mesmo que sejam coisas banais. Como ocorria com Maradona.


“Sinto-me muito bem fisicamente. Chego em um grande momento, tanto no pessoal quanto no físico, e não tenho nenhum problema”, disse o atual 10 nesta segunda (21).


Em tudo que ele fala se busca um significado maior.


Dizer que está bem fisicamente serve para minimizar os temores em relação a seu tornozelo direito. Foi publicada por diferentes jornais e sites uma imagem na qual a área aparenta estar bastante inchada. Segundo a versão de dirigentes da AFA, o atacante tinha uma pequena bolsa de gel sob a meia para evitar inflamações.


E afirmar que está em um grande momento também na parte pessoal? É referência à Copa na Rússia, em 2018, quando parecia abatido e foi alvo de boatos sobre sua vida conjugal?


Tal qual Maradona, o Messi atual, já na reta final da carreira aos 35 anos, parece viver fase em que nada é o que parece. Sempre há um significado oculto.


Lionel sempre idolatrou Maradona. Em 7 de outubro de 1993, quando Maradona estreou pelo Newell’s em amistoso contra o Emelec (EQU), Lionel implorou que seu pai Jorge o levasse. Ele diz que o único livro que leu até hoje foi “Yo Soy el Diego” (Eu sou o Diego), a autobiografia do meia, escrita em parceria com os jornalistas Daniel Arcucci e Ernesto Cherquis Bialo.


Ao estrear como profissional pelo Barcelona, em outubro de 2004, o menino de 17 anos recebeu telefonema do ídolo em sua casa. Ficou mudo por vários minutos.


“Ele não conseguia dizer nada”, recorda-se o pai.


Ao informar à diretoria do Barcelona sobre a existência de uma criança que era fenômeno na base do futebol argentino, o agente (e conselheiro do clube) Josep Maria Minguella escreveu apenas: “Encontrei um novo Maradona”.


“Ele podia fazer tudo com a bola nos pés. Qualquer coisa. Como Diego”, disse Minguella à Folha. O empresário foi o descobridor (para o futebol espanhol) de ambos.


Desconfiada da possível exagerada declaração, o presidente do Barcelona, Josep Lluís Núñez, pediu ao técnico Tito Villanueva (que depois dirigiria Messi nos profissionais) fazer um relatório sobre o menino. O treinador encerrou seu texto com um resumo: “Basicamente, ele é um pequeno Maradona”.


No começo, ser visto como sucessor do maior jogador argentino na história foi bom. Mas houve o momento em que se tornou fardo. Mesmo que Lionel não reconheça isso. As comparações eram pesadas. Principalmente por uma pergunta formulada algumas vezes pelo próprio Diego: por que Messi não mostrava na seleção argentina o mesmo futebol apresentado no Barcelona?


Na Copa do Mundo era pior. Lionel viu, sentado do banco de reservas, impotente, seu país ser eliminado no torneio de 2006. Já melhor do mundo e dirigido pelo mesmo Maradona, saiu da Copa na África do Sul em 2010 sem fazer nenhum gol. Eleito craque da competição em 2014, perdeu na final duas chances que normalmente (pelo Barcelona, diriam alguns) não desperdiçaria. A Alemanha foi campeã.


Em 2018, foi o desastre. Apagado, aparentando desinteresse, foi uma sombra de si mesmo.


A comparação com Maradona era quase desleal porque as personalidades dos dois sempre foram opostas. Diego entrou para a história (mesmo que não seja totalmente verdade) como o jogador que ganhou sozinho uma Copa do Mundo para a Argentina, em 1986. A mão de Deus, o “gol do século”, os braços no ar erguendo a taça… É tudo o que Messi não fez por seu país em campo.


Mesmo em 1990, já viciado em cocaína e com o tornozelo do tamanho de um melão, Maradona levou, basicamente com a força de vontade, a seleção a uma improvável decisão contra os alemães.


“Estou com muita ilusão de conseguir o sonho que todos queremos”, afirmou Messi nesta segunda.


A derradeira Copa do camisa 10 será a primeira sem Maradona. A próxima sexta-feira (25) marca o aniversário de dois anos do adeus do ídolo.


Nos dias que se seguiram à morte da referência não só do futebol, mas da vida na Argentina, entre todas, uma das mais tocantes homenagens foi de Messi.


Ele comemorou seu gol pelo Barcelona com camisa do Newell’s, número 10 às costas, usada por Maradona em 1993. Não se sabe em qual jogo.

Talvez até contra o Emelec, quando o garoto Lionel estava na arquibancada para iniciar sua ligação com o ganhador do Mundial. O título que lhe falta.

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