O conselho-diretor da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) suspendeu nesta sexta-feira (10) a reunião extraordinária de avaliação final do edital do leilão do 5G que, agora, será realizada na segunda-feira (13).
Segundo a agência, o cancelamento foi um pedido do conselheiro-relator do processo, Emannoel Campelo, para “ajustes de voto”.
Nos bastidores, no entanto, houve um impasse em torno do pedido de um novo entrante na região Nordeste, a empresa Highline, que pretende iniciar operação em estados hoje atendidos primordialmente pela Brisanet.
A Highline queria que a regra definida pelo TCU (Tribunal de Contas da União) fosse modificada de modo que a empresa pudesse dar início à implantação do 5G a partir de cidades menores. O edital prevê que o serviço chegue primeiro a cidades maiores a partir de julho de 2022.
Caso o pedido seja atendido, a Brisanet passará a ter rivais em sua área de atuação.
Houve uma divisão no conselho da Anatel. Dois conselheiros se mostraram contrários e dois, favoráveis. O Ministério das Comunicações também opinou sobre o assunto. A preocupação da pasta é que, sem essa flexibilização, uma das faixas de frequências para blocos regionais não tenha interessados.
Frequências são avenidas no ar por onde as teles fazem trafegar seus dados. O leilão do 5G vai vender o direito de exploração de diversos blocos em quatro faixas de frequência: 700 MHz (megahertz), 2,3 GHz; 3,5 GHz e 26 GHz.
Uma das saídas propostas foi permitir que somente um novo entrante (no caso a Highline) fosse autorizada a começar o serviço de 5G pelas cidades menores.
Diante do impasse, Campelo ligou para o ministro das Comunicações, Fábio Faria (PSD-RN), para avisar que haveria um pequeno atraso na reunião -em vez desta sexta, passaria para segunda-feira (13). Perguntou se haveria algum problema.
O ministro respondeu que, para ele, um atraso de poucos dias seria positivo para que o conselho definisse logo o edital. No mérito, disse ser indiferente à decisão do conselho sobre o novo entrante. Sua maior preocupação é a realização do leilão em outubro.
A ligação do relator do processo do 5G para o ministro ocorreu depois de Faria ter ligado pessoalmente para todos os conselheiros da Anatel para desejar “sorte” na reunião desta sexta, posteriormente cancelada.
Segundo relatos, para a maioria do conselho, o ministro fez perguntas genéricas para saber se havia chances de aprovação ainda nesta sexta-feira. Disse que o atraso seria muito ruim.
Havia ainda a preocupação de que o conselheiro Moisés Moreira pedisse vista, o que paralisaria a votação. Além de considerar insuficiente o tempo para avaliação do voto de Campelo (com mais de cem páginas) e propostas complexas, Moreira discordou de questões técnicas, especialmente na cobertura das escolas públicas como contrapartida de investimento para os vencedores da faixa de 26 GHz (gigahertz).
Ainda segundo interlocutores, Moreira reclamou do pouco tempo para aprontar seu voto e desligou seu celular para concluir seu trabalho a tempo da reunião.
Sem contato direto por telefone, Campelo teria solicitado então a suspensão da reunião, alegando, internamente, falta de comunicação com o conselheiro.
Campelo disse à reportagem que apresentou o pedido de adiamento para que alguns pontos de sua proposta fossem discutidos pelo conselho.
O conselheiro Moisés Moreira se mostrou indignado com a insinuação de que a reunião teria sido cancelada por sua culpa.
“Isso é inaceitável. Essas reuniões são convocatórias. Mesmo se não tivessem conseguido falar comigo, eu teria obrigação de estar lá. Em nenhum momento pedi para cancelarem. Desliguei o telefone para, justamente, trabalhar no meu voto”, disse Moreira.
Diante do silêncio de Moreira, o ministro ligou para o conselheiro nesta sexta e perguntou os motivos da divergência. Teria se mostrado preocupado sobre um possível pedido de vista.
Na conversa, Moreira disse ao ministro que apresentaria seu voto divergente e que seria seu direito pedir vista caso achasse necessário. Reclamou da interferência, que foi negada pelo ministro, por meio de sua assessoria.
Segundo conselheiros, Moreira possui duas divergências. A principal se refere aos investimentos a serem realizados pelas empresas que arrematarem os lotes de frequências de 26 GHz.
Por recomendação do TCU (Tribunal de Contas da União), que apreciou as regras do edital há cerca de duas semanas, a maior parte da outorga deverá ser revertida para um programa de conexão de banda larga nas escolas públicas. Na proposta da Anatel não havia essa previsão. O valor estimado dessa faixa de frequência é cerca de R$ 6 bilhões.
Outro ponto de questionamento é o cronograma de antecipação da instalação da rede 5G na faixa de 3,5 GHz, hoje utilizada por empresas de satélite. Há dúvidas sobre se será possível migrar os satélites para outra frequência e “limpar” essa faixa para uso da telefonia de quinta geração evitando interferências. JULIO WIZIACK/FOLHAPRESS