Sem notícias há quase um mês, família faz plantão à espera de deportados de MG

Perto das 22h dessa sexta-feira (14), a família de Cleiber Miranda Ferreira, 45, olhava apreensiva a tela com os voos previstos para chegar ao Aeroporto Internacional de Confins (a 37 km de Belo Horizonte), sem saber se ele estaria a bordo do voo das 22h20, fretado pelo governo dos Estados Unidos.

A família saiu da capital para fazer plantão no local, na esperança de encontrar Cleiber, a mulher dele, Alexandra, e os dois filhos do casal, depois de ver a notícia que um novo voo com brasileiros deportados chegaria a Minas Gerais, na noite de sexta.

O voo fretado pelo governo de Donald Trump, com autorização do governo brasileiro, foi o terceiro a chegar ao Estado este ano, com brasileiros deportados por imigração irregular. Do mesmo modo, houve outro voo do tipo em outubro do ano passado.

Segundo a BH Airport, que administra o aeroporto, 80 pessoas chegaram na leva dessa sexta – entre elas, 40 crianças. Pela manhã, a Polícia Federal havia divulgado que na lista constavam 100 passageiros.

“Minha vida é só rezar”

“A minha vida é só rezar”, disse a mãe de Cleiber à reportagem, enquanto esperava. Sem poder usar o celular no centro de detenção, ele estava sem comunicação com os parentes do Brasil desde às 8h30 (horário de Brasília), do dia 31 de janeiro, quando se despediu pelo WhatsApp, para fazer a travessia entre México e Estados Unidos.

Passado das 23h dessa sexta, depois que alguns passageiros já haviam saído, assim que viram Cleiber cruzando a porta, os familiares dele começaram a gritar e chorar. Ele era um dos únicos com alguém à espera.

“Não esperava [que eles estivessem aqui], porque nem a gente fica sabendo que dia volta”, conta ele. “Nunca mais quero tentar. Só vou torcer por quem está lá. Mas não desejo para ninguém passar por isso”.

Sem algemas desta vez

Nenhum passageiro foi algemado durante ou depois da viagem, segundo relatos dos brasileiros ouvidos pela Folha. Ao contrário do que teria ocorrido com os passageiros do voo que chegou no final de janeiro, também em Confins. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a criticar a ação, mas depois recuou.

Os brasileiros relataram, porém, que eram acompanhados por seguranças até para ir ao banheiro durante o voo. “A viagem, o tempo todo, é tensa”, diz Cleiber. Alguns deportados, ouvidos pela Folha, contaram que um brasileiro teve problemas por acharem que o filho dele era maior de idade. A questão parecia ter sido esclarecida, mas depois de terem embarcado na van que levou o grupo até o avião, nenhum dos dois foi visto novamente.

Como a maioria das pessoas lá, pai e filho são de Minas Gerais. O segundo estado com mais pessoas nos centros de detenção, segundo os deportados, é Rondônia. Elisange Apolinário, 30, saiu de Buritis (a 328 km de Porto Velho), para arriscar se entregar no controle de imigração dos EUA e pedir asilo, junto com o marido e dois filhos – um bebê de um ano e oito meses e uma menina de 7.

Cai-cai

A tentativa de entrar no país por imigração irregular, para aguardar pelo processo pedindo asilo é conhecida como “cai-cai”, e costumava ser prática comum entre migrantes sem documentos nos EUA.

“Só que, como disseram que a lei mudou agora, enfrentamos todo esse processo”, explica Elisange. “Nós adquirimos uma dívida e, com os dois desempregados aqui, não estávamos conseguindo pagar. A ideia era ir para lá e ficar até juntar o dinheiro”.

R., que pediu para não ser identificado, pediu demissão do emprego, em uma loja em Uberlândia, vendeu carro e moto, e juntou US$ 6.000, para tentar vida nova nos EUA. Ele, a mulher e o filho estavam entre os deportados dessa sexta. “Não temos nada. Não tenho nem as coisas de dentro de casa. Tenho só US$ 80”, diz ele.

Ele conta que os agentes de imigração ofereceram duas saídas: ser enviado ao México, onde poderia tentar responder a um processo para ficar nos EUA, com uma audiência meses depois, ou assinar de uma vez a deportação para o Brasil, sabendo que por cinco anos não poderá entrar nos Estados Unidos. “O medo de todo mundo lá é ir para o México e que retenham o seu passaporte, por três meses, até a audiência”, conta.

Itamaraty

Em nota enviada à Folha, o Itamaraty diz que “não serão criadas dificuldades para que os brasileiros deportados de acordo com a lei norte-americana, que não se contesta, regressem ao Brasil”. E que as autoridades consulares brasileiras seguem acompanhando os casos de brasileiros detidos por irregularidades na situação migratória.

A Polícia Federal diz que voos com deportados devem se tornar mais frequentes. A Folha revelou que o governo norte-americano solicitou ao governo brasileiro autorização, para fretar novos voos, para deportação de brasileiros pegos em imigração irregular.

Enquanto os passageiros dessa sexta passavam pela porta de desembarque, Fabrícia Alves, 42, transmitia tudo ao vivo pelo celular, para a sobrinha que estava em Inhapim (MG). A esperança dela, de ver o marido Gilliard Nascimento, 39, foi frustrada. “É uma angústia”, diz a tia. “Semana que vem, se Deus quiser, estarei aqui para pegar ele”. (Fernanda Canofre/Folhapress)

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