A professora universitária e pesquisadora Thaís Alred explicou por que acredita que os números de violência obstétrica são tão altos no Brasil. “Possivelmente o índice é ainda maior, tendo em vista que muitas mulheres não têm consciência de que foram vítimas de violência obstétrica, ou por vezes silenciam sobre o tema no tocante às suas vivências. Acredito que os altos índices são devido à ausência de conhecimento sobre os próprios direitos e também em razão da situação de vulnerabilidade em que as mulheres estão inseridas no ambiente hospitalar. Por exemplo, o direito ao acompanhante durante o parto e pós-parto (imediato), mesmo que previsto na Lei nº 11.108, de 7 de abril de 2005, ainda não é assegurado a todas as mulheres, e isso configura um ato de violência obstétrica”, afirma.
Thaís frisa que violência obstétrica não se refere somente às agressões sofridas no trabalho de parto. “É importante ressaltar que a violência obstétrica acontece quando a autonomia da mulher não é respeitada durante a gestação, o parto, o pós-parto e também em situações de abortamento. A mencionada violação não se restringe à mulher, ela também acontece em relação ao recém-nascido, quando o bebê é submetido a procedimentos rotineiros que não são baseados em evidências científicas”, explica.
Parto humanizado e natural
Já para a enfermeira e residente em obstetrícia Larissa Silva Teixeira, um dos motivos é a precária cultura do parto humanizado. “Acredito que infelizmente esse alto número de violência obstétrica no Brasil se dá pelo modelo onde o médico é o centro da assistência, claro que não é generalizando, mas grande parte possui práticas não humanizadas, a violência obstétrica pode começar na frase “para de gritar, na hora não foi bom?” até o profissional subir em cima da barriga da gestante para “ajudar” o bebê a sair. Se tivéssemos a cultura de uma assistência humanista, multiprofissional, com empatia e de qualidade, acredito que essa taxa seria muito menor”.
O parto humanizado e o natural (vaginal) são distintos. “Você pode ter um parto natural em que aconteça violência obstétrica e pode ter uma cesárea necessária humanizada. O parto humanizado não pode ter a sua compreensão restringida ao parto vaginal. A humanização é o reflexo de um atendimento acolhedor, empático, ético, em que durante toda a gestação a mulher tenha acesso à informação, para que de forma consciente e informada ela possa junto dos profissionais de saúde ter acesso às opções que são aplicáveis ao seu caso e possa escolher o que atende ao seu plano de parto (por ela formulado)”, acrescentou a pesquisadora Thaís.
Falta de informação e normalização de agressões
Dentre os motivos para a violência obstétrica ter sido encoberta por tantos anos, estão a falta de informação e normalização de agressões às mulheres. “A mídia oportunizou serem discutidos temas que antes eram tabus, ou não eram conhecidos, ou simplesmente porque aquilo era normal. Com o conhecimento, a melhora da assistência e a prática mais humanizada foram vistos que era normal a mulher ser violentada durante o trabalho de parto. Hoje isso não é mais aceito, existem evidências, estudos e evolução no cuidar do outro”, explicou a enfermeira Larissa.
De acordo com Thaís, algumas alternativas que podem diminuir consideravelmente esse tipo de violência são: a conscientização, fiscalização e maior investimento. “A promoção de oficinas voltadas às famílias também é uma ótima iniciativa para que tanto as mulheres como seus familiares compreendam quais são os seus direitos tanto no pré-natal, como no parto, no puerpério e em situações de abortamento. É importante também que a fiscalização dos hospitais, clínicas e maternidades aconteça de forma rotineira e contínua, com o intuito de aprimorar constantemente o atendimento às mulheres, coibindo assim a prática de condutas atinentes à violência obstétrica. O que também auxiliaria seria um maior investimento no setor da saúde”, afirma.
Além disso, existem canais de denúncia. Em Minas Gerais, as gestantes podem entrar em contato pelo aplicativo MG-APP/ Ouvidoria e pelo site www.ouvidoriageral.mg.gov.br/. Também é possível realizar denúncias por meio do Disque Saúde (136), ou no serviço de saúde em que a paciente foi atendida, ou na secretaria de saúde responsável pelo estabelecimento.