Crise Lula-Israel municia bolsonaristas, mas líderes do Congresso descartam avanço de impeachment

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RANIER BRAGON


BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A crise Lula-Israel deu munição à oposição e mobilizou aliados de Jair Bolsonaro (PL) para um novo pedido de impeachment contra o presidente, mas líderes de bancadas no Congresso Nacional afirmam ser zero a chance de a ofensiva prosperar após as declarações do petista comparando a ofensiva do país em Gaza ao extermínio de judeus promovido por Adolf Hitler durante a Segunda Guerra Mundial.

Bolsonaristas da Câmara, em especial a bancada do PL, prometem protocolar na tarde desta terça-feira (20), com a assinatura de mais de 100 deputados, o 18º pedido de impeachment de Lula desde 2023, o segundo relativo ao caso de Israel.

Os pedidos anteriores, alguns deles também feitos em grupo pelos deputados, englobam uma série de episódios, que, na argumentação dos parlamentares ligados a Jair Bolsonaro (PL), mereceriam a destituição do mandatário. O primeiro deles foi apresentado com apenas 26 dias de mandato de Lula.

Entre os motivos elencados nas peças, há uma suposta omissão de Lula nos ataques bolsonaristas de 8 de janeiro de 2023, a recepção ao ditador Nicolás Maduro em maio do ano passado, a revogação dos decretos de armas de Bolsonaro, a indicação de Cristiano Zanin ao Supremo Tribunal Federal e uma entrevista em que Lula fala que, nos tempos em que estava preso, queria “foder” o então juiz Sergio Moro.

Na segunda-feira (19), integrantes do PL já protocolaram um pedido de impeachment contra Lula sobre o caso Israel, de acordo com a Câmara, que informou como autores apenas o nome do deputado André Fernandes (PL-CE) “e outros”.

Nesta terça, será a vez do pedido encabeçado pela deputada Carla Zambelli (PL-SP), que fará o protocolo após entrevista coletiva na Câmara dos Deputados.

Cabe ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), analisar esses pedidos e decidir se dá sequência a eles ou não.

Até agora, ele arquivou dois deles, apresentados pelos deputados bolsonaristas Sanderson (PL-RS) e Evair Melo (PP-ES) em janeiro de 2023. Ambos pediam a destituição do presidente por ele ter dito, em visita à Argentina, que o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 havia sido um golpe de Estado.

O resto segue “em análise”, que é o provável destino dos pedidos apresentados em relação ao caso de Israel, de acordo com os parlamentares ouvidos.

Lira não tem prazo para analisar esses pedidos, que podem ficar em sua gaveta por tempo indeterminado. Em caso de arquivamento da solicitação, pode haver recurso ao plenário.

No domingo (18), Lula comparou as mortes na Faixa de Gaza ao Holocausto e criou uma grave crise diplomática com Israel. “O que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”, afirmou o presidente no final de sua viagem à Etiópia.

Segundo os parlamentares ouvidos, apesar disso o pedido de impeachment é, por ora, um assunto restrito apenas ao círculo de deputados bolsonaristas mais radicais, que se concentram no PL de Bolsonaro.

Há no partido desde integrantes do governo anterior, como o General Pazuello (RJ), Mario Frias (PL-SP) e Marcelo Álvaro Antônio (PL-MG), a pessoas diretamente ligadas ao ex-presidente, como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), seu filho, e Helio Lopes (PL-RJ), amigo de longa data.

Mesmo no partido, a movimentação não é unânime, já que o grupo mais antigo, que integra o centrão, quase nunca acompanha as ações dos bolsonaristas e, em alguns casos, até vota a favor do governo.

Dos 96 deputados do partido, 28 não assinaram o pedido de acordo com lista divulgada pela deputada Carla Zambelli (PL-SP) nesta segunda.

Zambelli já havia apresentado um pedido de impeachment contra Lula em fevereiro de 2023, no segundo mês de mandato do petista. Na ocasião o motivo apresentado por ela e pelo deputado Coronel Meira (PL-PE) para a destituição do presidente era a compra pelo governo de móveis de luxo, sem licitação, para o Palácio do Planalto.

Há também na lista de Zambelli 28 parlamentares de legenda que apoiam formalmente o governo –PP, PSD, Republicanos, MDB e União Brasil.

Também aí totalidade é de deputados que já votam normalmente contra o governo ou são abertamente críticos a ele, como o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Pedro Lupion (PP-PR), Kim Kataguiri (União Brasil-SP), pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, e Rosângela Moro (União Brasil-SP), mulher do senador Sergio Moro (União Brasil-PR).

Os três parlamentares do MDB na lista de Zambelli, por exemplo, são o ex-ministro de Bolsonaro Osmar Terra (RS), além de Delegado Palumbo (SP) e Thiago Flores (RO), os dois últimos também bolsonaristas declarados.

Apesar de ter ampla maioria formal de apoio, Lula vive uma relação de turbulências com o centrão, controlado por Lira, que por ora tem concentrado esforços na briga por emendas parlamentares e dinheiro extra da Saúde.

Como a Folha de S.Paulo mostrou, a pasta privilegiou aliados na liberação de verba, causando irritação no centrão.

Apesar dessa relação tensa, nunca a questão impeachment entrou no radar de negociações entre Palácio do Planalto e governo, até porque, como repetem políticos mais experientes, é preciso uma combinação de fatores por ora inexistente para que haja ambiente de discussão sobre destituição de um presidente.

São eles grave crise econômica, pressão popular nas ruas, desaprovação acentuada do governo e falta de uma base de apoio mínima no Congresso –bastam 172 dos 513 deputados para barrar a abertura do processo de impeachment caso a tramitação seja liberada pelo presidente da Câmara, passe por comissão especial e vá a plenário, por exemplo.

O CAMINHO DO IMPEACHMENT

O presidente da Câmara dos Deputados é o responsável por analisar pedidos de impeachment do presidente da República e encaminhá-los.

O atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é aliado de Lula e ex-aliado de Jair Bolsonaro. Ele pode decidir sozinho o destino dos pedidos e não tem prazo para fazê-lo.

Nos casos encaminhados, o mérito da denúncia deve ser analisado por uma comissão especial e depois pelo plenário da Câmara. São necessários os votos de pelo menos 342 dos 513 deputados para autorizar o Senado a abrir o processo
Iniciado o processo pelo Senado, o presidente é afastado do cargo até a conclusão do julgamento e é substituído pelo vice. Se for condenado por pelo menos 54 dos 81 senadores, perde o mandato.

Os presidentes eleitos após a redemocratização do país foram alvo de pedidos de impeachment. Dois foram processados e afastados: Fernando Collor (1992), que renunciou antes da decisão final do Senado, e Dilma Rousseff (2016)

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