por DANIELA ARCANJO (FOLHAPRESS)
Três vezes por semana, Victor Hugo Souza, 23, pega a bicicleta e o celular e sai da moradia na USP, onde estuda física, para fazer entregas de comida para restaurantes por São Paulo.
O dinheiro que consegue é suficiente para complementar a renda de que precisa para se manter na cidade e continuar estudando.
Como ele, 38 milhões estão trabalhando informalmente no Brasil, segundo dados do IBGE do último trimestre de 2019, quando o grupo atingiu o seu maior índice entre os ocupados desde 2016: 41,1%.
O número significa um retrocesso para os jovens petistas entrevistados para esta reportagem, incluindo Victor, filiado ao partido desde 2019. Mas é visto também como uma nova oportunidade de angariar simpatizantes para a sigla.
Nos últimos tempos, o estudante tem ouvido propostas de seus colegas para sensibilizar esses trabalhadores. “Abrir um diretório para ser um descanso para entregadores de aplicativo, por exemplo. Mas ainda é muito incipiente.”
Ele explica que, se não acumulasse a função de entregador com a de estudante universitário, as chances de ter se aproximado da sigla seriam quase inexistentes. Vindo de uma família que pouco discute política, Victor resolveu se filiar após entrar no DCE (Diretório Central dos Estudantes) da universidade.
O imbróglio mostra o novo desafio do partido que levou o primeiro sindicalista à Presidência, quando outras relações de trabalho possibilitaram a sua ascensão em 1980, década da criação do PT.
Em suas últimas entrevistas, após 580 dias de prisão, o ex-presidente Lula tem tratado desse assunto.
“O que difere é que, em 1980, a Volkswagen tinha quase 44 mil trabalhadores e, hoje, tem 9.000. Os trabalhadores originários de onde o PT foi formado estão diminutos. Você tem trabalhadores em outras atividades da economia —fazendo entrega de comida, no Uber, em serviços de microempreendedores”, afirmou o petista no final de janeiro, em entrevista ao UOL.
Se, na sua juventude, Lula conseguia com algum esforço discursar para 10 mil pessoas na porta de uma fábrica, o jovem que tentar o mesmo hoje encontrará no máximo 500 trabalhadores, disse o petista.
Tampouco os sindicatos têm o mesmo contingente de antes. Segundo o IBGE, o país perdeu 1,5 milhão de sindicalizados após a reforma trabalhista no governo Temer.
Essas barreiras não são as únicas enxergadas por Victor. O baixo rendimento das entregas e caronas impõe uma carga de trabalho que, diz o estudante, não possibilita o engajamento político. A saída vista por ele é a mesma que tornou o líder do PT conhecido: greve.
O mundo já assistiu a uma tentativa de pressão dos motoristas de Uber. Em maio de 2019, uma paralisação parcial foi organizada dias antes da estreia da empresa na Bolsa de Valores de Nova York.
A greve aumentou o preço da corrida em até 50% em alguns pontos de São Paulo. A desunião da categoria, porém, foi citada por aqueles que não aderiram à mobilização.
A preocupação com esse grupo de trabalhadores faz parte das medidas que a juventude do PT pretende tomar para “voltar para a base”, demanda que vem sendo repetida à exaustão pela esquerda brasileira.
Apesar da corrida para trazer novos simpatizantes, petistas afirmam que viram o partido se oxigenar nos últimos quatro anos, especialmente entre os jovens.
Os motivos apontados são, curiosamente, o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, e a prisão de Lula após ser condenado por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá (SP).
Ainda assim, de 1,7 milhão de filiados que informaram a idade ao Tribunal Superior Eleitoral, só 8% têm entre 16 e 30 anos, segundo dados do PT.
Ter voltado à oposição reaproximou militantes mais à esquerda do partido, que se desgastava no governo com medidas pouco simpáticas à sua base, como a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte e escândalos de corrupção.
Para o secretário nacional da juventude do partido, Ronald Sorriso, 30, não se pode colocar todos os casos no mesmo saco. Sobre a condenação de Lula, por exemplo, ele afirma que “já está mais do que comprovado os objetivos políticos do setor Judiciário”.
Desde 2015, o PT reserva 20% das vagas para jovens que tenham completado, até a eleição a ser disputada, 29 anos. Em 2020, pretende lançar pelo menos 2.000 jovens para as prefeituras e Câmaras com o Representa, projeto que vai oferecer formação para campanha dos mais novos.
Sorriso diz que o sinal amarelo veio em 2018, quando a bancada do partido diminuiu. Para renovar, as fichas de Sorriso estão na tradição. “O PT é o maior instrumento da história da esquerda brasileira. O que atrai bastante é a capacidade de não apenas formularmos as nossas teses, mas de conseguir disputar o poder.”