Em pelo menos três decisões recentes, a Justiça de São Paulo impediu a penhora de recursos do auxílio emergencial e do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) emergencial de pessoas endividadas. Os magistrados que analisaram os casos entendem que esse dinheiro é impenhorável, justamente pelo seu caráter social e extraordinário.
Em um dos processos, um homem do interior de São Paulo teve R$ 600 do auxílio emergencial bloqueados de sua conta-poupança social digital da Caixa Econômica Federal e, posteriormente, o bloqueio foi convertido em penhora após decisão judicial de primeira instância.
O beneficiário recorreu e, na segunda instância, o desembargador Ademir de Carvalho Benedito ordenou o desbloqueio do valor. Como argumento, ele citou uma resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) do ano passado que recomenda aos juízes que os valores recebidos a título de auxílio emergencial não sejam penhorados.
O desembargador também citou o artigo 833 do Código de Processo Civil, que define como impenhoráveis “os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal”.
Em um outro caso, um homem, também do interior paulista, teve R$ 901,48 bloqueados de sua conta da Caixa em razão de uma dívida. Segundo os autos, esse recurso também é oriundo do auxílio emergencial. Após análise dos fatos em segunda instância, os valores foram liberados por ordem do desembargador Cerqueira Leite, que, em sua decisão, citou argumentos parecidos aos de Carvalho.
Houve também um caso recente envolvendo o FGTS emergencial, que foi liberado pelo governo federal no ano passado por meio da medida provisória 946. O dinheiro, assim como nos demais episódios, havia sido bloqueado após decisão judicial de primeira instância.
“O valor bloqueado é referente ao saque emergencial do FGTS instituído pela Medida Provisória nº 946/2020, tratando-se de medida para enfrentamento do contexto de emergência sanitária decorrente da pandemia da Covid-19. Como cediço, a impenhorabilidade do FGTS é prevista em legislação específica”, afirmou, na decisão, a desembargadora Ana Lucia Romanhole Martucci.
O advogado Alexandre Berthe explica que, em geral, as ordens judiciais para bloqueio de recursos em casos de dívidas são feitas de maneira automática e, por esse motivo, acabam pegando dinheiro do auxílio emergencial ou do FGTS. “Porém, quando o caso vai para o tribunal [em segunda instância], a tendência é desbloquear sempre”, diz.
“Como o nome diz, é um auxílio emergencial. Essa pessoa já passou pelo crivo do governo que validou os dados e que entendeu que ela precisa daquilo para sobreviver. Isso é o princípio da dignidade da pessoa humana. Ela não pode pagar [a dívida] e não ter o que comer”, acrescenta.
Apesar de, em geral, esse tipo de benefício ser considerado impenhorável, há exceções, segundo explica o advogado Geovanne Lucas Silva Ribeiro, do escritório Giamundo Neto Advogados.
Ele afirma que se a dívida da pessoa é relacionada a uma pensão alimentícia para pessoa menor de idade, a Justiça pode determinar a penhora total ou parcial do recurso, ainda que este tenha sido obtido por meio do auxílio ou do FGTS emergencial. FÁBIO MUNHOZ/FOLHAPRESS